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Os condomínios especiais e os shopping centers - O nCC e a cota de rateio de encargos

Roberto Wilson Renault Pinto

O shopping center, dadas suas peculiaridades, possui regras específicas, que fogem à realidade de outros empreendimentos imobiliários. Por exemplo, os encargos condominiais cobrados pelo shopping center a seus lojistas possui características acentuadamente diversas daqueles exigidos em prédios convencionais, sejam residenciais, sejam comerciais.

terça-feira, 22 de abril de 2003

Atualizado às 08:11

Os condomínios especiais e os shopping centers

O nCC e a cota de rateio de encargos

Roberto Wilson Renault Pinto*

Os shopping centers diferem-se das lojas comerciais de rua, na medida em que possuem uma administração centralizada, em que os interesses coletivos são privilegiados em relação àqueles individuais, já que se trata de empreendimento que consiste em um todo.

Como conseqüência dessa premissa, por exemplo, o mix - distribuição das diversas atividades e respectiva localização - nos shopping centers é objeto de constante preocupação por parte de seus administradores, que mantêm serviço especializado de assessoria comercial, com o fito de substituir os lojistas que não estejam atingindo resultados esperados e de sempre trazer novos lojistas e/ou novas atividades que sejam do anseio dos respectivos consumidores.

O shopping center, dadas suas peculiaridades, possui regras específicas, que fogem à realidade de outros empreendimentos imobiliários.

Por exemplo, a parcela de contribuição de cada lojista para as despesas comuns do shopping center é calculada partindo de algumas premissas, entre as quais, de que, quanto maior for a área por ele ocupada, menor será a sua contribuição por metro quadrado. A contrario sensu, quanto menor for sua área locada, maior será essa contribuição. Tal prática decorre do fato de que cada shopping center funciona como um todo, possuindo uma estrutura de apoio, que será mais ou menos necessária, dependendo de cada atividade desenvolvida nos espaços desse shopping center.

O pranteado Mestre Darcy Bessone chegou a equiparar a atividade desenvolvida em um shopping center a um resort e a um navio. Quem se hospeda em um resort, ou viaja em navio, não tem como objetivo principal ocupar um quarto, mas se servir de toda a estrutura organizacional que, em ambos os exemplos, é colocada à disposição do seu hóspede, ou viajante. Da mesma forma, no shopping center, o lojista não conta, tão simplesmente, com o espaço comercial onde desenvolve sua atividade empresarial, mas com toda a infra-estrutura mantida pelo shopping center e que se constitui em atrativo essencial ao consumidor.

Como conseqüência, os encargos condominiais cobrados pelo shopping center a seus lojistas possui características acentuadamente diversas daqueles exigidos em prédios convencionais, sejam residenciais, sejam comerciais.

Ocorre que inúmeros shopping centers se encontram localizados em prédios regidos por condomínios especiais.

A cobrança dos encargos condominiais passou a ser regulada pelo novo Código Civil, cujo artigo 1.336 estabelece:

"Art. 1.336 - São deveres do condômino:

I - Contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais;"

Anteriormente, a Lei nº 4.591/64, que dispunha sobre a cobrança de encargos condominiais, previa a possibilidade de estes serem fixados com base em outro critério, desde que previsto na convenção condominial.

Então, para os condomínios existentes anteriormente à vigência do novo Código Civil, não existe problema na fixação do rateio desses encargos, observando-se os princípios que norteiam as atividades em shopping centers, já que o nCC não pode alcançar os atos jurídicos praticados antes de 11 de janeiro de 2.003, nos estritos termos do art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, respaldado por mansa e pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e até do Superior Tribunal de Justiça.

Mas, os novos condomínios, a serem desenvolvidos a partir de 11 de janeiro de 2.003, estarão sempre sujeitos às regras do novo Código Civil e, no caso dos shopping centers, a adoção da regra do art. 1336 supra transcrito configuraria a impossibilidade fática da realização desse tipo de empreendimento.

Restaria, como alternativa, a) adotar a forma de condomínio civil (aliás, mais adequada a este tipo de empreendimento); ou b) utilizar uma construção interpretativa do nCC como saída, na hipótese de se adotar o condomínio especial no prédio em que o shopping center será desenvolvido.

Na hipótese b acima, vale ressaltar que o NCC se refere à fração ideal no condomínio edilício: a) no seu art. 1.332, que impõe, na convenção de condomínio, entre outras, a obrigação da "determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e às partes comuns"; e b) no art. 1.334, que dispõe, in verbis:

"Art. 1.334 . Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará:

I - a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;

II - ...... (omissis)

Se o art. 1.332 já determina a determinação da fração ideal de cada unidade autônoma e o art. 1.336 estipula a cobrança dos encargos condominiais com base na fração ideal, por que haveria o art. 1.334 de prever "além das cláusulas referidas no art. 1.332", referindo-se, no seu parágrafo primeiro, à "quota proporcional" ?

Há o princípio de hermenêutica de que não existem expressões inúteis na lei. O mencionado parágrafo primeiro do art. 1.334 poderia simplesmente aludir ao "modo de pagamento das contribuições dos condôminos..."

Mas, não o fêz, referindo-se expressamente à "quota proporcional", ao invés de fração ideal.

Se quota "proporcional" fosse sinônimo de fração ideal, haveria total contradição com o caput do referido art. 1.334, que menciona: "Além das cláusulas referidas no art. 1.332".

A interpretação que, de forma sistemática, se coadunaria com a cobrança de encargos, em condomínio edilício, que não seja com base na fração ideal seria a de que:

a regra geral - cobrança de encargos condominiais com base na fração ideal - art. 1.336; a exceção, prevista no inciso I do art. 1.334, que estipula a "quota proporcional", nos casos em que a atividade a ser exercida no condomínio edilício não fosse compatível com a escolha da fração ideal como forma de cobrança desses encargos condominiais.

O fato concreto consiste em que não é possível conceber que o nCC tenha tornado inviável o desenvolvimento de novos shopping centers no País, sob a forma de condomínio edilício, em função da obrigatoriedade de estipulação da fração ideal do terreno como critério de cobrança dos encargos condominiais.

Por outro lado, o art. 1.334, I, do nCC cria uma alternativa à regra geral, mencionada no art. 1.336, I, do novo Codex, para casos restritos.

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* Sócio do escritório Felsberg, Pedretti, Mannrich e Aidar Advogados e Consultores Legais

 

 

 

 

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