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Por que se deve institucionalizar a auditoria jurídica

1. Ao longo de tantos anos de exercício ininterrupto da advocacia, desde a época de estagiário este escriba tem procurado dar sua contribuição à nobre Classe dos advogados, das formas e maneiras que se lhe apresentaram.

terça-feira, 18 de outubro de 2005

Atualizado em 17 de outubro de 2005 08:01


Por que se deve institucionalizar a auditoria jurídica


Jayme Vita Roso*


1.Ao longo de tantos anos de exercício ininterrupto da advocacia, desde a época de estagiário este escriba tem procurado dar sua contribuição à nobre Classe dos advogados, das formas e maneiras que se lhe apresentaram.


Uma delas, depois de muitas reflexões, estudos, consultas e pesquisas, foi a elaboração de um projeto de resolução para o Conselho Federal da OAB, recomendando a normatização da auditoria jurídica.


O assunto foi dirimido pelo Egrégio Conselho, negando a pretensão do escriba, não obstante tivesse ele voto favorável do relator do processo. O voto divergente e condutor, com todo respeito que merece o subscritor, que convenceu o Plenário não me pareceu adequado ao caso, tendo se desviado do objetivo primordial da auditoria jurídica.


Aprendi, em cinqüenta anos na profissão, que a propositura de novos parâmetros e novos paradigmas para o exercício da profissão é impenetrável aos advogados, na sua esmagadora maioria. Preferem viver dentro do cerrado círculo gremial, sem criar nada que possa melhorar a qualidade do exercício profissional, abrir novas oportunidades aos jovens advogados e atender à letra e ao espírito do que consta no Estatuto da OAB, assim como no Código de Ética, sobretudo dentro das recomendações deontológicas que este último principia.


Por favor, espero que essas palavras não sejam desvirtuadas e me acusem de ser contra a Classe, atacando os advogados. Não. Meu sonho é que o advogado, nesse mundo conturbado em que vivemos, passe a exprimir, dentro da sociedade, os ideais supremos que, ao longo dos séculos, construíram a dignidade, a honradez, a probidade e o espírito combativo dos operadores do direito.


2.A respeito do fato da negativa do Egrégio Conselho Federal, não abandonei o projeto porque, mais e mais, sempre num crescendo, meu convencimento da indispensabilidade de ser institucionalizada a auditoria jurídica arraigou-se. Não tenho a menor dúvida de que, quando agasalhada por ordenamento que lhe dê status, será uma fonte de trabalho para os advogados que se prepararem e se adequarem ao seu exercício. Para revivê-la, desta vez, dirijo-me aos migalheiros, pedindo-lhes bondosa atenção a este texto, que relança idéias já acalentadas por mim e publicadas no ano da graça de 2001. No mundo da ciência e da tecnologia, em que elas predominam, não pode ficar o advogado alheio aos seus avanços, porque, enquanto o mundo é cambiante, ainda vivemos presos a conceitos estáticos, desassociados da realidade e da própria letra do nosso EOAB.


3.Pela importância e pela séria fundamentação, permito-me transcrever-lhes, na íntegra, o voto do Relator, vencido no Conselho Federal da OAB.


Assim se expressou o então digno Conselheiro Federal, doutor Luiz Antonio de Souza Basílio:


"Proposição 0043/2002/COP

Assunto: Recomendação intitulada "Auditoria Jurídica para a Sociedade Democrática"

Proponente: Advogado Jayme Vita Roso - SP


RELATÓRIO


O eminente advogado JAYME VITA ROSO, com sede profissional em São Paulo - capital, ex-integrante desta Casa, encaminhou à Presidência do Conselho Federal recomendação, com a qual encerra festejado trabalho acadêmico, de sua autoria, intitulado: "Auditoria jurídica para a sociedade democrática".


O livro do proponente configura valiosa monografia, aprovada por Banca, na área do Direito Ambiental, e foi produzido com a finalidade específica de demonstrar a necessidade da criação e regulamentação da auditoria jurídica, como atividade a ser exercida exclusivamente por advogado, via edição de provimento pelo Conselho Federal da OAB.


A obra do advogado proponente se apresenta em XI capítulos, sendo recomendável sua menção como visão panorâmica do livro: O Capítulo I versa sobre ''UM POUCO DE ETIMOLOGIA E O EVOLVER DA PALAVRA AUDITOR"; o capítulo II cuida das ''DIFERENTES AUDITORIAS E SUAS DEFINIÇÕES"; o capítulo III aborda "ADVOGADOS E AUDITORES NO DIREITO CANÔNICO"; o capítulo IV discorre sobre "A AUDITORIA JURÍDICA E ATIVIDADES JURÍDICAS AFINS"; o capítulo V - enfrenta o tema "QUANDO A ÉTICA PASSA A IMPORTAR"; o capítulo VI aborda a ''ÉTICA NA PRAXIS DO EXERCÍCIO DE AUDITORIA JURÍDICA"; versa o capítulo VII sobre "A INDISPENSABILIDADE DA AUDITORIA NA DETECTAÇÃO E COMBATE DE ILÍCITOS CAMBIAIS E FINANCEIROS"; o capítulo VIII aborda "A CRIAÇÃO DE NOVO MERCADO DE AÇÕES CONSAGRA A GOVERNANÇA EMPRESARIAL: COMO A AUDITORIA JURÍDICA SE FARÁ NECESSÁRIA"; o capítulo IX diz respeito a "FUNÇÃO DO AUDITOR JURÍDICO NA EXECUÇÃO DA PERFOMANCE PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA"; no capítulo X cuida de ''VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA CORRUPÇÃO"; e o último - capítulo XI aborda a "CONSAGRAÇÃO DA AUDITORIA JURÍDICA AMBIENTAL COMO EPEFANIA REDENTORA".


Na oportuna observação do magistrado José Renato Nalini - Juiz Vice- Presidente do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:

"O conjunto dos capítulos conduz à edificação de renovado conceito de auditoria jurídica, vista como espectro de pioneiras potencialidades para o operador do direito. Todas as vertentes exploradas revestem interesse".

..........................................................................

Depois da leitura desta auditoria jurídica para a sociedade democrática, muitos profissionais do direito ainda não vocacionados poderão descobrir áreas inexploradas para um exercício jurídico eticamente irrepreensível".

Na conclusão do seu valioso trabalho, o advogado autor e proponente (fls. 171/174), pontua alguns aspectos que merecem transcritos:

1.A origem da palavra remonta ao grego antigo (aisthánesthai = perceber). Passou por longa evolução, variando o seu significado, para novas diversas acepções e funções. Com significado de profissão, na prática anglo-saxã, consagrou-se e, hodiernamente, é a mais conhecida, como usada, em todas as suas variantes.


2.A atividade dos profissionais de auditoria tem sofrido, graças à mundialização, transformações radicais, estando em extinção o trabalho de auditor solo. Sob outro enfoque, as fusões e incorporações, entre as empresas globais, têm diminuído o número de participantes e cartelizado o exercício da profissão.As autoridades reguladoras, para regrar o comportamento ético dos profissionais e das empresas de auditoria, têm emitido normas de conduta, com amplitude mundial, salientando-se o trabalho das entidades norte-americanas (SEC Securities and Exchange Comission, NYSE - New York Stock Exchange e ASE - American Stock Exchange). A auditoria jurídica exercida por advogados é atividade hodierna, que deve não só ser estimulada, como exercitada por profissionais qualificados e ter chancela da OAB, que precisa regulamentá-la. Ela contribuirá para o aperfeiçoamento das instituições democráticas, a partir do momento em que deixará de ser mero espectador, para ser ator da reforma social, uma vez que é responsável pelo que afirmar no seu relatório.


3.No Direito Canônico, o auditor tinha função definida, como auxiliar ou preparador do processo, sem função jurisdicional (Cânon 1.428 e seus parágrafos, Código Canônico ).


4.É fato notório que, sobretudo, a Nova Economia provocou uma verdadeira revolução na prática da advocacia empresarial, passando pela necessária especialização, a exigir controle maior da conduta dos administradores, tendo em conta que o advogado auditor é defensor do estado democrático de Direito e ele só sobreviverá se for respeitada e exercida a cidadania e resguardada a moralidade pública. Abrem-se, com a Nova Economia, novos desafios e caminhos nunca antes palmilhados, com a atuação do auditor jurídico em variados segmentos".

Ao encerramento - fls. 175 - o proponente explicita a RECOMENDAÇÃO, que é o fecho do livro, com proposição assim consubstanciada.

"Em virtude das divergências de interpretação a respeito da função da auditoria jurídica com o exercício conjunto da atividade multidisciplinar, o que é interditado pelo EOAB, mas entendendo que a auditoria jurídica deva ser uma atividade a ser exercida exclusivamente por advogado, recomenda-se a manifestação expressa do Conselho Federal da OAB, para o qual é proposto este modelo de Provimento, para disciplinar o exercício da atividade de auditor jurídico".

Segue-se proposta de provimento que "Dispõe sobre a instituição da auditoria jurídica e seu disciplinamento", em sete artigos, parágrafos e alíneas, como se constata às fls. 175/178 da monografia.


Na condição de relator do processo proferi despacho às fls. 113, dos autos, do seguinte teor:

"Como salienta o proponente, o assunto 'envolve radical revisão da advocacia e tenta modernizá-la, com nova sugestão', no sentido da 'instituição da auditoria jurídica'.


lnobstante a amplitude das funções próprias à categoria dos auditores, que merece considerações específicas, e a polêmica a respeito da possibilidade de se garantir exclusividade ao advogado para a prestação de serviços dessa natureza, estando prevista na minuta de provimento proposta, "a formação de sociedade multidisciplinar" (fls. 05), opino pela prévia manifestação da Comissão de Sociedade de Advogados, solicitando, ainda, a valiosa opinião da douta Comissão, tendo em vista que o Art. 1° do Estatuto da Advocacia e da OAB, no seu inciso II, dispõe como privativas da advocacia somente "as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídica'."

Em nome da Comissão de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB, manifestou-se o seu eminente integrante e Vice-Presidente, advogado Antonio Corrêa Meyer, no parecer de fls. 117/118, aprovado à unanimidade pela Comissão (fls.118), como se subsegue:

"Em sua proposta o exemplar advogado faz referência à formação de 'sociedade multidisciplinar' (v. art. 4° da minuta de provimento, às fls. 5 dos autos).


Com toda a segurança, o Dr. Roso, conhecedor profundo que é do nosso Estatuto, não está a sugerir a formação de uma sociedade que congregasse advogados e profissionais que militassem em outras atividades e áreas do conhecimento, tais como, engenheiros, economistas, contadores, ambientalistas, sociólogos, sanitaristas, cientistas políticos etc. Não é por certo esse o sentido que o Dr. Roso pretende atribuir ao termo "sociedade multidisciplinar" utilizado na minuta de seu provimento.


A sociedade de profissionais de diferentes áreas do conhecimento, ou seja, de diferentes profissões, que também é conhecida na linguagem comum como "sociedade multidisciplinar", não é tolerada pelo nosso Estatuto na dicção clara de seu art. 16 que, por ser lei federal, não pode merecer alteração ou abordagem por mero Provimento. Com efeito, regra aquele dispositivo que "não são admitidas a registro, nem podem funcionar, as sociedades de advogados que apresentem forma ou características mercantis, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia. que incluam sócio não inscrito como advogado ou totalmente proibido de advogar".


O que o Dr. Roso certamente está a propor é a constituição de sociedades de advogados, e só de advogados, que militem entretanto em áreas diversas do Direito. Nesse sentido, ou seja, no sentido da atuação em várias disciplinas jurídicas, é que S.Exa. propõe a existência de sociedades multidisciplinares.

Não vejo nenhum óbice legal à formação de sociedades dessa natureza. Aliás, elas já existem e são muito atuantes. Todas constituídas apenas por advogados inscritos na OAB. A particularidade da proposta a meu ver, diz respeito ao objeto das tais "sociedades multidisciplinares" que, na sugestão do Dr. Roso, dedicar-se-iam ao que ele chama de "auditoria jurídica", submetendo-se a um regime jurídico próprio, a ser criado pelo provimento proposto.

Em conclusão, e reiterando as ressalvas inicialmente feitas neste parecer, que aborda apenas e tão-somente a questão da "sociedade multidisciplinar", tal como ela é tratada pelo Dr. Roso, não vejo qualquer impedimento legal a sociedades multidisciplinares, desde que essa característica se refira a diferentes disciplinas jurídicas, não incluindo, portanto, outras profissões.

É o parecer que s.m.j. submeto à aprovação dessa D. Comissão de Sociedades".

Finalizando o relatório, esclareço ao Egrégio Conselho Federal que tenho por concluídas as presentes considerações, já ao tempo da abertura do segundo semestre do ano pretérito. Todavia, a manifesta intensidade dos trabalhos, naquele período, impediu a apreciação da matéria.


É o relatório.


VOTO


De início ouso convocar os eminentes Conselheiros Federais, os ex-Presidentes (Membros Natos), e os eminentes Conselheiros integrantes da Diretoria da Casa, para paciente reflexão sobre o tema, com vistas à criação e institucionalização da auditoria iurídica, como atividade a ser exercida exclusivamente por advogado, na conformidade da proposição do eminente e talentoso Colega Jayme Vita Roso, de São Paulo.


Enfrentando o núcleo da questão, cabe assinalar que a Lei n° 8.906 de 1994 - EOAB, dispõe, art. 1°, que são atividades privativas de advocacia:

"II - as atividades de consultoria, assessoria e direção . jurídica".

Sobre a institucionalização da auditoria jurídica. considero oportuno registrar a lúcida manifestação dos eminentes homens públicos Paulino Cícero de Vasconcellos e Luiz Marcio Vianna, contida no prefácio da obra do proponente:

"A tese se completa por um conjunto de recomendações que viriam a regulamentar o exercício desta nova e fascinante seara advocatícia pela instituição nacional que regula e fiscaliza a profissão do advogado do Brasil, a sempre patriótica OAB" (fls. 15).

Assim posta a questão, vislumbro a possibilidade de considerarmos a auditoria jurídica, como mais uma modalidade do exercício da advocacia, podendo ser conceituada como um desdobramento da consultoria e da assessoria jurídica, entendimento, que aceito, e adoto, na linha da proposição.


Cumpre todavia, fiel observância às normas deontológicas contidas no Código de Ética e Disciplina.


Nessa linha, necessariamente haverá de ser preservado o sigilo profissional, que constitui princípio inerente ao exercício da advocacia, consoante previsão contida no Código de Ética e Disciplina, arts. 25, 26, 27 e s/ parágrafo único.


A par do sigilo profissional o auditor jurídico, como exercente da advocacia, obrigatoriamente estará subordinado ao art. 1° do CED que "exige conduta compatível com os preceitos deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral dos Provimentos e com os demais princípios da moral individual, social e profissional".


A propósito das normas deontológicas, incorporo ao presente voto as oportunas reflexões cunhadas pelo ilustre advogado proponente:

"A arte da advocacia não pode ficar, portanto, quando aplicada à auditoria jurídica, eqüidistante dos princípios éticos da profissão, expressas nas regras deontológicas, que devem pautar a conduta daquele que estiver envolvido nessa atividade, muito menos inibir a criatividade daqueles que procuram, dentro da lei e da ética profissional, criar nova oportunidade de trabalho para o advogado.


6. Nos últimos anos, a advocacia e seu exercício vêm passando por várias e tormentosas transformações, advindas das novas determinadas pela mundialização, através das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), e pelo inegável desenvolvimento das telecomunicações, sobretudo pela Internet, como elemento catalisador de negócios e de expansão de mercados. Portanto, é no recôndito da sua atuação que o advogado vai se mirar nas regras deontológicas da profissão e fazer delas norte de seu viver, que é reflexo da elevada função pública que exerce.


7. No campo da auditoria fiscal, onde a especialização é marcante, pela gama de conhecimentos interdisciplinares a serem aplicados, a função do auditor jurídico adquire mais dimensão, pois, não só contribui para o aprimoramento das instituições democráticas, do Direito e das leis, como também vai indicar que, por exemplo, somente com o combate sistemático, por via de detecção, os ilícitos cambiais e financeiros podem estancar. A hemorragia causada por eles, nas décadas de 80 e 90, mitigaria a crescente pobreza da população brasileira, donde a importância do auditor jurídico, na detecção e na tarefa de ataque das práticas ilícitas.

...........................................................................


9. Não há dúvida de que a LRF passa a exigir do administrador que maneja fundos públicos a seriedade e a prudência a que não estávamos habituados. Pois, nesse segmento público, o auditor jurídico independente poderá servir de conselheiro legal para o acompanhamento e execução das perfomances ditadas pela nova legislação, sobretudo porque, com o seu parecer, estará vinculado à informação e responderá nos termos da lei (artigo 71, EOAB), muito embora, sempre deva zelar por sua liberdade e independência (artigo 4°, parágrafo único, do COED)."

Ainda sobre o fascinante tema, e também por dever de oficio, informo ao Plenário que a Seccional da OAB/SP "negou existência de serviços que pudessem ser prestados por advogado como auditor jurídico", como aliás reconhece e registra o ilustre Proponente às fls. 08 .


Ouso divergir, data vênia, da valorosa Seccional da OAB de São Paulo.


Até porque, se admitirmos como válido tal entendimento, segue-se o questionamento: se não o advogado, quem estará legitimado para exercer a auditoria jurídica? Porventura seriam os bacharéis de direito!?? Se formos por essa malfadada trilha, não tardarão projetos legislativos, nessa linha de entendimento, a regulamentar uma nova profissão. Parece-me que ao empresariado dos cursos jurídicos tal alternativa se apresentaria como filão inesgotável, que se por ele conquistado, representaria um duro golpe na advocacia e na Corporação dos advogados.


A Ordem dos Advogados do Brasil, nos tempos que correm, tem feição planetária, por estar vinculada às mais expressivas congêneres e entidades internacionais.


No mundo contemporâneo e a nível de direito comparado, observo que a auditoria iurídica está de há muito consolidada e institucionalizada alhures, conforme nos dá noticia a publicação "Auditoria Jurídica", de Hector Charry, editada em Buenos Aires, ed. 1997, que localizei na Biblioteca do STJ.


A Gazeta Mercantil, edição de 26.09.2002, veicula publicidade sobre "curso de auditoria trabalhista", ministrado pelo SESCON - SP e AESCON - S P.


Reconheço que o instigante tema não é pacífico, mas creio ser necessário ousar, na busca legítima desse espaço de trabalho profissional. Urge conceituar a "Auditoria Jurídica", como atividade a ser exercida exclusivamente por advogado, antes que seja tarde...


Em conclusão, voto pela aprovacão da recomendação do eminente advogado Jayme Vita Roso. Como homenagem ao ilustre proponente acolho e adoto, com algumas ressalvas, a minuta no provimento que acompanha a proposição. O Plenário, com a sua sabedoria e discernimento, no momento próprio aperfeiçoará o documento.


A final, dada a inegável complexidade da matéria, sou pela designação de Conselheiro Revisor, com a distribuição ao Plenário da minuta de Provimento que acompanha a proposta e dos demais elementos disponíveis no processo, inclusive o trabalho desta relatoria.


O exame da minuta de provimento ficaria condicionado à manifestação do Conselho Pleno sobre o mérito da proposição.


É como penso e como voto.


Brasília (DF), fevereiro de 2003


Luiz Antonio de Souza Basilio Conselheiro Relator"


4. Mas, afinal, o que é auditoria jurídica?


Da obra que escrevi em 2001, "Auditoria jurídica para a sociedade democrática", concluindo-a, propus o que adiante transcrevo na íntegra, a fim de que os migalheiros tenham uma pálida idéia a respeito dessa nova ferramenta de trabalho para os operadores do direito:


"CONCLUSÃO"


1. A origem da palavra auditor remonta ao grego clássico antigo (aisthánesthai = perceber). Passou por larga evolução, variando o seu significado, para novas diversas acepções e funções. Com significado de profissão, na prática anglo-saxã, consagrou-se e, hodiernamente, é a mais conhecida, como usada, em todas as suas variantes.


2. A atividade dos profissionais de auditoria tem sofrido, graças à mundialização, transformações radicais, estando em extinção o trabalho de auditor solo. Sob outro enfoque, as fusões e incorporações, entre as empresas globais, tem diminuído o número de participantes e cartelizado o exercício da profissão. As autoridades reguladoras, para regrar o comportamento ético dos profissionais e das empresas de auditoria, têm emitido normas de conduta, com amplitude mundial, salientando-se o trabalho das entidades norte-americanas (SEC - Securities and Exchange Comission, NYSE - New York Stock Exchange e ASE - American Stock Exchange). A auditoria jurídica exercida por advogados é atividade hodierna, que deve não só ser estimulada, como exercitada por profissionais qualificados e ter chancela da OAB, que precisa regulamentá-la. Ela contribuirá para o aperfeiçoamento das instituições democráticas, a partir do momento em que deixará de ser mero espectador, para ser ator da reforma social, uma vez que é responsável pelo que afirmar no seu relatório.


3. No Direito Canônico, o auditor tinha função definida, como auxiliar ou preparador do processo, sem função jurisdicional (Cânon 1.428 e seus parágrafos, Código Canônico).


4. É fato notório que, sobretudo, a Nova Economia provocou uma verdadeira revolução na prática da advocacia empresarial, passando pela necessária especialização, a exigir controle maior da conduta dos administradores, tendo em conta que o advogado auditor é defensor do estado democrático de Direito e ele só sobreviverá se for respeitada e exercitada a cidadania e resguardada a moralidade pública. Abrem-se, com a Nova Economia, novos desafios e caminhos nunca antes palmilhados, com a atuação do auditor jurídico em variados segmentos.


5. Pode-se perguntar: Qual a relação ou a importância de se trazer o problema das PM nesta sede?


A partir do momento em que a OAB/SP negou a existência de serviços que pudessem ser prestados por advogado como auditor jurídico, tivemos presente que a análise da profissão, que ela faz, se distancia da realidade. Quase que nega a influência das tecnologias, sobretudo da Internet. Não enfrenta a desabusada invasão de escritórios de advocacia estrangeiros, através de nefastas influências no mercado de trabalho nacional. E não se manifesta, com a necessária clareza, a todos os seus associados que as alianças estratégicas, que estão acontecendo entre escritórios de advocacia, sejam entre si ou com outras profissões, bem como as fusões e incorporações, se não reguladas com rigor, podem, no futuro, danificar ainda mais a imagem do causídico. Disso resultará o prejuízo da função do advogado na sua atividade de preservar o interesse público e, logicamente, serem rebaixados os fundamentos do exercício profissional, no que têm de mais peculiar e valioso. A mercantilização profissional está sendo adotada de forma mascarada pelos escritórios de auditoria internacional, que chegam a propor misteres de advocacia em suas ofertas de prestação de serviço.


Daí a pertinência do debate, enriquecido pela pujante experiência norte-americana, que não deve ser copiada - a realidade é diversa -, mas, levada em conta como argumento discursivo.


A arte da advocacia não pode ficar, portanto, quando aplicada à auditoria jurídica, eqüidistante dos princípios éticos da profissão, expressas nas regras deontológicas, que devem pautar a conduta daquele que estiver envolvido nessa atividade, muito menos inibir a criatividade daqueles que procuram, dentro da lei e da ética profissional, criar nova oportunidade de trabalho para o advogado.


6. Nos últimos anos, a advocacia e seu exercício vêm passando por várias e tormentosas transformações, advindas das novas determinadas pela mundialização, através das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), e pelo inegável desenvolvimento das telecomunicações, sobretudo, pela Internet, como elemento catalisador de negócios e de expansão de mercados. Portanto, é no recôndito da sua atuação que o advogado vai se mirar nas regras deontológicas da profissão e fazer delas norte de seu viver, que é reflexo da elevada função pública que exerce.


7. No campo da auditoria fiscal, onde a especialização é marcante, pela gama de conhecimentos interdisciplinares a serem aplicados, a função do auditor jurídico adquire mais dimensão, pois não só contribui para o aprimoramento das instituições democráticas, do Direito e das leis, como também vai indicar que, por exemplo, somente com o combate sistemático, por via de detecção, os ilícitos cambiais e financeiros podem estancar. A hemorragia causada por eles, nas décadas de 80 e 90, mitigaria a crescente pobreza da população brasileira, donde a importância do auditor jurídico, na detecção e na tarefa de ataque das práticas ilícitas.


8. Tendo em conta que, até o início do mês de abril de 2001, vinte e três empresas de capital fechado, publicamente, anunciaram sua intenção de abrir o capital no Novo Mercado, há variadas atividades concorrentes para o auditor jurídico que desejar se especializar nesse importante segmento profissional.


9. Não há dúvida de que a LRF passa a exigir do administrador que maneja fundos públicos a seriedade e a prudência a que não estávamos habituados. Pois, nesse segmento público, o auditor jurídico independente poderá servir de conselheiro legal para o acompanhamento e execução das performances ditadas pela nova legislação, sobretudo porque, com o seu parecer, estará vinculado à informação e responderá nos termos da lei (artigo 71, EOAB), muito embora sempre deva zelar por sua liberdade e independência (artigo 4º, parágrafo único, do COED).


10. Ultrapassando o combate à corrupção, às propinas e práticas assemelhadas aos limites territoriais dos países, para se tornar prática internacional; sabendo quão nocivas as práticas de lavagem de dinheiro são para cada país e, sobretudo, para os mais pobres, cientes os advogados que deverão prestar contas dos atos profissionais, até com quebra de sigilo e com o dever de denunciar práticas suspeitas, devem eles pautar sua conduta com extrema prudência, competindo aos auditores jurídicos orientar e prover seus clientes com todas as informações necessárias para evitar serem envolvidos em práticas criminosas.


11. Não pode o auditor jurídico que atue num trabalho dentro do Brasil ou fora dele deixar de levar em conta que o espectro conceitual de meio ambiente é extenso, nele estando inserido como pessoa. E o valor da criatura ultrapassa qualquer outro que se lhe compare. Por isso, quer atuando solo, quer com profissionais de áreas afins para um mesmo objetivo, os valores éticos são prevalentes, porque o destinatário é sempre a pessoa humana, cabendo ao auditor jurídico ser intransigente com a preservação do meio ambiente, para resguardar a vida, sobretudo num país como o Brasil, colocado entre os últimos do mundo em qualidade de vida e em renda per capita"1.


5. Estou revivendo a auditoria jurídica para os migalheiros, uma vez que questionado pela minha jovem colega Andréa Teixeira Pinho, e deveria dar-lhe uma resposta adequada, dizendo que continuo empenhado no tema, em benefício da Classe. E adianto mais. Encontrei um deputado federal interessado em apresentar um projeto de lei à Câmara, a fim de introduzir no artigo 1º, II, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil a auditoria jurídica, tout court. Com isso, se acolhido, competirá ao Egrégio Conselho Federal a promulgação de Provimento, que disporá sobre a instituição da auditoria e seu disciplinamento, logicamente que com os preciosos subsídios que trarão os nobres Conselheiros Federais.


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NOTA BIBLIOGRÁFICA


1ROSO, Jayme Vita. Auditoria jurídica para a sociedade democrática. São Paulo: Escolas Profissionais Salesianas, 2001. p. 173-176. Os interessados em conhecer mais a respeito desse fascinante trabalho poderão contatar-me para receber algumas informações adicionais. Sobre o tema já escrevi alguns artigos:


Auditoria jurídica: apontamentos para o moderno exercício da advocacia

(São Paulo: Editora STS. Buenos Aires: Hammurabi, 2003)

  • Contribución para una auditoria jurídica y una auditoria multidisplinaria (p. 193).

Anorexia da ética e outros escritos

(Belo Horizonte: Armazém de Idéias, 2004)

  • Advocacia e atividades multidisciplinares: urge coibir a prática (p. 149).
  • Os contratos de licenciamento internacional de tecnologia à luz da auditoria jurídica (p.233).
  • Variações sobre a advocacia e a auditoria jurídica (p. 297).
  • Administrar e controlar com o auditor jurídico: os rumos do Direito societário em um mundo conturbado (p. 326).
  • Poderá a auditoria jurídica servir de apoio a governabilidade das instituições? (p. 338).

Colocando o 'i' no pingo e outras idéias jurídicas e sociais

(São Paulo: RG Editores, 2005)

  • O caso Enron e a necessidade da auditoria jurídica (p. 131).
  • Responsabilidade civil na era da informação e tecnologia em o novo Código Civil: o rol do auditor jurídico (p. 223).

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*Advogado do escritório Jayme Vita Roso Advogados e Consultores Jurídicos









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