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Os novos direitos dos empregados domésticos e o contrato a tempo parcial de trabalho

Jorge Luiz Dantas

Em abril, foi promulgada a EC 72/13, que estabeleceu igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Atualizado às 14:46

Desde o dia 3/4/13, a comunidade jurídica e, sobretudo, a sociedade vem debatendo sobre a PEC 66/12, mais conhecida como "PEC das Domésticas" e, como toda mudança legislativa, iniciam-se as grandes discussões acerca da sua aplicabilidade. Hoje não há o que se falar de PEC, eis que o texto foi devidamente aprovado (EC 72/13) e agora passa a compor o art. 7º da CF.

Não é o propósito desde artigo, diga-se de passagem, discutir as controvérsias mais comuns sobre as normas que necessitam de regulamentação (multa do FGTS, por exemplo), mas sim demonstrar que com a equiparação dos trabalhadores domésticos aos empregados "normais", algumas possibilidades de contratação - que antes se restringia às empresas - começam a ter aplicabilidade e que podem ser úteis para a uma parcela da população.

Apenas fazendo um adendo, por ser relevante, há de ressaltar que a EC ora discutida é norma vigente e, apesar de muitos alegarem que carecem de regulamentação, a norma deve ser aplicada de forma plena e, até que seja devidamente regulamentada, todos os trabalhadores domésticos deverão ter jornada de 8 horas diárias e 44 semanais, FGTS de 8%, multa de 40%, etc., enfim, igual aos trabalhadores que conhecemos regidos pela CLT.

Desta sorte, todos as empregadas domésticas, babás, cuidadores de idosos, motoristas, jardineiros que antes laboravam sem qualquer tipo de controle de horários e até sem algumas garantias, passarão a ter direitos iguais aos empregados CLT. Vejamos o texto constitucional após a referida Emenda:

"Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)

Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e XXVIII, bem como a sua integração à previdência social."

Diante desse novo rol de direitos, faz-se necessária uma reflexão sobre alguns incisos que autoriza o pensando do presente artigo: a contratação do empregado doméstico através do contrato a tempo parcial de trabalho.

De acordo com os incisos IV e V do art. 7º supra mencionado, todos os trabalhadores devem perceber um salario mínimo proporcional à extensão e a complexidade do trabalho realizado. Já o inciso XIII, no entanto, afirma que a duração normal do trabalho não será superior a oito horas diárias e 44 horas semanais, sendo, também, facultada a compensação de horários e a redução de jornada.

Da interpretação das referidas normas constitucionais, infere-se duas conclusões: (i) que o salário mínimo é calculado com base na jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 horas semanais e (ii) há possibilidade de reduzir a jornada e contratar o empregado e pagar à proporção do trabalho realizado.

A doutrina entende que o trabalho deve ser remunerado de acordo com a jornada trabalhada. Nesse sentido, utilizo trecho de um artigo1 do juiz do Trabalho paraense Ney Stany Morais Maranhão, que trouxe diversas opiniões dos grandes juristas laboralistas brasileiro acerca desta temática, vejamos:

"De fato, aduz o saudoso VALENTIN CARRION que:

"... a lei usou o critério de remuneração diária e previu a jornada normal; quando esta for de 8 horas, será necessário cumpri-la; se o empregado for admitido para trabalhar apenas 4 horas por dia, receberá proporcionalmente, sem qualquer ilegalidade" (Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, 29ª Edição, São Paulo : Saraiva, 2004, página 130).

MAURICIO GODINHO DELGADO, com propriedade, explica que se o empregado:

"... foi contratado e labora 110 horas por mês, por exemplo, [já incluído o repouso semanal remunerado] - pertencendo a uma categoria ou profissão cujo salário se calcule à base de 220 horas mensais -, receberá, ao final do mês, o salário correspondente ao montante de 110 horas [e não o padrão de 220 horas] " (Salário - Teoria e Prática, Belo Horizonte : Del Rey, 1997, página 115).

ALICE MONTEIRO DE BARROS, por sua vez, ensina que se afigura:

"... lícita a contratação para jornada reduzida com salário mínimo proporcional às horas trabalhadas" (Curso de Direito do Trabalho, São Paulo : LTr, 2005, página 760).

AMADOR PAES DE ALMEIDA, de seu turno, afirma que:

"... o salário mínimo é a contraprestação a ser paga ao empregado que cumpre jornada normal de trabalho; admitido para jornada reduzida, facultado é ao empregador pagar-lhe proporcionalmente às horas trabalhadas" (CLT Comentada, São Paulo : Saraiva, 2003, página 94).

Compartilha do mesmo entendimento JULPIANO CHAVES CORTEZ, ao expressar:

"... que o salário mínimo pode ser pago proporcionalmente à jornada de trabalho" (Direito do Trabalho Aplicado, São Paulo : LTr, 2004, página 255)."

Não obstante isso, o TST também já consolidou o entendimento após a edição da orientação jurisprudencial 358 da SDI-1. Eis o seu texto:

Nº 358 SALÁRIO MÍNIMO E PISO SALARIAL PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. POSSIBILIDADE. DJ 14.03.2008

Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado.

Portanto, uma vez que agora os empregados domésticos foram devidamente equiparados aos trabalhadores comuns e que doravante terão os mesmos direitos e obrigações, essa classe trabalhadora também poderá ser contratada através do contrato a tempo parcial de trabalho.

De acordo com os artigos que disciplinam o contrato de trabalho, esse instrumento pode ser tácito ou expresso e que as relações de trabalho podem ser objeto de livre estipulação (inteligência dos artigos 442 e 444 da CLT), porém, em se tratando de contratos especiais de trabalho, estes devem ser completamente formalizados e, acima de tudo, claros com o seu fim, sob pena de ser considerado um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Ou seja, todo e qualquer contrato especial de trabalho deve ser formalizado, como é o caso, por exemplo: do contrato por experiência, trabalho temporário, estágio, tempo parcial, etc.

Considera-se, portanto, contrato a tempo parcial aquele cuja duração não exceda 25 horas semanais (art. 58 da CLT). Nesse tipo de contratação, os demais direitos (13º, FGTS, etc.) também serão pagos de forma proporcional e da mesma sorte as férias, que seguem a tabela do art. 130-A da CLT.

Imperioso ressaltar que esse contrato deve ser formalizado, contendo expressamente uma cláusula de jornada parcial de acordo com o art. 58 da CLT e, além disso, a anotação expressa na CTPS do empregado. Sem essas formalidades, o contrato não será considerado válido.

Há outro ponto de extrema relevância e que o empregador deve ficar sempre atendo nesse tipo de contratação: o empregado que foi contratado por tempo parcial, não pode, em hipótese alguma, trabalhar em horário extraordinário (hora extra), sob penda de invalidação do contrato de trabalho a tempo parcial.

Forçoso dizer, também, que para esse tipo de empregado o controle de jornada deve ser obrigatório.

Há quem advogue que o contrato a tempo parcial só será válido com autorização sindical, contudo, essa questão é controvertida na jurisprudência e não há qualquer impedimento para a realização deste tipo de contratação. O ideal, para rechaçar qualquer tese contrária, seria a autorização pelo sindicato.

De toda sorte, independentemente da referida chancela sindical, o instrumento de contratação a tempo parcial e o respectivo pagamento de salário proporcional pode ser uma alternativa, sobretudo, para os empregadores que não tem condições de manter um empregado em tempo integral.

Por todo o exposto, uma vez que os empregados domésticos foram devidamente equiparados aos trabalhadores comuns, aqueles também podem ser contratados de forma especial e de acordo com as leis e regras que regem os trabalhadores em nosso país.

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1 MARANHÃO, Ney Stany Morais. Salário mínimo proporcional à jornada. Validade aferida pelo coligamento dos prismas jurídico e social. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1176, 20 set. 2006 . Disponível em: <https://jus.com.br/revista/texto/8918>. Acesso em: 3 maio 2013.

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* Jorge Luiz Dantas é advogado do escritório Mello Pimentel Advogados.





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