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Impacto do CPC/15 nos condomínios edilícios

São respostas modernas para problemas atuais e que, espera-se, sejam materializadas em melhorias em favor do condomínio e seus integrantes.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Atualizado às 08:16

No ordenamento jurídico, a primeira disposição sobre os condomínios edilícios foi trazida pelo decreto 5.481/28, que, mesmo nos primórdios desse tipo de edificação no Brasil, já abordava em seu art. 9º, a necessidade de rateio da despesa comum, de acordo com o valor de cada propriedade, na forma definida em Assembleia anual. No bojo do processo de industrialização e desenvolvimento dos grandes centros urbanos, com ápice na construção de Brasília, a lei 4.591/64 foi a primeira a dispor especificamente sobre os condomínios edilícios, trazendo normas sobre a Convenção de Condomínio, a partir de seu art. 9º, e sobre o rateio de despesas, a partir do art. 12, dentre outros.

Regulando matéria tão essencial à vida contemporânea, modernamente, o Código Civil de 2002 trouxe novas disposições, a partir do art. 1.335. Em 2016, o novo Código de Processo Civil modificou alguns aspectos, em especial no que tange à cobrança das quotas condominiais e possibilidade de recebimento de citação pelo porteiro.

Em primeiro momento, cabe apontar a definição de condomínio edilício, que é o conjunto de edificações composto de partes particulares (tais como apartamentos, salas comerciais, lojas e sobrelojas) e partes de propriedade comum dos condôminos (como o solo, o telhado, rede de energia elétrica, de esgoto e gás, acesso à via pública, o terraço de cobertura, salvo disposição de convenção de condomínio em contrário, dentre outros), a teor do art. 1.331 do Código Civil. O ato de instituição do condomínio edilício deve ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis, com descrição detalhada de suas unidades, a fração ideal de parte comum correspondente a cada unidade, bem como o fim a que se destinam (art. 1.332 CC).

É sabido que, pela própria natureza humana, a vida em sociedade é repleta de percalços, sobretudo em se tratando do convívio com pessoas estranhas. Por essa razão, o legislador erigiu uma série de regras que devem ser seguidas por todos os condôminos, e que se materializam, em cada caso, na convenção de condomínio. Uma das principais regras, é a de que, para manutenção da estrutura ofertada, o condômino deverá pagar a quota condominial na proporção de sua fração ideal (art. 1.336, I CC), na forma fixada em convenção de condomínio (art. 1.334, I CC),

Ora, sabendo que tal quota se destina ao funcionamento do próprio condomínio, custeando as despesas ordinárias e extraordinárias, a inadimplência gera, em última instância, a paralisação da estrutura, culminando com o corte de serviços, lesando não apenas os condôminos inadimplentes, como aqueles que arcaram com suas obrigações. E assim como não existe o condomínio sem as unidades particulares que o compõem, estas são atreladas às partes comuns e seus serviços, que inclusive, na vida cotidiana, acabam muitas vezes por influenciar na aquisição de determinado imóvel. É direito do condômino, assegurado por lei, o uso não só de sua unidade, como também da parte comum, conforme art. 1.336, incisos I e II CC, de onde se depreende que nada mais natural que uma legislação moderna conferisse maior celeridade à cobrança das referidas quotas.

E foi justamente o que ocorreu com o advento do novo CPC, em 2016. A novel legislação prevê a possibilidade de execução direta dos valores, uma vez que as quotas condominiais passam a ter status de título executivo extrajudicial. O Código de 1973, atento às necessidades impostas pela matéria já havia proclamado que as cobranças de condomínio deveriam tramitar pelo rito sumário (art. 275, II, "b" CPC/1973), mais simples e célere à época. Uma vez julgado procedente o pedido do condomínio, após o trânsito em julgado do arrastado processo de conhecimento, o valor do débito poderia ser executado com base na sentença (título executivo judicial). A inovação acabou por não atender os anseios de síndicos e condomínios, uma vez que, com a estrutura morosa do Poder Judiciário, mesmo com o trâmite da cobrança por um rito mais simples, levava-se anos até o efetivo recebimento dos valores. Diversas medidas foram adotadas pelos credores nesse período, como a inscrição do devedor de quota condominial em cadastro de inadimplentes, mas de forma global, havia a necessidade de um procedimento ainda mais célere.

Sensível a essa necessidade, como já exposto, o CPC/15, em seu art. 784, X estabeleceu que é título executivo extrajudicial o crédito decorrente de despesas ordinárias e/ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na convenção e/ou aprovadas em assembleia geral de condôminos, desde que documentalmente comprovadas. A representação do condomínio no processo deve se dar na pessoa de seu administrador ou síndico, conforme art. 75, XI do CPC/15.

Pela nova sistemática não haverá mais processo de conhecimento para as cobranças das dívidas de condomínio, que por serem título executivo extrajudicial, já podem ser diretamente executadas. O condômino devedor será citado para, no prazo de 3 (três) dias contados da citação, efetuar o pagamento, nos termos do art. 829 do CPC/15. Não o fazendo, sofrerá as medidas punitivas, inclusive com possibilidade de penhora da unidade imobiliária que gerou a dívida condominial em questão, uma vez que a penhora recairá sobre os bens indicados pelo exequente. Neste caso, o imóvel não é garantido pela impenhorabilidade reservada ao bem de família, uma vez que é exceção prevista na lei 8.009/90, que dispõe em seu art. 3º, IV que o bem pode ser penhorado na cobrança de impostos, taxas e contribuições devidas em virtude do imóvel familiar.

O devedor possui, na execução, a faculdade de indicar outros bens à penhora, que podem ser aceitos pelo juiz, de forma que a constrição se torne menos onerosa para o condômino desde que não gere prejuízos para o exequente (art. 829 §2º CPC/15). Caso o executado não seja localizado, serão arrestados, ou seja, apreendidos judicialmente, tantos bens quanto forem necessários para a satisfação da penhora.

Ao devedor, cabe opor Embargos à Execução, dispostos a partir do art. 914 do CPC/15. Em sua defesa, independentemente de caução, penhora ou arresto, poderá alegar a inexigibilidade do título, excesso de execução, incompetência do juízo ou qualquer outra matéria de defesa alegável em processo de conhecimento. Muito embora não seja a regra, os embargos poderão ser dotados de efeito suspensivo, quando presentes os requisitos da tutela provisória e garantida a execução (art. 919, §1º CPC/15). Assim, é certo que o procedimento será dotado de uma maior celeridade. Contudo, com a ampla possibilidade de resposta do executado, verifica-se que malgrado a pretensão dos condomínios e síndicos em obter o deslinde da questão em exíguo prazo, ainda que justa, deve ser garantido ao executado o direito à resposta com a amplitude trazida pela Lei, sob pena de ser configurado o cerceamento de defesa e possível excesso de execução.

Caso o credor prefira, poderá efetuar a cobrança da maneira tradicional, através de processo de conhecimento, com vistas a obtenção de título executivo judicial, a ser executado em momento posterior nos termos do art. 785 do CPC/15.

Em relação aos juros cobrados pelo devedor, não houve avanço legal. O percentual previsto no Código Civil, arts. 1.336, § 1º e 1.337, continua a ser aplicado, em regra: juros de 1% (um por cento) ao mês e multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito, sendo que, no caso de não cumprir reiteradamente com seus deveres perante o condomínio, o devedor poderá responder com multa de até um quíntuplo das obrigações condominiais, conforme a gravidade das faltas, desde que assim deliberado por três quartos dos condôminos. A jurisprudência, por outro lado, em recente julgamento do STJ entendeu que é possível a cumulação de penalidade pecuniária no montante de 10% (dez por cento, inserida no percentual do art. 1.337 CC) com multa moratória de 2% (dois por cento, prevista no art. 1.336, § 1º CC) sobre o débito, aplicável apenas ao devedor contumaz (STJ, Resp 1.247.020/DF, Rel.: min Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 11/11/15). Trata-se de importante precedente, que promove a solidariedade condominial e estabelece a necessária punição para o chamado condômino nocivo ou antissocial, que passa a ser visto não só como aquele que usa seu imóvel para a prática de atividades ilícitas, mas também o que não cumpre com o pagamento de suas obrigações e através de sua prática contínua fere as normas de convivência entre os integrantes do condomínio, colocando em risco sua própria existência.

Ressalte-se que condômino é o proprietário do imóvel e aqueles a ele equiparados nos termos do art. 1.334, §2º do CC, a saber: os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas. Assim, ainda que o contrato de locação transfira para o locatário a responsabilidade de pagamento de quotas condominiais, perante o condomínio, é o proprietário quem continuará respondendo pelo débito, podendo o último, contudo, acionar o inquilino em ação de regresso para pagamento das rubricas sob sua responsabilidade.

No caso das modificações atinentes ao procedimento citatório, havendo citação pelo correio, se o citando residir em condomínio edilício ou loteamento com controle de acesso, será válida a citação na pessoa do porteiro ou pessoa responsável pela correspondência, que poderá recusar o recebimento declarando, por escrito, que seu real destinatário está ausente, sob as penas da lei, conforme prevê o art. 248 §4º do CPC/15.

Na citação por hora certa, também será válida se realizada na pessoa do porteiro. O número de tentativas na citação por hora certa cai de 3 (três) vezes, como previsto na legislação anterior, para apenas 2 (duas), a teor do art. 252 do CPC/15. Não sendo encontrado o citando após as 2 (duas) tentativas e havendo suspeita de ocultação, o oficial de justiça poderá intimar qualquer pessoa da família, vizinho ou porteiro de que voltará no dia útil subsequente, na hora marcada, para efetuar a citação. Caso o citando não se faça presente, o oficial dará por feita a citação, como já ocorre tradicionalmente.

Como a celeridade e a simplificação dos ritos dá o tom ao novo CPC, não poderia deixar de ser diferente em relação aos condomínios edilícios. Por um lado, a lei impõe aos condomínios que se modernizem criando sistemas próprios de comunicação, uma vez que restou pacificada que a citação poderá ser feita na pessoa do porteiro, na forma da lei. Por outro lado, a adesão, seja expressa ou tácita à convenção do condomínio, cria um vínculo, em geral duradouro entre as partes, e daí naturalmente decorrem problemas de naturezas diversas. Ciente da necessidade de um justo rateio entre as partes integrantes desse microssistema social para a manutenção da estrutura, o novo código processual atende a apelos, simplificando a forma de cobrança da dívida condominial. São respostas modernas para problemas atuais e que, espera-se, sejam materializadas em melhorias em favor do condomínio e seus integrantes.

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*Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme é sócio de Almeida Guilherme Advogados Associados.

*Carolina Alves O. Rocha é associada à Almeida Guilherme Advogados Associados do RJ.

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