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O STJ e as estratégias de marketing da indústria do tabaco

Adriana Carvalho e Claudia de Moraes Pontes Almeida

Espera-se que o STJ emita decisões alinhadas, sem aplicar aos cigarros uma postura mais permissiva e tolerante, como temos visto em ações de responsabilidade civil da indústria do tabaco.

terça-feira, 19 de abril de 2016

Atualizado em 18 de abril de 2016 10:37

Está nas mãos do STJ a possibilidade de um julgamento histórico, capaz de inibir futuras estratégias de marketing da indústria do tabaco, que sejam abusivas, enganosas e voltadas para crianças e adolescentes. A sessão está designada para o dia 19 de abril.

A Quarta Turma do STJ já iniciou o julgamento da ação movida pelo Ministério Público do Distrito Federal, sobre a abusividade e enganosidade de publicidade de cigarro da empresa Souza Cruz, veiculada ao longo do ano de 2000, na televisão brasileira. O julgamento foi suspenso, por causa de um pedido de vista do ministro Raul Araújo.

Vale lembrar que este mesmo tribunal, há poucas semanas, proferiu decisão histórica e reconheceu como ilegal a publicidade infantil em um caso de alimentos industrializados. Espera-se que o STJ emita decisões alinhadas, sem aplicar aos cigarros uma postura mais permissiva e tolerante, como temos visto em ações de responsabilidade civil da indústria do tabaco.

É importante que o(a)s ministro(a)s desta Corte saibam que realizar marketing para jovens com menos de 21 anos faz parte da estratégia dessa indústria desde a década de 1950, conforme já reconhecido pela Justiça norte-americana, a fim de recrutar fumantes substitutos que garantissem o seu futuro econômico.

No comercial em questão, da marca Free, intitulada "artista Plástico II", há um monólogo com o texto: "Meu nome é Daniel Zanage. Eu trabalho com luz, computador, arte, filmes, sombra, letras, imagens, pessoas. Vejo as coisas assim: certo ou errado, só vou saber depois que eu fiz. Eu não vou passar pela vida sem um arranhão. Eu vou deixar a minha marca."

O laudo pericial concluiu que "a verbalização utilizada na publicidade, tem efeito especial junto a crianças e adolescentes, considerando as dificuldades próprias destas fases e a possibilidade de identificação com a linguagem e comportamento utilizado pelo protagonista".

O TJ do Distrito Federal concluiu que a propaganda se revela enganosa (por transmitir mensagem capaz de induzir a erro o consumidor sobre as características e natureza do produto promovido), e também abusiva (por se aproveitar de deficiência de julgamento e experiência da criança, e por ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde).

Também concluiu que "o teor da propaganda transmite a conduta de um jovem com postura inconsequente e irresponsável perante a vida, o que, por certo, tem o poder de influenciar não só as pessoas de mesma faixa etária, mas que não tenham formação emocional e psicológica solidificadas, ou pior, atingindo crianças e adolescentes".

A empresa foi inicialmente condenada ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 14 milhões, mas o TJ/SP reduziu a condenação R$ 7 milhões. A empresa recorreu, ainda, ao STJ, onde aguarda julgamento.

Ainda que a publicidade em questão tenha sido veiculada nos meios de comunicação de massa quando a lei ainda permitia, o fato é que essa publicidade é ilícita por ser abusiva e enganosa, e atinge crianças e adolescentes, conforme farta prova produzida no processo. A indústria do tabaco não pode fazer esse tipo de promoção do seu produto, que é danosa e atinge toda a coletividade, e sair impune. Torçamos para que não se negue vigência ao Código de Defesa do Consumidor e seja feita justiça!

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*Adriana Carvalho é advogada e coordenadora jurídica da ACTbr - Aliança de Controle do Tabagismo.

*Claudia de Moraes Pontes Almeida é advogada do IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.


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