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Exames médicos invasivos em concursos públicos

Ocorre que muitas vezes os exames exigidos ou mesmo o rol de doenças ou condições incapacitantes previstos no edital não guardam pertinência com o cargo a ser exercido.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Atualizado em 9 de novembro de 2016 10:38

O recém publicado edital do concurso para provimento dos cargos de Técnico e Analista do TRE/SP trouxe, em uma de suas cláusulas, disposições que reascendem uma polêmica antiga no mundo nos concursos públicos.

Trata-se da cláusula 15, que exige, dentre outros, os seguintes exames:

h) Citologia oncótica (Papanicolau) para os candidatos do sexo feminino;

i) Mamografia para os candidatos do sexo feminino com mais de 50 (cinquenta) anos;

j) Dosagem do PSA (antígeno prostático específico) para os candidatos do sexo masculino com mais de 50 (cinquenta) anos.

A princípio, importa consignar que não há qualquer proibição de exigência de exames médicos nos editais de concursos públicos, e o fundamento é, inclusive, constitucional: a eficiência na contratação dos representantes da Administração Pública. Geralmente, os editais dos concursos que abrangem a fase de inspeção médica exigem, dos candidatos, a realização de exames clínicos, oftalmológico, odontológicos, toxicológicos, biométricos. Tais exames têm a finalidade de averiguar a aptidão física e mental dos candidatos.

Ocorre que muitas vezes os exames exigidos ou mesmo o rol de doenças ou condições incapacitantes previstos no edital não guardam pertinência com o cargo a ser exercido. Pelo contrário: traduzem-se em verdadeira arbitrariedade ou discriminação da Administração.

No caso do concurso do TRE, o órgão apresentou, como justificativa, o fato de que o exame admissional realizado no TRE/SP visa, além da avaliação de saúde do candidato no sentido de se averiguar aptidão ao trabalho, a prevenção em todos os seus níveis.

Entretanto, o próprio edital determina que "somente serão empossados os candidatos considerados aptos em inspeção de saúde de caráter eliminatório". Ou seja: a princípio, a tal "medida preventiva" poderia sim desclassificar o candidato.

Outro caso também recente chamou a atenção: o Corpo de Bombeiros do Distrito Federal: mulheres que quisessem se candidatar ao cargo deveriam apresentar laudo do Papanicolau ou comprovar que não tiveram o hímen rompido. Não havia nenhuma estipulação semelhante para homens. Diversos especialistas manifestaram suas opiniões sobre a inconstitucionalidade da exigência, por ofenda aos princípios da intimidade e dignidade, e pelo desrespeito à igualdade de gêneros (este último ponto não aplicável ao concurso do TRE, vez que há a exigência, para homens, do exame de próstata).

Questionada, a Secretaria de Segurança afirmou que ainda que tenha havido cautela da instituição em relação à saúde das candidatas, a medida preventiva mostra-se excessiva e, portanto, desnecessária para constar em um concurso público. O edital foi retificado por determinação do governador do DF.

Recentemente, o Conselho Regional de Medicina autoriza que, quanto ao exame Papanicolau, as candidatas apelam a dispensa médica do teste, sem que tenha que apresentar qualquer justificativa para tanto. A informação é da defensora e coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, Yasmin Mercadante Pestana.

Segundo Yasmin, a orientação é que a candidata apresente um relatório de seu médico de confiança, sob sigilo, atestando que o exame não poderá ser feito. E tal documento deve servir para suprir a exigência do edital. Em caso de desclassificação, ainda que o relatório acima tenha sido apresentado, cabe mandado de segurança.

Em conclusão, cabe-nos salientar que não se pode transvestir de "medida preventiva" uma arbitrariedade em edital de concurso público. Muito embora concordemos com a necessidade da prevenção, não concordamos que ela seja feita por este meio.

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*Luciana Pimenta é coordenadora pedagógica no IOB Concursos, advogada e revisora textual.

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