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Programas de compliance e indicadores de gestão

Para que comportamentos éticos sejam estabelecidos na prática e não somente no papel, os indicadores de gestão assumem papel primordial.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Atualizado em 10 de fevereiro de 2017 09:56

Com a entrada em vigor da lei 12.846/13, comumente conhecida como a lei anticorrupção, houve uma quebra de paradigma com relação a práticas de combate a corrupção no Brasil. Isto porque, a percepção de que a corrupção é um problema exclusivo do setor público já não faz mais sentido uma vez que a mencionada lei estabelece punições às pessoas jurídicas privadas que estejam envolvidas em atos lesivos à administração pública. A questão hoje é, portanto, relativa tanto ao setor público quanto ao setor privado.

Neste sentido, não apenas por uma obrigação legal, mas também para viabilizar seus negócios de maneira sustentável, as empresas devem buscar medidas para identificar, monitorar e coibir práticas contrárias à legislação, além de promover o senso ético entre seus colaboradores.

A busca destes e outros padrões de comportamento formam os pilares dos chamados "programas de compliance". Quando as empresas passam a estruturar tais programas em sua realidade de negócios, estas cumprem com seu papel social de combate à corrupção, não apenas mitigando sua exposição ao risco, como também contribuindo ativamente no mercado na criação de um ambiente de negócios justo.

Diversos são os pilares que sustentam um programa de compliance, tais como a existência de um código de conduta e políticas internas, mecanismos de controles internos, treinamento de pessoas e comunicação, a existência de um canal de denúncias tanto para colaboradores como para terceiros, investigações internas, análise ética de prestadores de serviços (Due Diligence) e demais mecanismos de prevenção de fraudes e violações à norma.

Nesta ótica, não é demais lembrar que o objetivo principal do programa de compliance é atingir comportamentos. Do contrário, não servirá à mitigação de riscos, seja de maneira preventiva, por não coibir práticas ilegais, seja de maneira posterior, por não conseguir pleitear reduções de multa frente às autoridades por conta de ter um programa de compliance inefetivo, que existe somente no papel e não na realidade.

O gerenciamento do programa de compliance representa um grande desafio, não apenas porque a legislação de regência é recente, mas também porque o seu sucesso depende basicamente de atividades e ações constantes, dinâmicas e focado em pessoas.

Contudo, para que este e outros objetivos de um programa de compliance sejam atingidos, ou seja, para que comportamentos éticos sejam estabelecidos na prática e não somente no papel, é de extrema importância o comprometimento da alta administração da empresa. Comprometimento significa participação ativa destas pessoas em promover, participar, viabilizar recursos e, sobretudo, gerenciar o programa de compliance, sendo a viga mestra deste.

Neste cenário que os indicadores de gestão assumem papel primordial. A alta gestão da empresa comumente possui restrições de tempo e até mesmo restrições físicas de estar próximo a tudo o que acontece no dia-a-dia. Os indicadores, portanto, viabilizam a participação ativa da administração da empresa para com o compliance.

Seguindo a velha máxima de gestão que diz que não se gerencia o que não se mede, não se mede o que não se define, não se define o que não se entende e não há sucesso no que não se gerencia, é possível afirmar que grande parte do papel do primeiro escalão das empresas está em analisar indicadores e, a partir disto, propor ações concretas.

Os indicadores devem variar conforme a realidade de cada empresa e sua exposição ao risco. Entendido o grau de exposição ao risco, é possível então definir as políticas esperadas de todos os colaboradores da empresa. Definido o escopo das políticas, é possível estabelecer monitoramento periódico e a partir de então gerenciar a sua efetividade e, ainda, fomentar sua existência e continuidade.

Quando a alta gestão consegue ter esta visão do todo, entendendo seus riscos, sabendo quais medidas foram adotadas para mitigação de riscos, quais foram eventuais medidas corretivas tomadas em determinado períodos, propondo mudanças e até mesmo cobrando resultados, fica evidente o comprometimento com as iniciativas de compliance. Os indicadores de gestão são apenas e tão somente o meio para concretizar tal comprometimento.

Não apenas, é de se notar o efeito cascata gerado pelo comprometimento da alta gestão da empresa ao trabalhar com os indicadores de gestão dado que, para que tais indicadores sejam gerados, é imprescindível o funcionamento de todos os pilares do programa de compliance.

De fato, existem diversas outras iniciativas que demonstram comprometimento da administração da empresa para com o compliance. Em muitas publicações é possível enxergar iniciativas como mensagens escritas para os funcionários, estar presente em treinamentos de compliance, dentre outras medidas. Obviamente tais medidas são importantes e também demonstram comprometimento, mas nada substitui a visão do todo.

Ao imaginar uma entrevista com uma autoridade que esteja avaliando o programa de compliance de determinada empresa infratora, será muito mais efetivo demonstrar o conhecimento de todos os KPIs (Key Performance Indicators) de todos os pilares de compliance do que demonstrar uma presença em treinamentos e/ou e-mails corporativos. As iniciativas se complementam, mas o engajamento será demonstrado na prática e não no mundo ideal.

É dever do departamento de compliance, que deve ser independente, gerar tais indicadores de gestão, monitorando todo o programa, e buscando o comprometimento da alta gestão por meio dos indicadores que demonstrem todo o andamento do programa de integridade.

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*Paulo Henrique Gomiero é membro do Departamento Jurídico e Compliance da Mitsubishi Corporation do Brasil S.A.

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