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Dia de escolha

Embora não possamos controlar os eventos que ocorrem em nossas vidas, podemos decidir qual o significado eles terão em nossa jornada a partir de então.

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Atualizado às 08:48

Difícil explicar o que significa o dia 15 de julho para mim. Poderia significar o dia em que provei o maior sofrimento de minha vida, poderia ser o dia em que conheci a verdadeira face da maldade humana, o dia em que eu fui vitimado por um ataque covarde e cruel, o dia em que eu recebi a dádiva de um livramento, de um renascimento, ou seja: o dia em que estive mais próximo a Deus.

Os flashes ainda permanecem em minha memória. A secretária anuncia a chegada de um pacote. Um presente? Começo a abri-lo. Vejo fios, algo errado. Era uma emboscada. "Sai de perto", grito para ela, que permanece inerte sentada de frente para a bomba, sem reação. Tento jogar o pacote para fora da sala. Não consigo. Explosão. Dor. Amputação. Questionamentos. Indignação.

Um dos grandes ensinamentos que tive nesses 12 meses foi entender que, embora não possamos controlar os eventos que ocorrem em nossas vidas, podemos decidir qual o significado eles terão em nossa jornada a partir de então. Por isso, falar sobre o dia 15 de julho de 2016, para mim, é falar sobre escolha. Sobre como enfrentar os percalços da vida diante daquilo que ocorreu e não se pode mais voltar atrás.

Foram meses de muitas cirurgias, medicamentos, reabilitação e adaptação a uma nova condição, uma mão dilacerada com apenas dois dedos. Era preciso preparar a mente para conviver com essa limitação, desenvolver a resiliência e manter a obstinação pelo direito de continuar a trilhar o meu caminho em busca de sonhos e projetos.

O exercício do direito individual de viver com plenitude não ficaria apenas na aceitação de uma nova condição, no aprendizado de uma nova habilidade para digitar as petições, entre outras adaptações. Incluiria também o direito de exercer a profissão a que me sinto tão vocacionado, desde os primeiros anos de universidade. Num mundo onde penso que deveria imperar a liberdade e a democracia, eu jamais poderia deixar esse episódio me tornar um profissional acuado.

Por isso, completo um ano de renascimento com uma mentalidade diferente. Ao invés questionar "por que eu?", mudei a pergunta para: "para que eu?". O emblemático atentado que sofri só aumentou a minha responsabilidade e o meu compromisso com a missão de defender os direitos dos cidadãos e de contribuir com o resguardo das instituições que o promovem.

Temos que ser corajosos, não nos deixar abater pelas adversidades, por mais dolorosas que elas sejam, e continuar a ver a vida de uma maneira destemida e livre de qualquer rancor e amargura.

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*Walmir Cunha é advogado, e sofreu um ataque a bomba em seu escritório profissional há um ano, em Goiânia. Depois do episódio, escreveu um manifesto com sugestões de medidas protetivas a todos os operadores do Direito, que está sendo entregue às OABs de todos os estados brasileiros.

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