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Quem morreu?

A vida ceifada não foi a de Marielle Franco.

quinta-feira, 15 de março de 2018

Atualizado às 08:36

O Fabio Sa e Silva escreveu que a democracia brasileira continua sendo um mal-entendido. Quisera eu concordar mais se não fosse pelo fato de que ontem, 14 de março de 2018, a vida ceifada não foi a de Marielle Franco.

Sim, a vereadora levou tiros na região central do Rio aonde faleceu no local. Mas ela, que nasceu na favela da Maré, se tornou socióloga graças a uma bolsa de estudos na PUC/RJ, fez mestrado na Universidade Federal Fluminense não morreu. E não digo por sua luta aguerrida e corajosa que começa e se mantém ao ser feliz na favela aonde nasceu. Não, Marielle vive em cada auto de resistência que chega aos pretos, pobres e de periferia deste país. Marielle vive na sobrevivência sincera de quem lida com revistas e balas perdidas nas comunidades brasileiras.

E quem morreu então? Fica claro que a passagem de Marielle para o que eu acredito ser o céu mostra que quem morreu fui eu, você que me lê, enfim, nós, brasileiros e brasileiras que ainda insistimos neste mal-entendido que é o Estado Democrático de Direito.

No ano em que a Constituição da República "comemora" 30 anos, ver uma vereadora democraticamente eleita ser assassinada no centro de uma capital de estado demonstra que o Brasil rejeita toda e qualquer via que não a do Estado Paralelo. O assassinato cruel e pérfido de Marielle é o atestado final do Estado Democrático de Direito justamente em ano eleitoral.

Quer ganhar nas urnas? Primeiro você tem que ganhar sua vida. O jogo, que sempre foi sujo e injusto, agora apresenta a sua nova regra, a de fazer parte (ou apoiar parte) dos gestores de um Estado que controla de forma violenta a vida de milhões de pessoas sem qualquer processo ou procedimento minimamente legal.

Marielle lutou pela democracia, na democracia. Tombou, mas não caiu. Sua vida é a resposta de que sim, tropeçamos. Mas os golpistas das associações criminosas uma hora passarão mas o país fica. E este sim, gigante por sua própria natureza, de pé.

A nós, que sabemos que as instituições não estão funcionando normalmente, deixou este triste obituário, dos mais difíceis que já escrevi:

"Mulher periférica, brasileira, Marielle Franco era vereadora pelo PSOL no Rio de Janeiro. Militante dos direitos humanos, feminista, deixa uma jovem filha."

Boa noite. E boa sorte.

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*Ivy Farias, 36 anos, é jornalista e estudante de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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