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A aplicação da técnica de ponderação dos interesses nos conflitos entre o direito da personalidade e o direito de imprensa

Tiago Roberto Bertazo

Sempre que se deparar com a colisão entre o direito de personalidade e o direito de imprensa, o juízo deverá aplicar, na tomada de sua decisão, o uso da técnica de ponderação dos interesses, buscando, assim, constatar, no caso em tela, qual o interesse que deverá se sobrepujar.

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Atualizado às 08:29

Quando nos referimos ao direito basilar da personalidade, devemos ter em mente que essa matéria está diretamente ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana.

A dignidade da pessoa humana é o princípio que tem a função de assegurar que todo cidadão tenha seus direitos respeitados pelo Estado. Esse princípio acompanha (ou deveria acompanhar) todo cidadão que esteja presente no Brasil; seja ele nato, naturalizado ou qualquer estrangeiro que esteja transitando em nosso país.

Sobre esse assunto, o CC determina em seu artigo 11, que o direito da personalidade é intransmissível e inalienável (a título oneroso ou gratuito). Todavia, essa vedação imposta pela lei se refere apenas à sua indisposição em caráter permanente. Assim sendo, admite-se que o indivíduo, em determinadas situações, ceda esse seu direito, sem que esteja ferindo a sua dignidade ou cometendo algum tipo de ato ilícito.

Ademais, cumpre informar que o direito da personalidade é imprescritível. Entretanto, de acordo com o artigo 206, § 3°, inciso V, do CC a pretensão de pleitear indenização pelos danos sofridos prescreve em três anos. Salvo na hipótese de ações de reparação de dano ajuizadas em decorrência de perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, durante o Regime Militar - art. 14 da lei 9.140/95.

Aqui (no Brasil) esse tema é constantemente abordado, haja vista que colide de forma direta com o direito de imprensa ou o direito de livre imprensa.

Nota-se, então, que assim como garante a dignidade da pessoa humana, a CF, em seu artigo 5°, IX e 220, § 1°, também assegura a liberdade de imprensa, sem prévia censura. Isso significa que em um estado democrático de direito, a liberdade de imprensa não pode estar submetida à prévia censura. Porém, ressalta-se que toda matéria publicada deve permanecer em sua linha de atuação para que não venha encontrar a linha referente aos direitos da personalidade de outrem. Isso significa que o direito de informação deve se limitar ao seu exercício.

Entretanto, parece que a imprensa de todo o Brasil não vem respeitando essa linha de atuação, haja vista que ela é constantemente processada por indivíduos (civis e/ou políticos), os quais entendem que uma determinada matéria jornalística divulgada por algum meio de comunicação violou o seu direito de personalidade.

Sendo assim, sempre que se deparar com a colisão entre o direito de personalidade e o direito de imprensa, o juízo deverá aplicar, na tomada de sua decisão, o uso da técnica de ponderação dos interesses, buscando, assim, constatar, no caso em tela, qual o interesse que deverá se sobrepujar.

Isso significa que em toda decisão o juízo deve verificar se a notícia veiculada se prestou apenas a informar os fatos. Se isso foi feito, não há motivo para se requerer qualquer tipo de indenização por parte da pessoa que teve o seu nome mencionado na reportagem. Caso contrário, se ao veicular a notícia, o meio de comunicação desvirtuar a realidade dos fatos, cometerá abuso em seu direito de informar, bem como estará praticando ato ilícito perante a pessoa cujo nome foi citado.

Compete informar que a súmula 221, do STJ estabelece que, em caso de abuso no direito de informação, caberá o dever de indenizar tanto ao autor do escrito quanto ao proprietário do veículo de divulgação.1

Ademais, ressalta-se que em caso de matéria divulgada, cujo o seu conteúdo apresente algum tipo de ofensa, a pessoa que se sentir lesada poderá requerer o seu exercício de direito de resposta, conforme preconiza o § 2°, caput e parágrafo 1° da lei 13.188/152. Isto é, qualquer tipo de reportagem veiculada por meio da imprensa cujo conteúdo atente contra a personalidade de outrem, pode ensejar o direito de resposta da pessoa que se sentiu ofendida. Adverte-se que o prazo decadencial para exercer esse direito é de sessenta dias, contados a partir da data da ocorrência da suposta ofensa.

Sobre essa possibilidade, destaca-se o julgado do TJ/SP autos 1007120-54.2017.8.26.0011, que deu provimento a um recurso (por maioria dos votos), a fim de condenar a apelada a conceder o direito de resposta ao apelante.

No caso em concreto, em meio a uma greve de sindicato, a apelada veiculou o comunicado do assessor de comunicação da Secretaria da Fazenda ("SEFAZ") em virtude de uma reclamação sobre os seus serviços prestados. Inconformado com a resposta do representante da SEFAZ, o apelante entrou em contato com a rádio que veiculou o comunicado, para solicitar a publicação de sua resposta. Ocorre que o pedido não foi atendido, fato esse que motivou a apelante a ajuizar uma demanda. Em primeira instância a ação foi julgada improcedente. Entretanto, conforme mencionado acima, o TJ-SP reformou a decisão, sob o fundamento de que o "direito de resposta é espécie de reparação de dano moral (...)", e também por entender que a apelada descumpriu o seu dever de investigar e ouvir o que o apelante tinha e queria falar sobre o caso.

Conclui-se, portanto, que o direito de imprensa possui respaldo em nosso ordenamento jurídico. Todavia, toda e qualquer matéria deve, antes de ser veiculada, ser devidamente averiguada para que não haja um conflito com a linha referente ao direito da personalidade.

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FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Ed. 13ª, Juspodivm, 2017, p. 190.

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDEERATIVA DO BRASIL DE 1988. Acesso em 9 de maio de 2018.

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Acesso em 10 de maio de 2018.

Superior Tribunal de Justiça. Acesso em 10 de maio de 2018.

BRASIL. Lei 13.188, de 11 de novembro de 2015. Acesso em 10 maio de 2018.

TJ-SP. APELAÇÃO: 1007120-54.2017.8.26.0011. Relator: Luiz Antonio Costa. DJ: 25/04/2018. Esaj, 2018. Acesso em 10 de maio de 2018.

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1 Súmula 221 - STJ - São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação

2 Art. 2o Ao ofendido em matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social é assegurado o direito de resposta ou retificação, gratuito e proporcional ao agravo.

§ 1o Para os efeitos desta Lei, considera-se matéria qualquer reportagem, nota ou notícia divulgada por veículo de comunicação social, independentemente do meio ou da plataforma de distribuição, publicação ou transmissão que utilize, cujo conteúdo atente, ainda que por equívoco de informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica identificada ou passível de identificação.

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*Tiago Roberto Bertazo é advogado especialista em direito civil e processo civil.

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