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Pernambuco inova com 1° Código Estadual de Defesa do Consumidor

São muitos desafios para o novo Código Estadual de Defesa do Consumidor, daí porque a sua aplicação é uma tarefa que exige um certo cuidado na análise das novas diretrizes, de modo que não impactem diretamente na rotina contemporânea de consumo e não criem barreiras à livre iniciativa e ao comércio interestadual.

quarta-feira, 27 de março de 2019

Atualizado em 25 de março de 2019 17:50

O primeiro Código Estadual de Defesa do Consumidor do país é de Pernambuco e foi instituído pela lei 16.559 de 15 de janeiro de 2019. O novo Código Estadual passará a vigorar a partir do dia 16 de abril de 2019 e aplicar-se-á às relações consumeristas ocorridas no âmbito do Estado de Pernambuco, ainda que a contratação ocorra de forma eletrônica, e complementar às normas previstas no CDC (lei federal 8.099/95).

São mais de 200 artigos dispondo sobre normas gerais e normas específicas. As normas gerais são aplicáveis a todos os estabelecimentos comerciais, independentemente do ramo ou setor de atividade, a exemplo da determinação para que o fornecedor de produtos ou serviços mantenha um exemplar ou cópia reprográfica atualizada do Código no seu estabelecimento, em local visível e de fácil acesso ao público. 

As normas específicas contêm disposições aplicadas a diversos setores de atividade no mercado de consumo e estão organizadas em ordem alfabética, tais como Agências de Viagens e Turismo, Bancos e Instituições Financeiras, Instituições de Ensino, empresas de Telefonia, Internet e TV por Assinatura, até Veículos Automotores.

A criação do primeiro Código Estadual de Defesa do Consumidor do país é uma iniciativa inovadora, mas a nova legislação apresentou pouca inovação em seus dispositivos; trata-se, em grande parte, de uma consolidação de todas as leis vigentes há anos no estado de Pernambuco, que versam sobre direito do consumidor.

Comemora-se a iniciativa do Estado, mas há muito a ser aperfeiçoado na legislação, não apenas em relação a dispositivos que foram e ainda podem ser alvo de ações judiciais que questionem a competência do Estado para legislar sobre o assunto, - a exemplo do artigo 174 que traz regramento sobre a obrigação das montadoras, importadoras e concessionárias de veículos automotores fornecerem veículo reserva quando o veículo em conserto permanecer imobilizado por mais de 10 (dez) dias, em razão de falta de peças e/ou qualquer outra impossibilidade de realização do serviço, desde que dentro do prazo de garantia contratual. Esta obrigação, prevista na lei 15.304/14  do Estado de Pernambuco, já foi objeto de ação judicial e o Supremo Tribunal Federal julgou pela inconstitucionalidade da Lei por vício formal, cuja decisão transitou em julgado no dia 28 de fevereiro deste ano, portanto, o supracitado artigo não produzirá efeitos quando o novo Código Estadual entrar em vigor. 

Estamos na era da tecnologia e da informação onde surgem novos protagonistas no mercado de consumo, com novos tipos de serviços e produtos que exigem transformações no tratamento das demandas, a exemplo das compras pela internet ou por intermédio de plataformas e aplicativos, bem como sobre a proteção de dados dos consumidores; temas que foram pouco ou nada abordados pelo novo Código Estadual. Este é, sem dúvidas, o maior desafio do legislador estadual, principalmente diante da responsabilidade conjunta do Estado e da União para legislar concorrentemente sobre direito do consumidor, cabendo à União legislar sobre as matérias de interesse nacional.

Por outro lado, há um congestionamento enorme no Poder Judiciário, onde as ações de consumo respondem pela maior parte das demandas; é preciso evitar o litígio, prestigiar meios de solução de controvérsias mais adequados, principalmente diante de uma cultura litigiosa tão enraizada como a nossa.  Nesse ponto, o Código Estadual poderia ter prestigiado a solução administrativa prévia à judicialização ao invés de apenas prevê penalidades para as possíveis infrações, que estão estipuladas em reais e variam por faixas gradativas, diferentemente do Código de Defesa do Consumidor nacional, ficando entre R$ 600,00 (seiscentos reais) e R$ 9.000.000,00 (nove milhões de reais), atualizadas pelo IPCA. 

Há vários canais eficientes de comunicação para os consumidores tentarem uma composição prévia, tanto das empresas como do próprio governo, e o Código poderia incentivar a utilização desses canais, sem que isso represente negar acesso à justiça, mas um incentivo à prática dos meios extrajudiciais de conflitos.

São muitos desafios para o novo Código Estadual de Defesa do Consumidor, daí porque a sua aplicação é uma tarefa que exige um certo cuidado na análise das novas diretrizes, de modo que não impactem diretamente na rotina contemporânea de consumo e não criem barreiras à livre iniciativa e ao comércio interestadual.

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*Socorro Maia Gomes é sócia titular da área de Direito do Consumidor do Martorelli Advogados.

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