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13 anos da Lei Maria da Penha - Transformação social e necessidade de avançar mais

Daniela Polidoro Knippel e Edson Luz Knippel

Muitas vezes a mulher tem medo ou vergonha de denunciar a agressão. Mas isso é necessário, até para que o ciclo de violência seja cortado e para evitar a ocorrência de um resultado mais grave.

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Atualizado às 10:31

A lei 11.340/06, batizada como Lei Maria da Penha completa 13 anos nessa semana e foi responsável por modificar a disciplina jurídica aplicável às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Em 2006 foi responsável por afastar um regime que possibilitava acordo entre agressor e vítima e que muitas vezes reduzia a violência a uma questão de natureza patrimonial.

É bem verdade que nos primeiros anos de vigência teve sua constitucionalidade bastante questionada. Até que no ano de 2012 a matéria foi julgada de forma acertada pelo STF, que entendeu que a lei Maria da Penha estava de acordo com o disposto na Carta Política de 1988.

Sendo assim, a igualdade prevista no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal foi tratada como meramente formal, razão pela qual a igualdade material deve ser construída pela sociedade, com o apoio de legislação própria, que imponha discriminação positiva às mulheres em situação de violência, consideradas como hipossuficientes.

Os avanços trazidos nesse período de vigência são inquestionáveis. A Lei Maria da Penha é conhecida pela população e as mulheres se sentem mais seguras para denunciar a violência.

A violência é considerada como crime e pode levar o agressor à prisão, antes ou depois de sentença condenatória definitiva. Por uma questão pedagógica, a pena nunca pode ser de natureza patrimonial (multa, por exemplo). O agressor não pode sair do processo com a ideia de que bastou pagar determinada quantia para que a violência por ele praticada fosse apagada.

Não existe possibilidade de acordo do agressor com a vítima. Ainda que a lesão corporal seja leve, o processo segue, independente da vontade dela.

Além disso, a legislação busca proteger a mulher, prevendo medidas como o afastamento do agressor, garantia de proteção policial ou o encaminhamento da vítima a abrigos.

Outras legislações foram criadas no mesmo sentido da lei 11.340/06. Exemplo disso foi a legislação que alterou profundamente o tratamento destinado aos crimes contra a dignidade sexual (lei 12015/09). Em 2015 foi criada a qualificadora referente ao feminicídio, aumentando os limites da pena e inserindo o homicídio praticado contra a mulher, por razão de gênero, no rol de delitos hediondos (lei 13104/15, que altera o artigo 121, § 2º, do Código Penal).

É preciso lembrar que a Lei Maria da Penha não deve ser tratada simplesmente como lei penal, já que traz em seu bojo a prevenção como imprescindível. Exemplo disso são as inúmeras políticas públicas enumeradas em seu artigo 8º, que se referem a capacitação dos profissionais que trabalham com a temática da violência contra a mulher; o respeito nos meios de comunicação social dos valores éticos e sociais, de forma a coibir os papeis estereotipados da mulher; o destaque nos currículos escolares da equidade de gêneros e de raça ou etnia, dentre outros.

Não basta modificar o regime jurídico. É fundamental que seja alterada a mentalidade da sociedade e de profissionais que estão envolvidos na matéria aqui tratada.

Hoje a questão da violência doméstica e familiar contra a mulher é mais discutida na sociedade. Se por um lado a sociedade é machista, também existe uma abertura e uma sensibilidade maior para se debater este grave problema.

Não existe dúvida de que a Lei Maria da Penha transformou a sociedade.

Porém, é necessário caminhar mais. Os serviços públicos de proteção à mulher devem ser divulgados, facilitando-se o acesso a eles. Desta forma, a mulher será mais informada sobre seus direitos e poderá receber a proteção que é prevista em lei.

Muitas vezes a mulher tem medo ou vergonha de denunciar a agressão. Mas isso é necessário, até para que o ciclo de violência seja cortado e para evitar a ocorrência de um resultado mais grave.

E é necessário que o tema seja discutido a partir de um recorte de gênero, e de raça e de classe, já que existem grupos de mulheres que estão mais expostas à situação de violência, razão pela qual se tornam mais vulneráveis.

Como exemplo, as mulheres negras viram crescer o número de feminicídio praticados contra elas, na ordem de 54%, enquanto que o número de crimes contra a vida praticados contra as vítimas brancas decresceu 9,8% (Mapa da Violência de 2015 elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais - Flacso).

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*Daniela Polidoro Knippel é advogada e especialista em Direito Processual Penal. 

*Edson Luz Knippel é advogado. Doutor e mestre em Direito Processual Penal. Professor universitário.

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