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Breve comentário à aplicação de multa pela ausência de proposta efetiva e razoável de acordo na audiência preliminar de conciliação prevista no novo Código de Processo Civil

Diante do expresso vício processual resta clara a nulidade da exigência da apresentação da proposta de acordo e da multa posteriormente aplicada.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Atualizado em 13 de agosto de 2019 13:00

O novo Código de Processo Civil estimula a solução pacífica dos conflitos, o que se evidencia pela determinação de designação de audiência de conciliação ou mediação antes mesmo da apresentação da contestação, visando possibilitar a realização da transação logo no início do processo

No título pertinente ao procedimento comum o art. 334 do Código de Processo Civil dispõe que o juiz deverá designar audiência de conciliação ou de mediação se não for o caso de inépcia da inicial e de improcedência liminar do pedido. O novo Código de Processo Civil, em seu art. 3º, § 3º, determina que operadores do direito devem estimular os métodos de solução consensual de conflitos no curso do processo judicial.

Tratando-se de matéria passível de autocomposição, a audiência somente não será realizada se ambas as partes demonstrarem desinteresse na sua realização, cabendo ao Autor informar o seu desinteresse na autocomposição na petição inicial e o Réu por meio de petição com antecedência mínima de 10 dias da data da audiência, consoante o disposto nos § § 4º e 5º do art. 334 do CPC.

Ressalta-se, ainda, que poderá haver mais de uma audiência de conciliação ou mediação no curso do processo, nos termos do art. 334, § 2º do CPC.

O legislador trata da possibilidade de designação de audiência de conciliação ou mediação diante da diferença entre esses dois métodos de solução pacífica de conflitos. Nos termos do art. 165, § § 2º e 3º, respectivamente, o conciliador aconselha e sugere uma forma para pacificação do conflito, já na mediação o papel do mediador é de agente facilitador, que auxilia as partes na obtenção de uma solução para a demanda.

Tendo elevado o estimulo à solução pacífica dos conflitos o novo Código de Processo Civil, no art. 334, § 8º, determina a aplicação de multa de até 2% da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado, no caso de ausência injustificada do autor ou réu na audiência por ato atentatório à dignidade da justiça.

Recentemente, o juízo da Vara Cível da Comarca de Linhares, do estado do Espírito Santo, nos autos do processo 0002380-43.2019.8.08.0030, expediu carta de citação ao réu da demanda para comparecimento obrigatório na Resultado de imagem para multaaudiência de conciliação, constando no mandado citatório que em observância aos princípios da economia processual e cooperação, quedando-se o réu silente e não informando seu eventual desinteresse na autocomposição, o ato de comparecer à audiência sem apresentação de propostas efetivas e razoáveis seria considerado ato atentatório à dignidade da justiça e litigância de má-fé por ato protelatório, advertindo pela possibilidade de aplicação das multas dos arts. 77, § 2º e 81 do CPC.

O novo Código de Processo Civil não prevê a aplicação de multa pela ausência de apresentação de proposta de acordo, mas tão somente pela ausência na audiência. A designação da audiência visa possibilitar o diálogo e aproximação das partes para que, ao final, seja possível a solução pacífica do conflito, não se deve exigir que uma das partes, principalmente ao réu a quem incumbirá eventual cumprimento de obrigação pela realização da avença, compareça à audiência com a solução pretendida pela parte contrária.

O princípio da economia processual exige que o processo seja conduzido de forma que os atos processuais sejam praticados visando o máximo resultado, descartando, portanto, a prática de atos que sejam inúteis, tal princípio se alinha ao princípio da celeridade e da razoável duração do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII da Carta Magna, que determina que o processo deve perdurar por tempo razoável visando garantir a utilidade do resultado da demanda, bem como ao princípio da cooperação entre os sujeitos do processo.

A possibilidade de cancelamento da audiência de conciliação ou mediação caso as partes manifestem o seu desinteresse decorre destes princípios processuais, se as partes não estão abertas ao diálogo para possível finalização da demanda por meio de acordo a realização de audiência se mostra inútil.

Por outro lado, não se pode exigir que o réu compareça à audiência com proposta "efetiva e razoável", consoante acima destacado as partes devem comparecer à audiência abertas ao diálogo e à realização do acordo, ademais, tal exigência possui caráter nitidamente subjetivo. O que seria uma proposta "efetiva e razoável" diante do caso concreto e quais seriam os parâmetros que o magistrado utilizaria para fixação desta razoabilidade?

Não há previsão legal para que o juiz aplique multa pela ausência de proposta de acordo efetiva e razoável e de forma alguma os princípios da celeridade processual e da cooperação devem ser suscitados para inovação processual. Necessário, ainda, observar que o processo é regido pelo princípio da legalidade, previsto no art. 8º do NCPC.

Diante do expresso vício processual resta clara a nulidade da exigência da apresentação da proposta de acordo e da multa posteriormente aplicada.

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*Ariane Lemes Guerra é sócia coordenadora do escritório Chalfin, Goldberg, Vainboim & Fichtner Advogados Associados.

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