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Agronegócio em 2019, o que esperávamos, o que vivemos e o que ainda vem pela frente

Carlos Müller, Matheus Andrade e Rebeca Lucena

Ainda que o front externo, até o momento, seja o responsável por notícias muito positivas, o agronegócio precisa, mais do que nunca, reforçar e consolidar sua imagem de um setor tecnológico e sustentável.

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Atualizado em 29 de agosto de 2019 14:35

O agronegócio começou o ano de 2019 com motivos para ser otimista, esperando avanço nas regulamentações do setor e recuperação das exportações. O primeiro semestre do ano mostrou que o otimismo tem fundamento. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o agronegócio deve crescer 0,6% em 20191 e registrou um aumento de 4% nas exportações, em relação ao mesmo período do último ano. Nesse sentido, o presente artigo busca abordar os principais avanços e desafios do setor no âmbito dos Poderes Executivo e Legislativo, além de detalhar a pauta de comércio internacional, que é tão cara para o agronegócio brasileiro. 

No Poder Executivo, o ano começou marcado pelo novo governo e pelas incertezas acerca do relacionamento entre os núcleos de poder da administração de Jair Bolsonaro, bem como pela quantidade de agendas divergentes entre eles. A escolha de Tereza Cristina para comandar o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), no entanto, se mostrou sóbria, alinhada com o mercado e dentro das expectativas do que havia sido prometido na campanha eleitoral. Diferentemente do que aconteceu em outros Ministérios, a implementação das agendas do setor tem fluído com maior celeridade e robustez, uma vez que estão bastante consolidadas em aspectos técnicos e políticos. No Congresso Nacional, a capacidade de execução da pauta prioritária do governo guarda direta relação com a proximidade entre Tereza Cristina e parlamentares ligados ao agronegócio. Nesse sentido, é importante destacar que a titular do Ministério tem se mostrado uma negociadora eficaz nas pautas internas, bem como na agenda internacional.  

De acordo com declarações da própria ministra no início do ano, os temas prioritários para a pasta, no âmbito do Executivo, seriam: a defesa do direito de propriedade dos produtores e o combate às invasões; a segurança no campo; a criação de programas para a agricultura familiar; a promoção da preservação ambiental aliada à produção agropecuária; infraestrutura e logística; defesa sanitária, com o aumento do escopo de programas de autocontrole; a abertura de mercados e atração de novos investimentos; e uma política de crédito rural para redução dos juros e que seja customizada e compatível com as diferentes atividades rurais. Nesse último aspecto, as mudanças feitas no Plano Safra 2019/20 ampliaram as opções de financiamento, especialmente para pequenos e médios produtores. Ademais, o Ministério deverá trabalhar para enxugar a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), diminuindo suas funções, vendendo ativos e armazéns, e para modernizar a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).  

Vale ressaltar que boa parte da agenda prioritária do Mapa está avançando, principalmente no que se refere à defesa agropecuária, com a prevenção da entrada da peste suína e o alto índice de imunização contra a febre aftosa no Brasil neste ano. Merece igual destaque a aprovação de novos registros de defensivos agrícolas, trazendo produtos mais eficientes e seguros para o setor. Como esperado, diversas críticas foram feitas questionando a liberação de moléculas, o que fez com que a própria ministra liderasse campanha para esclarecer pontos polêmicos. Além disso, aspectos relacionados à sustentabilidade e questões ambientais são constantemente ligados à produtividade do setor.

No âmbito do Poder Legislativo, o agronegócio, por meio dos seus representantes, já deu algumas demonstrações de força - como a retirada do fim da isenção previdenciária sobre exportações agrícolas do texto da Reforma da Previdência - e deve continuar alcançando novas vitórias até o final do ano.  

Neste semestre, o setor deverá direcionar esforços para a aprovação de uma lei geral de licenciamento ambiental, a defesa da lei Kandir, com uma revisão da compensação financeira aos Estados exportadores; e a aprovação do projeto de lei 6299/02, que agiliza o registro de defensivos agrícolas. Ademais, aguarda-se a deliberação de temas como a exploração comercial de terras indígenas, o perdão das dívidas do Funrural, normas sobre proteção de cultivares e sobre o prazo para adesão ao Cadastro Ambiental Rural (CAR).  

Paralelamente, espera-se que o Governo encaminhe para a apreciação do Legislativo uma medida provisória versando sobre questões como linhas de financiamento para construção de armazéns; fracionamento de imóvel rural na garantia de empréstimo; fundo de aval fraterno para grupos de agricultores e estímulo a mecanismos de capitalização, como Cédula do Produtor Rural. 

No curto prazo, a Lei Geral de Licenciamento Ambiental deve ser o principal foco do setor. A proposta tende a agronegóciodiminuir a burocracia do processo de licenciamento, além de acelerálo, otimizá-lo e trazer mais segurança jurídica para empreendedores e licenciadores. Durante todos esses anos, o debate em torno do polêmico projeto foi marcado por grandes disputas entre ruralistas e ambientalistas. No entanto, o texto vem sendo trabalhado e encaminha-se para um consenso. Entre os interesses do agronegócio na proposta, destaca-se o protagonismo dado ao Cadastro Ambiental Rural (CAR). Se a atual redação da proposta for aprovada, atividades agrossilvipastoris terão validação da inscrição no CAR como licença. 

Outro tema que conta com o apoio do setor agropecuário, mas que ainda possui dificuldades para avançar, diz respeito à aquisição de terras por capital estrangeiro. Embora tenha sido anunciado pelo Secretário Especial de Assuntos Fundiários, Nabhan Garcia, que o Mapa enviaria um projeto para tratar do tema, este ainda está sendo liderado pelo Congresso Nacional. Vale ressaltar que o assunto não possui total simpatia do presidente Jair Bolsonaro, apesar de possuir apoio da ministra Tereza Cristina e da Frente Parlamentar da Agropecuária.  

A nova regulamentação para defensivos agrícolas, em substituição à lei 7802/89, destacada acima; é pauta prioritária do agronegócio há alguns anos. A atual lei que rege o setor existe há 28 anos e é considerada defasada pelo setor produtivo. Com forte atuação da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a proposta de atualização foi aprovada na Comissão Especial responsável por sua análise em 2018, porém não chegou a ser pautada no Plenário da Câmara. Apesar de o tempo ser curto e a oposição ao projeto ser intensa, a sua aprovação ainda em 2019 não pode ser descartada.  

Em relação ao comércio exterior, o agronegócio encarava 2019 como um ano de retomada e estabilização das exportações agrícolas, após os danos causados pela Operação Carne Fraca. Contudo, as mudanças no cenário internacional, notadamente o agravamento das tensões comerciais entre a China e os Estados Unidos e a Peste Suína na China, levaram a um crescimento mais acelerado do que aquele esperado anteriormente. 

A tensão entre a China e os Estados Unidos e a aplicação das sobretaxas aos produtos agrícolas, fez com que a China voltasse cada vez mais sua atenção para as compras de grãos e oleaginosas do Brasil. Tal fato fez com que o Brasil passasse a responder por mais de 50% das exportações de soja do mundo. O crescimento visto na soja, se reflete de modo similar nas exportações brasileiras de milho. De uma safra para a outra, o Brasil viu sua participação no mercado mundial crescer 5%, passando de 16% para 21%. 

Na pecuária, o surto de peste suína na Ásia causou uma verdadeira revolução nas cadeias de abastecimento ao redor do mundo. Com o sacrifício de grande parte do rebanho de suínos da China, o país asiático se viu obrigado a aumentar as suas importações de carne. 

O Brasil, como grande produtor de proteína animal que é, se torna um fornecedor óbvio para o mercado chinês e isso pode ser visto pelos números divulgados pelas associações do setor. De acordo com a Associação Brasileira da Proteína Animal, as exportações de carne de aves devem crescer 5% e as exportações de carne suína, até 2,5%. Já a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne projeta um crescimento de 10% nas exportações do setor durante esse ano. 

Ainda que o front externo, até o momento, seja o responsável por notícias muito positivas, o agronegócio precisa, mais do que nunca, reforçar e consolidar sua imagem de um setor tecnológico e sustentável. O crescimento do desmatamento e queimadas são a mais recente ameaça ao agronegócio brasileiro. É necessário que, em conjunto com as ações internas nos Poderes Executivo e Legislativo, o setor trabalhe sua imagem externamente, para evitar maiores prejuízos. 

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1 Disponível aqui. 

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t*Carlos Müller é consultor nos núcleos de Legislativo e Agronegócio da BMJ Consultores Associados.

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t*Matheus Andrade faz parte da equipe de Comércio Internacional da BMJ Consultores Associados.

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t*Rebeca Lucena integra a equipe de Relações Governamentais da BMJ Consultores Associados.

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