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O novo Código Civil e a conveniência do uso da arbitragem

A vigência do novo Código Civil brasileiro suscita larga discussão a respeito de seus principais pontos, especialmente sobre a sua estrutura, em que se optou por uma nova forma de legislar, sendo permeado pelas chamadas cláusulas gerais, que são conceitos abertos, indeterminados, que não regulamentam de modo completo e exaustivo a norma, possuindo caráter genérico e abstrato.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2003

Atualizado em 3 de dezembro de 2003 13:00

O novo Código Civil e a conveniência do uso da arbitragem

 

Giovanni Ettore Nanni*

 

A vigência do novo Código Civil brasileiro suscita larga discussão a respeito de seus principais pontos, especialmente sobre a sua estrutura, em que se optou por uma nova forma de legislar, sendo permeado pelas chamadas cláusulas gerais, que são conceitos abertos, indeterminados, que não regulamentam de modo completo e exaustivo a norma, possuindo caráter genérico e abstrato.

 

As cláusulas gerais mitigam as regras mais rígidas, abrandando as desvantagens da forma analítica de legislar. O Código Civil de 2002 prevê algumas cláusulas gerais como a função social do contrato (artigo 421), a probidade e boa-fé objetiva (artigo 422), o enriquecimento sem causa (artigo 884), o ato ilícito (artigo 186 e 927), o abuso de direito (artigo 187) etc., em que não se estabelece de antemão a conceituação, extensão e aplicação desses preceitos genéricos.

 

Apesar de não se pretender ingressar nessa seara de discussão, diz-se que a vantagem das cláusulas gerais é a mobilidade que a intencional imprecisão dos termos proporciona, porque se permite a constante atualização do direito, amoldando-se às transformações sociais, já que o alcance das cláusulas gerais pode ser alterado sem necessidade de modificação legislativa.

 

Com esse sistema, na impossibilidade de o legislador acompanhar a frenética evolução da sociedade, da economia e dos negócios, cada vez mais complexos e globalizados, o aplicador da lei pode valer-se dessas válvulas para adequar o preceito legislativo genérico à hipótese fática.

 

Nesse contexto, a atuação do juiz é de fundamental importância, tendo em vista a ampliação da margem interpretativa e, por conseguinte, do poder de julgar o caso concreto. Deve o juiz ser dinâmico, atrelado constante e profundamente à realidade social e à própria controvérsia submetida ao seu julgamento, sempre com o intuito de resguardar e assentar o justo, jungido aos ditames da razoabilidade, socialidade, boa-fé, eqüidade e justiça, atributos que marcam esse texto legal.

 

Essa estrutura advinda da nova lei civil, a despeito de ampliar o poder de atuação do juiz no preenchimento das cláusulas gerais, o que é mais acentuado ainda no campo contratual, também revela viável oportunidade de resolução de controvérsias por meio da arbitragem, pois, se por um lado essa estrutura apresenta vantagens na adequação da aplicação da lei ao fato social, de outro, indubitavelmente, viabiliza potenciais controvérsias, haja vista que a efetividade das cláusulas gerais é direcionada ao juiz.

 

Assim, revela-se conveniente a resolução de controvérsias envolvendo direitos disponíveis pelo meio alternativo da arbitragem, em que os árbitros desfrutam, assim como os juízes, de poder para dar conteúdo às chamadas cláusulas gerais, de forma muito eficaz, pois a arbitragem apresenta vicissitudes que a diferenciam da prestação jurisdicional estatal.

 

A informalidade e a alternativa de adaptação dos procedimentos à conveniência das partes, a flexibilidade das regras procedimentais e opção de escolha de câmaras, a possibilidade de maior dedicação e especialidade dos árbitros, a confidencialidade e a economia de tempo na obtenção de uma decisão final são fatores que incentivam e outorgam confiança ao uso da arbitragem, os quais adquirem maior relevância com a estrutura do novo Código Civil, pelo que é possível minimizar os riscos, os custos e as incertezas de um longo processo judicial, habilitando-se os árbitros a aplicar os preceitos legais citados com ampla concretude e eficiência, como os juízes togados, sempre em busca da efetiva entrega da justiça e da paz social.

 

Deve-se também ressaltar o constante aumento da complexidade de certas disputas, cada vez mais envolvendo matérias extremamente técnicas como energia elétrica, gás, petróleo, telecomunicação, investimentos internacionais etc., bem como interpenetração de conceitos oriundos do direito estrangeiro, cujas circunstâncias devem ser aliadas às cláusulas gerais, em que o árbitro, pela liberdade de escolha das partes no que concerne à sua especialidade e sua expertise, certamente terá ampla capacidade de reflexão e decisão.

 

Dessa maneira, é indubitável que a estrutura do novo Código Civil, em que a participação do julgador é muito mais efetiva para dar conteúdo às ditas cláusulas gerais, beneficia a instauração de procedimentos arbitrais para solver disputas contratuais, razão pela qual devem os sujeitos de direito, na medida do possível, optar pela inserção de cláusulas compromissórias nos seus contratos ou, mesmo na inexistência destas, decidir, em conjunto com a outra parte contratante, pela resolução da controvérsia por meio da arbitragem, o que, inclusive, já vem ocorrendo com sucesso em contendas envolvendo grandes empresas.

 

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* Advogado do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados

 

 

 

 

 

 

 

 

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