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Funcionalismo e aposentadoria

Decisões políticas atuaram no sentido de contrair o direito à aposentadoria dos servidores públicos e, em seqüência, o direito à pensão deixada aos seus familiares. O texto constitucional recente fixou um limite além do qual nada será pago, ainda quando, para tanto, o servidor tenha contribuído durante o exercício de sua função.

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Atualizado em 15 de dezembro de 2006 14:00


Funcionalismo e aposentadoria

Sérgio Roxo da Fonseca*

Decisões políticas atuaram no sentido de contrair o direito à aposentadoria dos servidores públicos e, em seqüência, o direito à pensão deixada aos seus familiares.

O texto constitucional recente fixou um limite além do qual nada será pago, ainda quando, para tanto, o servidor tenha contribuído durante o exercício de sua função.

É impossível discutir aqui a questão jurídica que fundamentou tal sistema que autoriza o Estado cobrar além do limite, mas que reconhece o seu poder de pagar aquém do que recebe. A matéria envolve pelo menos o princípio da igualdade e da razoabilidade, todos dois tutelados pela Constituição em vigor.

A questão hoje examinada, antecede aquela pois se refere ao direito daqueles que tiveram a sua situação jurídica reconhecida pelo Estado antes da reforma constitucional.

A reflexão exige que se busque respostas para as seguintes indagações. O que é direito adquirido? A Constituição pode revogar direito adquirido? Emenda constitucional pode revogar direito adquirido?

O conceito de direito adquirido o Brasil herdou de Gabba para quem é todo o aquele incorporado de maneira irretratável a um patrimônio de maneira idônea à luz do direito vigente. Portanto, seus pressupostos são: a) a incorporação patrimonial; b) a irretratabilidade da incorporação; c) conformidade com o sistema jurídico em vigor.

Antes da recente reforma constitucional, todos os servidores públicos e seus familiares, porque amparados pela previdência estatal, haviam incorporado em seu patrimônio jurídico de maneira irretratável tanto o direito à aposentadoria como o direito à pensão. Nesta situação estavam aqueles que já haviam concluído o tempo de aposentação, sem, contudo, exercer o seu direito. Reversamente não se encontravam na mesma situação aqueles que ainda não tinham contado tempo para isso, porque não eram titulares dele, mas, sim, seus expectantes.

A Constituição pode cancelar direito adquirido? Pode. Uma nova Constituição representa um golpe de Estado, sendo possível assim alterar radicalmente todos os direitos, as garantias, atingindo até mesmo situações jurídicas já consolidadas à luz do direito antigo. Há quem afirme que o poder constituinte não é tão amplo assim.

Emenda constitucional pode violar o direito adquirido? Não. Os direitos individuais, entre os quais o direito adquirido, são cláusula pétrea, assim entendida aquela imunizada dos efeitos das emendas constitucionais. Tal é a regra positivada pelo inciso IV, do parágrafo 4º., do art. 60 da Constituição que agasalha os direitos e as garantias individuais, um dos quais designadamente é vedação da retroatividade da lei, o que está insculpido no texto do art. 5º., XXXVI.

A questão é controversa existindo mesmo decisões dos tribunais superiores segundo as quais ao cidadão reconhece-se o direito adquirido mas não o procedimento da aquisição desse direito. Tal interpretação está contaminada por uma contradição. Se se reconhece direito a alguma coisa e se nega a estabilidade e a segurança da sua aquisição, no fundo o que se faz é, aplicar o segundo entendimento para matar o primeiro. Ou em outras palavras, legislar entre as linhas da Constituição, o que é claramente proibido.

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*Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de São Paulo, professor das Faculdades de Direito da UNESP e do COC e advogado.






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