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A teoria da desconsideração da personalidade jurídica no âmbito do CDC

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi disposta no Código de Defesa do Consumidor (clique aqui) dentro do Título 1, "Dos Direitos do Consumidor", em seu Capítulo IV que versa "Da Qualidade de Produtos e Serviços, da prevenção e da Reparação dos Danos", Seção V, art. 28, que assim dispõe.

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Atualizado em 12 de julho de 2007 15:41


A teoria da desconsideração da personalidade jurídica no âmbito do Código de Defesa do Consumidor

André de Souza Silva*

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi disposta no Código de Defesa do Consumidor (clique aqui) dentro do Título 1, "Dos Direitos do Consumidor", em seu Capítulo IV que versa "Da Qualidade de Produtos e Serviços, da prevenção e da Reparação dos Danos", Seção V, art. 28, que assim dispõe:

"Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

§1°. (VETADO)

§2°. As sociedades integrantes dos grupos de sociedades controladas são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste Código.

§3°. As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste Código.

§4°. As sociedades coligadas só responderão por culpa.

§5°. Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores."

Nota-se logo de início que referido dispositivo traz em seu bojo um conceito diferente da tradicional Disregard Doctrine, tão consagrada em nosso ordenamento jurídico, cujo objetivo primordial é justamente proteger toda a ordem social do uso nocivo da personalidade jurídica.

Sendo assim, o entendimento trazido no CDC amplia o rol de aplicação da teoria, abarcando em seu conceito, hipóteses em que há responsabilidade pessoal de integrantes de sociedades, bem como responsabilidade subsidiária e solidária entre grupos de empresas, que notoriamente não são casos de superação da personalidade jurídica.

De toda maneira, percebe-se claramente que tal dispositivo visa proteger o consumidor, assegurando-lhe livre acesso aos bens patrimoniais dos administradores sempre que o direito subjetivo de crédito resultar de quaisquer das práticas abusivas nele arroladas.

Partindo desses pressupostos, é importante mencionar a polêmica envolvendo o veto do §1º e da eficácia do §5º do artigo 28 do CDC, que até os dias atuais traz muita discussão no mundo jurídico.

O §1º do artigo 28 foi vetado pelo Presidente da República e trazia em sua redação a seguinte disposição:

"§1º A pedido da parte interessada, o juiz determinará que a efetivação da responsabilidade da pessoa jurídica recaia sobre o acionista controlador, o sócio majoritário, os sócios-gerentes, os administradores societários e, no caso de grupo societário, as sociedades que o integram."

Pelas razões de veto, o Presidente considerou que "o caput do artigo 28 já continha todos os elementos necessários à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica."

Para Rizzatto Nunes, o veto deste parágrafo foi correto, por não ter alterado a eficácia da norma, pois, nas suas próprias palavras, "é evidente que o juiz, ao desconsiderar a personalidade da pessoa jurídica, o fará para atingir a pessoa dos sócios e/ou responsáveis por ela", considerando seu dispositivo, portanto, redundante.

Todavia, em que pese tais considerações, muitos doutrinadores entendem que o veto não deveria ter recaído sobre o § 1º mas sim sobre o § 5º do CDC, que assim dispõe:

"§5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores."

Pela análise deste artigo, muitos doutrinadores, como Zelmo Denari (um dos autores do anteprojeto), entendem que seus fundamentos estariam em contradição com o caput do artigo 28, na medida em que estaria generalizando a aplicação da teoria, pois este autoriza a desconsideração sempre que houver um "obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores", desprezando, dessa maneira, os pressupostos de fraude e de abuso do direito previstos no caput.

Nesse mesmo sentido, Luciano Amaro considera que se referido parágrafo for aplicado literalmente tornaria dispensável o caput, tornando, até mesmo, inócua a teoria da desconsideração, conferindo caráter ilimitado à responsabilidade dos sócios de qualquer sociedade em uma relação de consumo.

Segundo ele, a única solução para dar validade a este parágrafo seria considerar que "no embate entre o parágrafo e o caput, se um tiver de ceder, será o parágrafo e não o caput. Na tentativa de conciliarmos os preceitos, há de entender-se o § 5° como uma abertura do rol de hipóteses do caput, sem prejuízo, porém dos pressupostos teóricos da doutrina que o dispositivo visou a consagrar".

Ou seja, para ele o §5º seria apenas uma espécie de adendo ao rol de hipóteses do caput, devendo sempre serem levados em consideração os pressupostos teóricos da teoria da desconsideração, entendimento este compartilhado pelo professor Fabio Ulhoa Coelho.

No entanto, o professor Rizzatto Nunes ensina que o objetivo do §5º é deixar patente que as hipóteses que permitem a desconsideração, previstas no caput, são meramente exemplificativas, pois o intuito dessa norma é, acima de tudo, garantir sempre o ressarcimento do consumidor pelos danos provocados pelo fornecedor.

Ou seja, nas suas próprias palavras, "pela redação do § 5º basta o dado objetivo do fato da personalidade jurídica da pessoa jurídica ser obstáculo ao pleno exercício do direito do consumidor para que seja possível desconsiderar esta personalidade."

Assim, como a maioria dos doutrinadores, acredito que o parágrafo 5º deve ser interpretado restritiva e conjuntamente com o caput, havendo harmonia no dispositivo, com o intuito único de garantir o ressarcimento ao consumidor quando este for prontamente lesado.

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*Advogado do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados

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