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China - Mais transpiração do que inspiração

Atuando no campo do direito empresarial, mais especificamente na área da propriedade intelectual, é impossível não deparar-se com a problemática da China, que engloba não somente a pirataria, mas um desafio maior e mais árduo, a concorrência desleal.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Atualizado em 24 de abril de 2008 13:53


Direito da Propriedade Indusrtrial

China - Mais transpiração do que inspiração

Carolina Tagliari*

Atuando no campo do direito empresarial, mais especificamente na área da propriedade intelectual, é impossível não deparar-se com a problemática da China, que engloba não somente a pirataria, mas um desafio maior e mais árduo, a concorrência desleal.

Para quem busca entender este gigante voraz, é leitura obrigatória o livro "A China Sacode o Mundo", de James Kynge, um jornalista que desde 1982 pesquisa esta nação. O livro foi eleito o melhor livro de negócios pelo Financial Times em 2006. Imagino que o mérito seja da visão minimalista que o escritor faz da ascensão chinesa, não apenas de seus hábitos e costumes locais, mas do porque da existência deles e suas conseqüências no mudo dos negócios.

O escritor relata em detalhes a vida de uma população com uma renda per capta muito menor que a européia, por exemplo, tendo resultados econômicos assustadoramente maiores. Isso se deve, obviamente, a cultura do país. Numa passagem do livro, Kynge relata uma frase motivacional escrita na parede de uma fábrica Chinesa: "Se você não trabalhar muito hoje, irá procurar muito emprego amanhã". Em um país onde o trabalho é escasso e a população numerosa, a frase torna-se ameaçadoramente motivacional.

O fenômeno da pirataria na China tornou-se corriqueiro ainda em nos anos 90, em virtude de o país buscar essencialmente o comércio, não a pesquisa. A grande parte das companhias chinesas adquiriu, e adquire, suas tecnologias por compra ou cópia ilegal.

Essas cópias ilegais, geralmente, eram fabricadas com péssima qualidade, houve casos de tacos de golfe fabricados na China, de aparência impressionante, que custam menos de um décimo de seu preço, e que quebram no meio de uma tacada. Também cópias de chaleiras explodem, transformadores elétricos entram em curto circuito, remédios não tem efeito, pastilhas de freio falham, bebidas alcoólicas envenenam e leite em pó mata bebês de fome.

Não se pode negar que também existem falsificações fiéis com a qualidade do original, mas são exceções. Independente do resultado da pirataria, seu reflexo é sempre o mesmo: prejuízo para o consumidor e para o empresário.

Aliás, quando falamos de China, o conceito de mercado livre torna-se desigual, a dicotomia entre o capitalismo e o comunismo fez com que o governo chinês criasse uma situação econômica para as empresas nacionais que desbancaria qualquer cofre público. Fixaram o valor de sua moeda contra o dólar norte-americano, mantendo-o desvalorizado para dar maior competitividade a suas exportações. Dão pouco ou nenhum benefício de previdência social a seus trabalhadores, tendo com isso custos muito baixos, os padrões de segurança nas fábricas chinesas seriam ilegais em outros lugares do mundo.

Ainda, o sistema bancário estatal fornecia crédito barato para companhias estatais que podiam deixar de pagar impunemente, concedendo ainda restituições do imposto de valor agregado para exportadores, não há restrições quanto a conseqüências ambientais e muito menos quanto à violação de propriedade intelectual. Para finalizar, o governo manteve o preço de diversos insumos, como eletricidade e água, artificialmente baixos, subsidiando a indústria.

Todas estas atitudes chinesas para incentivar o crescimento desenfreado da indústria, tiveram uma séria conseqüência, a Crise de Confiança da China, não apenas no mercado externo, mas no próprio país. O livro de Kynge traz dados, mostrando que as erupções de "incidentes de massa", descontentes com a maneira de governar o país, cresceram nos últimos anos mais ou menos na mesma proporção que a economia, por volta de 9%.

Para mudar este quadro, hodiernamente, as empresas chinesas então encorajando parceiros estrangeiros a transferir-lhes tecnologia e know how, como parte do preço para o acesso a um grande mercado em potencial. Isso em função da grande pressão internacional no combate a concorrência desleal e a pirataria.

Condolezza Rice, secretária de Estado dos Estados Unidos, proferiu uma famosa frase: "o país dá boas vindas ao surgimento de uma China confiante pacífica e prospera, mas espera que ela seja capaz e esteja disposta a combinar sua capacidade de crescimento com suas responsabilidades internacionais".

Deste modo, há uma pressão comercial internacional, com ameaças sutis de imposição de barreiras comerciais, caso a China não controle sua fome por lucros a qualquer custo, modificando seu poder judiciário conivente e corrupto, para impedir e punir atos que configurem crime contra a propriedade intelectual e concorrência desleal.

Neste contexto, para aliviar esta Crise de Confiança chinesa, é de vital importância o acontecimento dos Jogos Olímpicos de Pequim, agora em 2008. Para o evento, foram publicados e distribuídos à população, ainda em 2006, segundo Kynge, manuais de waishi, expressão utilizada para designar "negócios exteriores", visando administrar as diferenças culturais entre os povos, criando uma "falsa amizade" entre chineses e estrangeiros, com aspectos de diplomacia pública a psicologia social.

Ao contrário da ascensão comercial, a ascensão moral da China é lenta, e só está acontecendo sobre pressão mundial, colocando em xeque a continuação das relações negociais entre a China e o resto do mundo, que está sendo prejudicado com as atitudes políticas chinesas. Espera-se que a pressão internacional continue, obrigando o país a adotar políticas públicas mais eficientes, impedindo a livre prática da concorrência desleal e da pirataria, para que se possa manter o equilíbrio no comércio internacional.

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*Advogada do escritório Dupont Spiller Advogados Associados S/C




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