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O prefeito e a ação de improbidade

Fernando Montalvão

Na noite de hoje, 20.5, ao abrir a página do da ABDIR, me deparei com artigo de doutrina do Dr. Antonio Cardoso, eminente Desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia e um dos mais ilustres dos pares, onde o eminente magistrado chama a atenção e indaga que, se mantida a decisão do STF na Recl. Sardenberg, como ficarão os agentes políticos condenados nesses dez anos de uso da Lei nº. 8.429?

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Atualizado às 10:01


O prefeito e a ação de improbidade

Fernando Montalvão*

Na noite de hoje, 20.5, ao abrir a página do da ABDIR, me deparei com artigo de doutrina do Dr. Antonio Cardoso, eminente Desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia e um dos mais ilustres dos pares, onde o eminente magistrado chama a atenção e indaga que, se mantida a decisão do STF na Recl. Sardenberg, como ficarão os agentes políticos condenados nesses dez anos de uso da Lei nº. 8.429 (clique aqui)?

No particular, em razão da natureza jurídica do cargo, sempre defendi a inaplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa ao agente político, por já haver legislação específica para eles nos atos de improbidade administrativa. Em relação ao Prefeito Municipal, o texto a responsabilizá-lo é o Dec. Lei nº. 201 (clique aqui).

A Lei de Improbidade Administrativa foi elaborada para o agente público, excluindo-se dela, o agente político, Presidente da República, Ministros, membros do Poder Judiciário, Governador, Prefeito, ou seja, em relação aos titulares da prerrogativa do foro em razão da função e responsabilizados por legislação específica.

A interpretação inicial do STJ era pela inaplicabilidade da lei, vindo a mudá-la, posteriormente, assim como quase todos os Tribunais. A ação se fortaleceu quando do julgamento pelo STF da ADIN nº. 2797/ DF (clique aqui), decisão de 15.9.2005, rel. o eminente Min. Sepúlveda Pertence, quando se reconheceu a inconstitucionalidade da Lei nº. 10.628/2002 (clique aqui), que acrescentou os §§ 1º e 2º ao artigo 84 do C. Processo Penal (clique aqui), criando foro privilegiado ao ex-detentor de cargo político. Promulgada a Lei, em artigo de doutrina, sob o título Foro Amoral, condenei o texto legal.

O uso da ação civil pública contra os agentes políticos foi desvirtuado. O Ministério Público passou a entender que todo ato administrativo, especialmente do Prefeito, era ato de improbidade, como a exercer um Poder sobre outro. Nos pequenos Municípios então, o Promotor recém saído dos bancos escolares, passou a instaurar inquéritos civis e intimar o Prefeito, sob pena de condução coercitiva.

Eram tantas as requisições de documentos e pedidos de explicações ao Prefeito e Secretários que o Gestor era obrigado a manter serviço específico para o atendimento. Em determinada comuna para a qual presto serviços, entre os meses de fevereiro a agosto de 2005, foram 128 pedidos, requisições e intimações. Instaurou-se inquérito civil até para verificar possíveis irregularidades na administração, trazendo-me a lembrança de Murilo Mármore, da criação de Chico Anísio, delegado que prendia a pessoa para saber depois o crime que praticara.

O Min. Gilmar Mendes, na Recl. 4810-1/RJ, no seu voto, embora reconhecendo pela improcedência da medida, na oportunidade, expressou:

"Apesar da impossibilidade de conhecimento desta reclamação, não posso deixar de registrar posicionamento pessoal sobre o tema, tendo em vista que os autos revelam visível abuso por parte de membros do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro na utilização da ação de improbidade administrativa para praticamente inviabilizar a atuação administrativa da Chefe do Poder Executivo do Município de Magé-RJ."

O Dr. Ives Gandra, no encerramento do congresso organizado pela Academia Internacional de Direito e Economia, por sua vez, manifestou o seguinte:

"... a 'liberdade total e absoluta' a jovens procuradores sem visão macropolítica, macroeconômica e macrojurídica não pode trazer bons resultados. Ele ressalta que os jovens possuem conhecimento técnico e estão habilitados para atuar no âmbito do Direito formal. O problema é que não têm experiência de vida."

Quando se diz que a lei de improbidade Administrativa não se aplica ao agente político, não se quer dizer que se acoberte a impunidade ou que se conceda passaporte para a improbidade e corrupção, muito longe disso. O certo é que a suspensão ou cassação dos direitos políticos depende de sentença penal transitada em julgado, nos exatos termos do art. 15, III, sendo assegurado ao Prefeito, à prerrogativa do foro, art. 29, X, ambos os arts. da CF (clique aqui).

O que se viu com o uso desmedido da ação, foi uma proliferação de afastamento de Prefeitos pelos juízos de 1º Grau, mantidos pelas Cortes, esquecendo-se que o mandato político é outorgado pelo povo, mediante voto direto e secreto, para mandato a tempo certo. Vários gestores públicos foram afastados mais de uma vez pelo mesmo magistrado, quando o afastamento se constitui em ruptura da ordem democrática, cabível em condição de excepcionalidade, por decisão do Plenário da Corte julgadora.

Quanto à inaplicação da Lei de Improbidade ao agente político, vale um histórico.

Já em 2004, o então Presidente do STF, Min. Nelson Jobim, na SS 2.525, citando julgamento anterior na SL 26, j. de 3.2.2004, ao deferir a medida em favor de Arnaldo França Vianna, Prefeito do Município de Campos dos Goytacazes, já chamava a atenção para inaplicabilidade da Lei nº. 8.429/92 ao agente político.

No caso Sardenberg, Recl. 2138, de iniciativa da União, em 11.9.2002, o Min. Jobim suspendera eficácia da sentença proferida e o Plenário do STF, por decisão apertada e definitiva, 6X5 votos, de 8.8.2007, entendeu que o então Ministro era titular da prerrogativa do foro e por se tratar de agente político, sujeito a Lei de Responsabilidade, nº. 1.079/1950 (clique aqui), não lhe sendo aplicada à lei de Improbidade Administrativa.

Em primeiro momento, se entendeu que o julgado do STF não operaria efeito erga omnes, por sua vinculação ao caso concreto, um grande erro, uma vez que se a interpretação foi da totalidade da Corte, determinaria a orientação para os juízos inferiores.

O Min. Cezar Peluso, na Recl. 2645/ES, decisão de 2.0]8.2007, ao indeferir a providência, chamou a atenção para o julgamento do caso Sardenberg, ao dizer:

"Pouco se dá, no caso, que, em 13/6/2007, o Plenário desta Corte tenha decidido, por maioria, que os agentes políticos não respondem por improbidade, porque submetidos a regime especial de responsabilidade."

O STJ nos EDcl no RESP nº. 456.649 - MG (2002/0100074-9), manteve o entendimento de ser inaplicável ao Prefeito a Lei de Improbidade Administrativa.

A pá de cal sobre a inaplicabilidade da Lei de Improbidade ao agente político, aconteceu em decisão recente, março de 2008, no julgamento da Ação de Improbidade Administrativa contra o Min. Gilmar Mendes, Pet. , quando a Corte maior reiterou o entendimento no Caso Sardenberg e reconheceu que havia prerrogativa do foro e que ao Ministro é inaplicável a lei citada.

O TJRS, agora no mês de março, no proc. 700.228.958-74, decisão da 21ª Câmara Cível, rel o Des. Genaro José Baroni Borges, entendeu que os prefeitos não podem ser submetidos a dois regimes diferentes de imputação de delitos de responsabilidade. Os agentes políticos são regidos, no caso, pelo Decreto-Lei 201/67, que impõe severas punições.

Destaca-se ainda:

"São autoridades públicas supremas do Governo e da Administração na área de sua atuação, pois não são hierarquizadas, sujeitando-se apenas aos graus e limites constitucionais e legais de jurisdição. Em doutrina, os agentes políticos têm plena liberdade funcional, equiparável à independência dos juízos nos seus julgamentos, e, para tanto, ficam a salvo de responsabilidade civil por seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má fé ou abuso de poder", destacou.

Ele ressaltou, ainda, que as prerrogativas que se concedem aos agentes políticos não são privilégios pessoais e sim garantias necessárias ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias. Para ele, "sem essas prerrogativas funcionais os agentes políticos ficariam tolhidos na sua liberdade de opção e decisão, ante o temor de responsabilização pelos padrões comuns da culpa civil e do erro técnico a que ficam sujeitos os funcionários profissionalizados".

Entendo que o STF, no caso Sardenberg, ao excluir o alcance da Lei de Improbidade ao agente político, ratificando no julgamento do Caso Gilmar Mendes, não deixou mais oportunidade para o prosseguimento das ações de improbidade administrativa contra os agentes políticos, não podendo os juízes inferiores, serem mais realistas do que o Rei, como já bem entendeu o TJRS.

Nas ações sob meu patrocínio, já solicitei a extinção dos feitos, amparados nas decisões referidas. Razão assiste ao eminente Desembargador Antonio Cardoso. Como ficarão aqueles que tiveram seus direitos cassados.

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*Consultor de Direito Eleitoral, titular do escritório Montalvão e Advogados Associados





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