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Nova interpretação do STF quanto ao benefício do art. 33, §4º, da lei de drogas

O STF decidiu que o magistrado deve fundamentar sua decisão no que tange à aplicação do benefício.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Atualizado em 2 de maio de 2013 15:33

"E pode haver emoção na redação de um texto de lei, tal como num verso decassílabo ou num Alexandrino? Claro que pode! Basta que seja iluminado por um toque de humanidade. Aquela história de que leis não devem ser redigidas sob emoção é coisa de gente fria e indiferente". (Saulo Ramos, in "Código da Vida")

Recentemente, por meio de seu informativo 698, o STF decidiu que o magistrado deve fundamentar sua decisão no que tange à aplicação da benesse concedida a hipótese do art. 33, §4º, da lei 11.343/06 (lei de drogas).

Com efeito, caso presentes os requisitos descritos no artigo supra, determina a lei que o juiz deve reduzir a pena de 1/6 a 2/3. Não se trata de faculdade e sim de um dever proveniente do próprio texto legal, que faz nascer para o acusado um direito público subjetivo com relação à concessão do benefício. Sendo assim, determinou o STF que o magistrado deve fundamentar sua decisão pela fração que será concedida ao condenado. Isto é, tendo optado pela fração mínima de redução da pena (por exemplo), deve o magistrado descrever o porquê. Caso contrário, fica autorizada a redução de ofício pelo órgão revisor.

Desta feita, há que se saudar o posicionamento da Suprema Corte. Em um Estado democrático de Direito, não há que se cogitar em uma decisão sem a devida fundamentação, seja quando da aplicação da pena, seja da aplicação de benefícios, conforme o princípio da motivação das decisões judiciais e da inteligência do art. 93, inciso IX, da CF/88.

Até porque, caso não se conforme com a fração escolhida para eventual redução da pena, o réu tem onde se apoiar para poder apelar da decisão, por exemplo.

Porém, apenas para efeito de complementação, existe um forte debate doutrinário que tangencia o tema sub studio, mas que não foi efetivamente analisado no informativo 698, posto não ser o caso.

Nada obstante, ante a relevância da matéria, não se pode deixar de lado um posicionamento polêmico: o STF declarou, incidenter tantum, (ou seja, controle difuso de constitucionalidade, que ainda só faz coisa julgada para as partes, isto é, não possui eficácia erma omnes)¹ a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" do art. 33, §4º, da lei de drogas² .

Não se pode olvidar que era bastante notória na prática forense a vedação de conversão da pena privativa de liberdade aplicada ao réu para as penas restritivas de direito, sempre tomando por base o artigo supracitado.

Por essa razão, formou-se um intenso debate na doutrina e na jurisprudência (que permanece até nos dias atuais, em que pese a decisão do Supremo), já que muitos doutrinadores afirmam ser inconstitucional tal dispositivo, sobretudo por violar o art. 5º, inciso XLVI, da CF/88 - individualização da pena.

Portanto, defendem que uma vedação genérica afasta do magistrado a possibilidade de analisar o caso concreto e, com base nele, aplicar a sanção penal que melhor se ajustar à espécie.

Por outro lado, há quem entenda que nada impede que uma nova lei, posterior, regule a matéria de forma especial e que traga vedações em virtude da gravidade da conduta do agente.

De fato, em uma primeira análise, parece ser demasiadamente branda a aplicação de uma pena restritiva de direitos a um condenado por tráfico de drogas. Como mola propulsora de crimes, o delito de tráfico deveria ser punido de forma mais dura e eficaz, fato que certamente não condiz com a aplicação das penas previstas no artigo 43, do CP.

Desta feita, ainda que haja crítica de parcela da doutrina ao Supremo, não se pode esquecer que a decisão em sede de controle difuso de constitucionalidade serve como vetor de interpretação (não vincula!). Logo, caso ainda se verifique grande número de magistrados vedando a conversão do §4º, art. 33, da lei de drogas, poderá o Supremo voltar a se manifestar e, então, vincular seu entendimento, seja por meio de súmula vinculante, seja por meio de controle concentrado de constitucionalidade.

Portanto, pode-se verificar que o art. 33, §4º, da lei de drogas parece discreto e se posiciona ao fim do artigo, fato que pode passar despercebido ao intérprete. Entretanto, carrega um grande número de questões que são fontes de um interessante e enriquecedor debate jurídico.

A 1ª câmara de Direito Criminal do TJ/SP³ converteu a pena de um ano e oito meses de reclusão, em regime prisional inicial fechado, aplicada a um condenado por tráfico de drogas, por uma sanção restritiva de direito consistente na prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo, além do pagamento de dez dias-multa.

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¹ O Senado Federal editou a Resolução 05/2012 que conferiu efeito erga omnes à decisão proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade, conforme artigo 52, inciso X, da Constituição Federal. Nada obstante, ainda existe forte entendimento contrário à posição adotada pelo STF, motivo que, por si só, pode fazer com que nossa Suprema Corte reaprecie o tema em debate e, inclusive, altere seu posicionamento.

² HC 97.256/RS.

³ Processo nº 0906446-14.2012.8.26.0506.

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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de justiça aposentado e Antonelli Antonio Moreira Secanho é advogado

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