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O STF e os aditivos nos cigarros - A possibilidade de um julgamento histórico

Adriana Carvalho e Claudia de Moraes Pontes Almeida

Espera-se que o STF confirme a validade da proibição de aditivos nos produtos de tabaco, como aqueles de sabor e aroma, impedindo retrocesso ao direito à saúde previsto na CF.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Atualizado em 25 de novembro de 2016 08:49

O STF poderá realizar julgamento histórico, em 30 de novembro, se validar uma importante medida de controle do tabagismo, alinhando-se às Supremas Cortes da Austrália, Reino Unido, França, Colômbia, Peru, Panamá, Uruguai e Argentina.

Espera-se que o STF confirme a validade da proibição de aditivos nos produtos de tabaco, como aqueles de sabor e aroma, impedindo retrocesso ao direito à saúde previsto na CF, que este órgão tem o dever de proteger e assegurar a efetividade. Uma decisão que prestigie o direito à saúde em favor do controle do tabagismo seguirá a tendência dos sistemas judiciais dos países acima mencionados. Será a primeira vez que o STF julgará uma medida dessa natureza.

De forma pioneira, os aditivos em cigarros foram proibidos em 2012 no Brasil, por meio de norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (RDC 14/2102), após dois anos de debates intensos, audiências públicas, ampla participação da sociedade civil, inclusive da indústria do tabaco, e amplos estudos da área técnica daquela agência.

Entretanto, a norma não chegou a entrar em vigor por uma liminar concedida pela ministra Rosa Weber, há três anos, em ação proposta pela Confederação Nacional da Indústria, no STF (ADI 4874). Desde então, aguarda-se o julgamento dessa ação.

As medidas de controle do tabagismo estão previstas na Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, tratado internacional de saúde pública, ratificado por 180 países, como o Brasil - decreto 5.658/06. A proibição dos aditivos está prevista no artigo 9º da norma e nas Diretrizes para a sua implementação, dispondo sobre a necessidade de regulamentação do conteúdo dos produtos de tabaco, para proibir ou restringir ingredientes que possam ser usados para aumentar a palatabilidade e atratividade.

A razão é que esses aditivos facilitam a iniciação ao tabagismo, pois mascaram o gosto ruim do tabaco, induzindo mais pessoas - em sua maioria crianças e adolescentes - ao consumo e, portanto, à dependência à nicotina. Está comprovado que o uso de certos aditivos aumenta a capacidade de causar dependência química, dificultando a cessação do consumo.

O tabagismo é causa e agravante de ao menos 50 doenças e responde pela morte evitável e precoce de dois terços de seus usuários regulares. Inequívoca a importância da adoção de medidas de prevenção.

O tabagismo é considerado uma doença pediátrica, pois quase 90% dos fumantes regulares começa a fumar antes dos 18 anos. Pesquisas mostram que as pessoas que iniciam o consumo na adolescência têm maior probabilidade de se tornarem fumantes definitivos1. Estudos recentes comprovam que os sintomas de dependência se desenvolvem logo após o primeiro cigarro, sem nenhuma relação com o número de cigarros fumados, a frequência ou duração do uso2. No Brasil, cerca de 60% dos estudantes entre 13 e 15 anos de idade, que compram cigarros com aditivos apontam o sabor como o ponto alto do cigarro3.

Relatório de 2014 do Surgeon General4, órgão de referência em pesquisa do Ministério da Saúde dos Estados Unidos, revela que ao longo dos últimos 50 anos, os fabricantes de tabaco desenvolveram e comercializaram produtos ainda mais sofisticados, altamente eficazes para criar e manter a dependência à nicotina, mais atraentes para jovens novos fumantes e ainda mais nocivos. Eles transformaram um produto já letal e viciante em algo ainda pior, expondo os fumantes a um risco ainda maior de dependência, doenças e morte.

Dada a complexidade técnica da matéria, a decisão pela proibição de aditivos nos produtos de tabaco só poderia advir de órgão com expertise técnica no tema, como é o caso da ANVISA, até porque esta é sua função e competência normativa

Assim, diante de inequívocas evidências científicas (sanitárias, médicas e especialmente jurídicas) que comprovam a necessidade de proibição de aditivos nos produtos de tabaco, irretocável a decisão técnica da ANVISA ao editar a RDC 14/12. E o fez dentro de sua competência para adotar ações capazes de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde (artigo 6º, § 1º da lei 8.080/90), ao proibir a comercialização de produtos de risco iminente à saúde (artigo 7º, XV, da lei 9782/99), em total acordo com a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco.
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1 in publicação: "Notas Técnicas para o Controle do Tabagismo - Aditivos em Cigarros - Instituto Nacional do Câncer - INCA/2014", acesso à versão eletrônica

2 in publicação: "Notas Técnicas para o Controle do Tabagismo - Aditivos em Cigarros - Instituto Nacional do Câncer - INCA/2014".

3 O artigo com a pesquisa em referência pode ser acessado no link

4 Este relatório está detalhado em publicação elaborada pela organização não governamental norte americana, Tobacco Free Kids, acesso à versão eletrônica
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*Adriana Carvalho é advogada e coordenadora jurídica da ACTbr - Aliança de Controle do Tabagismo.

*Claudia de Moraes Pontes Almeida é advogada do IDEC - Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.

Alianca de Controle do Tabagismo

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