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A pandemia e o MAPAN - Melhor Alternativa Para Um Acordo Negociado diante do descumprimento das obrigações contratuais

Frente a necessidade do isolamento ou distanciamento social para a contenção da transmissão do vírus, a cadeia produtiva tem se esforçado para diminuir o custo de manutenção de seus empreendimentos.

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Atualizado às 11:09

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O Brasil e o mundo estão, compulsoriamente, passando por um processo abrupto de modificação dos vínculos comerciais, não só entre os fornecedores de produtos e serviços e seus consumidores, mas também entre os próprios empresários, visto que a pandemia causada pelo coronavírus tem levado a incontáveis perdas humanas e de capital, o que acaba interferindo no convívio social e nas obrigações assumidas pelas pessoas físicas e jurídicas.

Frente a necessidade do isolamento ou distanciamento social para a contenção da transmissão do vírus, a cadeia produtiva tem se esforçado para diminuir o custo de manutenção de seus empreendimentos o que, muitas vezes, culmina em dispensa de empregados e redução na compra de insumos, entre outras medidas drásticas.

Ou seja, trata-se de uma reação em cadeia na qual todos os envolvidos saem perdendo, sempre na tentativa de manter vivas as relações consumeristas e empresariais desenvolvidas e que, por determinação estatal pautada em recomendações de saúde e estudos técnicos, estão sendo impedidas de acontecer em sua maioria com o fechamento das lojas de varejo situadas nas ruas e shopping centers.

Diante desta realidade que afeta todos os ramos empresariais de forma negativa, direta ou indiretamente, em meio a perda total ou parcial de receita, surgem vários questionamentos, o principal deles é o seguinte: como vou pagar minhas contas se não estou ganhando nada?

Em outras palavras: como vou cumprir hoje as obrigações que assumi antes de todas as transformações no mundo econômico?

Como regra geral as obrigações assumidas entre os interessados em um negócio como a compra e venda, locação, arrendamento, hipoteca entre tantos outros se materializa em um contrato escrito, sendo este um retrato dos direitos e das obrigações das partes envolvidas e, do ponto de vista jurídico, legislativo, com algumas exceções, não sofreu qualquer alteração.

Ou seja, o que foi pactuado tem que ser cumprido em sua literalidade, inclusive utilizando critérios definidos para rescisão do acordado, caso exista essa previsão, por mais injusta que ela pareça em decorrência do momento histórico pelo qual passamos.

Assim, frente ao que foi convencionado antes do início da pandemia, diante da grande alteração social e econômica sofrida, observa-se um conflito de interesses que em determinados momentos pende para a rescisão contratual, hora pela revisão ou, ainda, pela manutenção do objeto da avença com a alteração das obrigações das partes. Em síntese, observa-se uma lide que, na maioria das vezes, chega ao Poder Judiciário para que assim o Estado decida a controvérsia.

Um contrato de locação comercial pode passar por todas as etapas descritas, visto que o locador, como regra, buscará manter o aluguel nos termos em que foi combinado, já o locatário por sua vez, diante da crise econômica, em um primeiro momento poderá tentar reduzir o valor pago mensalmente (revisão) ou ainda, ao atingir patamar financeiro insustentável, buscar a rescisão do contrato.

Em momentos de normalidade o judiciário daria uma resposta para a lide pautando-se nas leis, sem maiores problemas, contudo, no presente momento, diante da adversidade social e econômica, nem sempre a decisão dada pelos magistrados encontrará respaldo em uma norma, partindo muitas vezes para questões principiológicas e elementos como força maior e caso fortuito, retirando assim previsibilidade do julgado.

Além disso, o Poder Judiciário até o presente momento não está funcionando de forma regular, atuando sem o atendimento presencial, o que torna todo o procedimento incerto e com menos acesso para os advogados, resultando em menor efetividade e celeridade para os que clamam pela resolução da controvérsia em caráter emergencial, visando dar continuidade as suas atividades produtivas.

Assim, diante da dinamicidade das relações empresariais e consumeristas, a melhor forma de equalizar os interesses das partes e, muitas vezes, evitar a falência de uma empresa, é a negociação.

Várias técnicas são utilizadas para resolução dos conflitos sem intervenção estatal, como a mediação e a conciliação os quais se utilizam BATNA (Best Alternative To a Negotiated Agreement) ou em português, MAPAN: Melhor Alternativa Para um Acordo Negociado. As negociações são utilizadas em todo o Brasil em inúmeras câmaras especializadas e com atuação reconhecida na área. Cuida-se de um procedimento por meio do qual as partes que se encontram em um conflito de interesse resistido tentam alcançar uma decisão conjunta nos assuntos conflituosos em questão. A negociação faz parte do nosso dia a dia, a utilização do MAPAN é fundamental ao profissional do direito o qual se utiliza métodos alternativos mais favoráveis devendo sempre ser levado em consideração a preparação, a negociação e por fim a efetivação do acordo.

De uma forma geral e preventiva diversas empresas repactuaram suas obrigações com fornecedores e clientes. As Casas Bahia, a título de exemplo, sem que houvesse qualquer determinação ou pedido, suspendeu o recebimento de todas as parcelas de seus financiamentos no mês de abril, o que representou um alívio para seus clientes, sendo que tal montante será pago após a última parcela regular do contrato sem a incidência de acréscimos.

O Estado também caminhou neste sentido, tanto que a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL proibiu o corte de energia elétrica por três meses, mesmo diante da inadimplência; o Conselho Monetário Nacional, logo no início da pandemia, determinou que os bancos suspendessem as parcelas dos financiamentos imobiliários e automotivos, para os interessados, por dois meses.

Ou seja, de forma natural as obrigações vão se acomodando, contudo, nem sempre isso ocorre, existindo a necessidade de intervenção estatal, por meio do Poder Judiciário ou valendo-se de meios privados, como a mediação ou a conciliação.

Por fim, não se pode desconsiderar as negociações desenvolvidas pelos advogados, profissionais do direito extremamente qualificados que, em nome de seus constituintes negociam e chegam a autocomposição, ao meio termo que resolve a controvérsia entre as partes e lhes permite trilhar o melhor caminho para seus interesses sociais e econômicos.

Destaca-se ainda que tais negociações, desenvolvidas por advogados, podem ser materializadas em adendos aos contratos originários e registradas em cartório, dando maior segurança ao acordado, sendo esse o método mais dinâmico e com menos formalismos, adequado ao que se espera neste momento de incertezas e de grande velocidade nas alterações das relações obrigacionais.

A palavra de ordem é negociar e obter resultados rápidos com o mínimo da presença estatal, possibilitando assim a retomada da atividade empresarial e o crescimento da economia, amoldando-se sempre as condições que preservem a saúde e a vida de todos.

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t*Clodoaldo Moreira dos Santos Júnior é pós-doutor em Direito Constitucional na Itália, advogado, professor universitário, sócio fundador Escritório SME Advocacia, conselheiro da OAB/GO, presidente da Comissão Especial de Direito Civil da OAB/GO, membro consultor da Comissão de Estudos Direito Constitucional da OAB NACIONAL e árbitro da CAMES.


t*Tiago Magalhães Costa é especialista em Direito Civil e Processual Civil, advogado, professor universitário, sócio fundador escritório SME Advocacia, vice-presidente da Comissão Especial de Direito Civil da OAB/GO e vice-presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB/GO.




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