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Revolução industrial, o retorno?

Andréa Maria Zattar e Ricardo Calcini

Recordemos o impacto da revolução industrial, onde as máquinas substituíram um elevado número de empregados, levando-os ao desemprego, formando um verdadeiro exército de reserva de mão de obra, cujos salários foram reduzidos e os lucros aumentaram substancialmente.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Atualizado às 08:59

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De forma simples, a permitir a compreensão dos leitores, pretendemos discorrer breves considerações sobre os efeitos da pandemia frente ao mercado de trabalho, demonstrando o retrocesso social que já estamos vivenciando.

Com efeito, o empregado já vitimado com a reforma trabalhista, com redução de direitos, tendo inclusive seu amplo acesso ao judiciário condicionado ao pagamento de despesas processuais - honorários sucumbenciais em caso de perda parcial e/ou integral da ação, além de honorários periciais quando necessário à nomeação de profissional habilitado para dirimir a controvérsia, caso a conclusão for desfavorável à sua pretensão.

Não bastasse a redução de diversos direitos trabalhistas e o repasse dos custos processuais decorrentes em caso de improcedência da lide, surge, atualmente, a pandemia do novo coronavírus, que exige a paralisação das atividades econômicas que não sejam essenciais.

As empresas foram forçadas a interromper a continuidade de suas atividades, enquanto outros ramos não atingidos pela crise acresceram substancialmente os lucros.

Para a grande massa de empregados, porém, restou o isolamento social, a redução salarial e o desemprego.

O Governo Federal editou medidas provisórias objetivando manter o emprego e a renda dos trabalhadores, permitindo a redução da jornada com a consequente redução salarial, mediante a complementação parcial do salário por um período de 90 dias e, mais, autorizou também a suspensão do trabalho, por um período de 60 dias, sendo que em tais situações fica assegurada a estabilidade ao emprego, por igual período (MP 936/20).

Ocorre que mesmo com a iniciativa governamental, em que o Estado assumiu parte do principal encargo do empregador que consiste no pagamento dos salários, muitas são as demissões.

Com medo da insegurança jurídica, com receio de demandas judiciais, além da queda do capital, muitas empresas estão promovendo dispensas em massa, sendo que parte delas inclusive desprovidas do pagamento das verbas rescisórias, trazendo inúmeros prejuízos aos empregados que não podem prover a subsistência de sua família.

Lado outro, com a autorização do gradativo retorno das atividades comerciais, é certo que as empresas contratarão outros empregados que já somam uma grande reserva de mercado, prontos a se sujeitar à extensa jornada de trabalho, larga produção e baixo salário.

Neste cenário o que se questiona é o seguinte: estaremos mais uma vez à frente do conceito de "Mais Valia"?

Para quem não se recorda, trata-se da teoria marxista, elaborada por Karl Marx e Friedrich Engels, retratando a luta de classes, o confronto entre os detentores dos meios de produção (dinheiro, equipamentos/máquinas e produção) e o trabalhador, denominado proletariado, que vende a sua mão de obra, o seu suor, em troca de salário, ou seja, o trabalho torna-se uma mercadoria.

Recordemos o impacto da revolução industrial, onde as máquinas substituíram um elevado número de empregados, levando-os ao desemprego, formando um verdadeiro exército de reserva de mão de obra, cujos salários foram reduzidos e os lucros aumentaram substancialmente.

Entrementes, com o retorno das atividades empresariais, pós pandemia, a esperada necessidade de produção em larga escala, para minimizar os prejuízos do período de paralisação, implicará em contratações, exigindo-se o trabalho em jornadas prolongadas e salários reduzidos.

E aqui fica ao leitor a reflexão: estaremos diante de uma nova revolução industrial?

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*Andréa Maria Zattar é advogada há 20 anos no Estado de Mato Grosso, atuando nas áreas cível, trabalhista e consumerista.

*Ricardo Calcini é mestre em Direito pela PUC/SP. Professor de pós-graduação em Direito do Trabalho da FMU. Palestrante e instrutor de eventos corporativos "in company" pela empresa Ricardo Calcini | Cursos e Treinamentos.

 

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