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Terceirização trabalhista - em busca do elo perdido

Na função de advogados que atuam na área trabalhista, é comum sermos consultados e até mesmo "pressionados" por empresas de diversos setores, especialmente através de seus departamentos de RH, ou ainda por condomínios, shopping Center, etc, que cobram uma solução para a terceirização de mão de obra em alguns de seus departamentos, os mais diversos.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Atualizado em 14 de novembro de 2008 13:45


Terceirização trabalhista - em busca do elo perdido

Mauro Tavares Cerdeira*

Marcelo Tavares Cerdeira*

Na função de advogados que atuam na área trabalhista, é comum sermos consultados e até mesmo "pressionados" por empresas de diversos setores, especialmente através de seus departamentos de RH, ou ainda por condomínios, shopping Center, etc, que cobram uma solução para a terceirização de mão de obra em alguns de seus departamentos, os mais diversos. De fato, com o passar dos anos, a "necessidade" de terceirização de atividades nas empresas brasileiras parece ser cada vez maior. Já chegamos a pensar, que com o passar do tempo e o envelhecimento, havíamos ficado mais irritadiços; daí passamos a anotar o número de pedidos neste sentido e vimos que, mês a mês, ele realmente crescia, de forma mesmo descomunal. A terceirização, então, deveria ser a própria "terceira onda". A solução das agruras do mundo do trabalho. Só poderia ser!

Em recente workshop promovido por nosso Escritório aqui em São Paulo, convidamos o Festejado Professor e Gentlemen Dr. Rui Públio, Juiz da 60ª Vara do Trabalho de São Paulo, para falar sobre o tema "limites da terceirização trabalhista na atualidade", que na realidade, são os mesmos de alguns anos atrás, e de outros ainda mais atrás, e o Mestre contou uma história interessante. Disse que vem sendo convidado para ministrar palestras com títulos como "novos limites da terceirização" ou "meios de promover a terceirização lícita", ou "novas maneiras de terceirizar a mão de obra", enfim, coisas do tipo; afirmando que o resultado de suas palavras é sempre o mesmo, e nem tem como ser outro, ou seja, do ponto de vista legal, não se pode terceirizar mesmo no Brasil, a não ser nas hipóteses que todo mundo conhece; vigilância (que tem Lei específica - 7.102/83 - clique aqui), limpeza, e outras atividades que não são da finalidade ou do objeto da empresa, ou ainda, a terceirização é admitida no que se convencionou chamar de "atividades meio", que quase sempre, se conclui, ou melhor, concluem os nossos julgadores, indicam o retorno às duas atividades já expressamente mencionadas. Ou seja, nós lá do Escritório tomamos foi uma lição de marketing, pois ele disse que com esses nomes mais, digamos, criativos, as palestras ficam bem "cheinhas". Mas, como o nosso evento também esteve bem prestigiado, nos conformamos com nossa falta de imaginação.

E agora o mais inusitado. Em velocidade semelhante ao crescimento das consultas e pressões que buscam intensificar os processos de terceirização empresariais, estamos vivendo cá na Empresa (há os que ainda dizem que escritórios de advocacia não são empresas, mas enfim, a coisa é a coisa, independente do nome que insistam em lhe dar), "tudo ao mesmo tempo agora", um grande crescimento inverso, qual seja, o de empresas e mais empresas que enfrentam problemas com contratos de terceirização passados ou em curso. Antigamente dizíamos: "problemas com contratos de terceirização mal feitos". Hoje em dia, ao que parece, ou todos os contratos de terceirização são mal feitos, ou na realidade não são só os mal feitos que estão a dar problema. E pior ainda, parece que as empresas terceirizadas, em grande parte, são mais mal feitas que a terceirização em si, pois uma parcela delas tem vida muito curta, por motivos diversos, e algumas outras estão aí, digamos, "para botar pra quebrar". E a "bronca" fica para o tomador. Bronca daqui e bronca de lá, sobra mesmo o tomador, ou contratante, aqui no Escritório, ou em qualquer outro, "chorando as mágoas", geralmente desprovido de documentos, respondendo a vários processos, executado de cá e de lá. Os gigantes tem tudo isso orçado no passivo e a vida é assim mesmo e ganham cada vez mais. Os grandes agüentam o baque e saem com as honras da casa. Os médios e os pequenos, principalmente estes, nem tanto. Chegam a ver a empresa se deprimir, por vezes, suportando ônus inimagináveis outrora. Em condomínios então, há o ciclo: terceirização - euforia - aumento de reservas - viva o síndico - ações - condenações - sufoco financeiro - substituição do crápula do síndico. Na verdade, então, tudo é cíclico, e isso é muito curioso, até hoje não consigo entender porque de manhã atendo duas empresas que querem terceirizar a qualquer custo, e à tarde duas que querem arrumar um jeito de escapar dos custos anômalos da terceirização.

Mas não é só isso; não entendi até hoje como um boeing, daquele tamanhão e cheio de gente dentro, fica plainando no ar, e também como uma folha sai lá de Belo Horizonte e chega aqui em São Paulo no meu Fax. Tanta coisa realmente estranha! O negócio então é tocar o barco, mas que não deixemos de trocar nossas aflições, que é assim que aprendemos um pouco mais.

E por falar em ciclo, estes dias em uma conversa de compadres, surgiu o assunto de que nada era perfeito e etc e tal e um amigo disse: "Você não vê o capitalismo, com estas crises cíclicas? Pois não conseguiram resolver isso até hoje! Taí uma imperfeição de doer." Mas aí eu tive de discordar e dizer, que embora tudo fosse mesmo imperfeito demais e que isso não teria mesmo jeito nunca, senão também nem graça teria, que tal imperfeição o capitalismo mesmo não tinha, de jeito nenhum, e fiz uma pergunta simples: "Você já reparou, que a cada crise do capitalismo, no final, quando a roda gigante chega em cima de novo, houve um processo de maior concentração de renda, e os tubarões estão mais gordos e dentuços, e lá embaixo os peixinhos estão magrinhos e pálidos, tendo mesmo desaparecido alguns?". Pois é, isso é na verdade um processo de eliminação de arestas e de super-concentração, de aperfeiçoamento de um sistema, diga-se lá, imperfeito, quem sabe. Mas é isso.

Voltando à vaca fria, que é bem quente, por sinal, compensa pensar um pouco em quais seriam os motivos da busca, cada vez maior, da terceirização de mão de obra.

O motivo apontado para a terceirização, nos países capitalistas desenvolvidos economicamente, é a possibilidade da empresa se concentrar em sua atividade principal ou em seu objeto específico, ou seja, na produção ou comercialização ou desenvolvimento de seus produtos e/ou serviços; transferindo tarefas e atividades que são acessórias, e, portanto, em relação às quais a empresa não possui afinidade, conhecimento ou expertise técnica, nem muito menos tradição; para outras empresas, que são especialistas em tais tarefas.

Assim, as empresas contratantes de tais serviços terceirizados, ao transferirem a própria administração de tais serviços a terceiros, ganham tempo e economizam preocupações, o seu serviço rende mais, e os resultados alcançados são evidentemente superiores.

De notar-se que, neste raciocínio, não há um barateamento em si do custo do serviço terceirizado. Por exemplo, não se verifica, nos EUA, por exemplo, que um serviço de limpeza, ou auditoria, ou de fornecimento de refeição, ou de advocacia, seja, por si, mais barato que um serviço interno, prestado por profissionais da própria empresa. O requisito econômico, logicamente, caso a caso e em todos os casos, é sempre levado em conta, mas, o que estamos aqui dizendo, é que o motivo imediato da terceirização não é exatamente esta economia direta. Por óbvio que, o fato da empresa não se ativar na administração e execução de tarefas acessórias, deverá gerar uma economia de custos, na medida em que há uma redução organizacional, de treinamento de seus funcionários e outros, e uma possibilidade de maior especialização de suas atividades. Essa economia é normal e não se relaciona ao fato da remuneração em si do profissional terceirizado ser menor que a do profissional que eventualmente fosse contratado diretamente pela empresa.

Ocorre que, no Brasil, a questão parece se dar de forma um pouco distinta, pelo menos em alguns dos casos.

Logicamente que existem aqui várias empresas que terceirizam com o mesmo intuito descrito acima, e existem inclusive empresas que nunca tiveram problemas com terceirização no Brasil. É corrente que, se a remuneração está correta, se todas as verbas estão pagas corretamente, se o empregado é bem tratado e incentivado, se tem programa de incentivos e de participação nos lucros e resultados, e se a diferença é praticamente o nome da empregadora e quem faz a reunião no final do mês, parece óbvio que não haverá problemas.

O nó da terceirização talvez esteja expandindo aqui, pelo fato de, cada vez mais, a motivação desta conduta estar sendo vinculada a uma tentativa, ou esperança, de redução de custos pelas empresas. Acreditamos que se houver uma pesquisa, do motivo pelo qual as empresas necessitam ou querem terceirizar seu efetivo, a resposta, caso seja sincera, deve vir nesse sentido.

De fato, o custo da mão de obra em nosso País é alto. Estou até vendo o leitor dizendo: "Descobriu o Brasil", que nem quando eu era menino. Aqui é o lugar onde é realmente válido o ditado: "É muito para quem paga e pouco para quem recebe". Os encargos são muitos e diversos, e pouca coisa vai para o trabalhador e a maioria para o Governo. E tanto o trabalhador quanto o empresário, ainda pagam uma maciça carga (indireta) sobre os produtos que adquirem. Parte do chamado "Custo Brasil". Aliado a corrupção e outros males, é mesmo insuportável. Parece nome de filme: "Sem Saída".

Pois bem, na nossa análise, parece haver uma esperança em parte das empresas, de que caso a mão de obra seja terceirizada, e, portanto, "o abacaxi caia na mão de outro", haverá uma economia para a empresa, melhores condições de competitividade etc.

Esta economia, no entanto, em uma primeira análise, somente poderia advir de uma lesão de direitos dos empregados, de uma fraude ao fisco ou ao INSS, já que o terceirizado também tem as mesmas obrigações para com os seus empregados, deve recolher tributos, possui suas despesas fixas, e ainda tem que auferir sua margem de lucro sobre o negócio.

O fisco já andou tomando suas precauções e ordenou a retenção dos tributos pelo contratante. O INSS andou engolindo vários prejuízos nos anos que se passaram, já que empresas de prestação de serviços terceirizados figuram entre suas maiores devedoras. Os trabalhadores realmente costumam ser lesados, mas o "barato" costuma sair muito caro para os contratantes ou tomadores dos serviços terceirizados, pois chegam as ações trabalhistas, e quem acaba respondendo em última instância são estes últimos, e isso costuma ser bem mais oneroso, em virtude dos prejuízos encontrados para a formulação de uma boa defesa, entre outros motivos.

Imaginem, com as terceirizações promovidas por órgãos públicos, cada dia maiores, de serviços de vigilância, limpeza, copa, portaria, controle de acesso, recepção e outros tantos, e a ocorrência notória de quebras contínuas destas empresas, e a "notável facilidade destes órgãos em se defender", a quanto não deve estar o passivo gerado pelas suas obrigações solidárias e subsidiárias no universo trabalhista? E uma surpresa: Seremos, nós contribuintes, que pagaremos, e já estamos pagando, esta conta.

E já notaram que empresas terceirizadas costumam não ter bens? Como se dizia lá no meu Guaxupé, de regra, "não tem um gato a puxar pelo rabo". E isso pode? Quem contrata não deveria exigir garantias? E de que adianta, por exemplo, o órgão público cumprir a lei da menor oferta nas licitações, se o menor preço, quando se passa a régua, é na verdade o maior?

E aqui, em segunda análise, há mais uma questão a ser considerada. O nosso sistema sindical é constituído por categorias. E estas seguem convenções coletivas. Os empregados de uma empresa devem ter os direitos da categoria preponderante. A exceção são as categorias diferenciadas, leque este muito restrito. Mas, sabe-se lá porque, ou não se quer é contar, temos por aí sindicatos legalizados de "trabalhadores de empresas terceirizadas", que passam longe da diferenciação legal. Alguns representam tantos profissionais que são popularmente chamados por aí com a terminação "ão". Pois bem, há marcante diferença, muitas vezes, entre as remunerações de cargos de terceirizados que não poderiam ser terceirizados, e dos mesmos cargos caso não fossem terceirizados, na mesma empresa. Apostem então suas fichas. E sobra sempre para o judiciário resolver. E tenho alguns amigos Juízes do Trabalho que julgam processos até enquanto dormem, porque desse jeito não tem quem possa agüentar. E qualquer dia vamos contar da "quarteirização", que não é a reunião de vários quarteirões de um bairro.

Pois bem, o problema é mais ou menos esse. O difícil é resolver. E falando de problemas, logicamente que esse não é o maior. É sabido que metade da mão de obra no nosso País é informal, talvez mais um pouco. Está e não está trabalhando. Ou seja, trabalha, mas não tem carteira assinada. Não entra nas estatísticas; olha que preconceito, não tem nem o direito de participar das estatísticas do IBGE. Não contribui para o INSS, e talvez não vá poder reclamar depois de o órgão quebrar, e nem vá poder reclamar das filas avantajadas. Então, caso a gente olhe para as coisas de uma maneira mais abrangente, a terceirização então é nota pequena.

Na verdade, como indicou o genial Ministro Vantuil Abdala em recente artigo publicado (Migalhas 2.010 - 22/10/08 - "Terceirização" - clique aqui). Tudo isso está a nos mostrar que a realidade está requerendo e implorando mudanças. A nossa sociedade necessita de uma reavaliação nestes pontos, e em muitos outros, e os órgãos responsáveis são lentos, burocráticos, e presos a interesses conservadores e hipócritas. Descobri o Brasil de novo, não foi? A primeira medida a ser tomada, isso acredito que seja consenso, é a redução urgente da carga tributária, especialmente sobre a folha de pagamentos das empresas. Sem dúvida que tal medida diminuiria a progressão da economia informal, e também a terceirização indevida. E logicamente que geraria um aumento da atividade econômica. Lembram das reformas tributária, trabalhista e sindical, que rodaram com o mensalão? Pois é.

De lembrar-se que estamos em uma economia globalizada. A competição não é só entre nós. Nossas empresas competem com o mundo. A pressão por menores custos é universal. E o peão que esteve dormindo perdeu o bonde.

Enquanto isso, logicamente, não dá para transgredir o sistema vigente. Não dá para culpar os Juízes, por exemplo, pelo cumprimento da lei. Então, vamos continuar aqui no Escritório atendendo cedo e à tarde.

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*Advogados do escritório Cerdeira Chohfi Advogados e Consultores Legais










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