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Nicolau Zarif, um gigante

Um dos meus filhos, lendo Newton encontrou a passagem, por ele escrita, referente à hipótese dos anões sentados nos ombros de gigantes. Vi longe porque estava sentado nos ombros de gigantes, disse ele. Será que conseguimos ver mais longe do que os filósofos gregos, digamos, ver mais longe do que Sócrates, Platão e Aristóteles?

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Atualizado em 17 de agosto de 2009 11:08


Nicolau Zarif, um gigante

Sérgio Roxo da Fonseca*

Um dos meus filhos, lendo Newton encontrou a passagem, por ele escrita, referente à hipótese dos anões sentados nos ombros de gigantes. Vi longe porque estava sentado nos ombros de gigantes, disse ele. Será que conseguimos ver mais longe do que os filósofos gregos, digamos, ver mais longe do que Sócrates, Platão e Aristóteles? Certamente que sim, é a resposta. Daí se extrai que somos muito melhores do que eles? Não, também é a resposta. Então como enxergamos mais longe do que eles? Somos na verdade anões nos ombros dos gigantes. Os anões pouco percebem porém quando encarapitados nos ombros de gigantes, por uma questão matemática, conseguem enxergar mais longe do que eles. Newton considerava-se um anão perto dos filósofos da antiguidade. Cito de memória.

Se minha memória não estivesse tão falha, disse ao meu filho, que a hipótese não era de Newton, mas, sim, de Bernardo de Chartres, o grande mestre da Gália. Consultada a internet, Bernardo de Chartres venceu a parada. Será que até Newton citava obra alheia sem indicar a fonte? Parece-me que sim. Desnecessariamente, é lógico.

Estando fora do país recebi a notícia do falecimento de Nicolau Zarif, o pai. O triste fato trouxe-me do fundo da memória um acontecimento marcante para a minha carreira de promotor de Justiça.

Ingressei em novembro de 1970 e com os meus então colegas, hoje queridos amigos, fui levado a assistir às aulas ministradas por membros mais antigos da carreira. Nicolau Zarif era um deles. Falou sobre registros públicos. Foi só elegância e firmeza, marcas de seu caráter.

No entanto, fiquei um surpreso com o seu discurso. Não percebia até então como o Ministério Público poderia ter interesse no âmbito do registro público, o que me parecia ser uma verdadeira heresia.

Fiquei perplexo com a argumentação jurídica de Nicolau Zarif. Sai convencido da relevância do trabalho a ser realizado pelos promotores de Justiça não apenas no domínio do registro público, mas, sim, em qualquer área na qual fosse exigida a sua presença para proceder ao controle de legalidade tanto nas relações jurídicas públicas como nas privadas.

Pouco tempo após, participei do Grupo de Estudos que convidou Nicolau Zarif para reproduzir sua aula, se bem me lembro, em Porto Ferreira. É escusado dizer que a sua lição, temperada pela especialidade dos registros públicos e pela universalidade da nova visão das funções ministeriais iluminaram os meus passos.

Roubo a frase de Bernardo de Chartres e de Newton, porém citando a fonte. Nicolau Zarif foi um dos gigantes a carregar nos ombros os anões, como eu, que enxergavam pouco além da ponta de seu nariz. Suponho que vivi o Ministério Público antevisto por ele. A sua vida foi exemplar. O seu falecimento causou um irreparável vazio na nossa história. Foi um homem de bem. Foi um dos gigantes de seu tempo.

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*Advogado, Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de São Paulo, professor da Faculdade de Direito COC





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