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PL 5.139/09 (Código de Ações Coletivas). Insegurança jurídica, entrave para o desenvolvimento sustentável do Estado

Está em discussão na Câmara dos Deputados o PL 5.139/2009, cujo fundamento principal é a revogação da lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), bem assim de alguns dispositivos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor que tratam especificamente das ações coletivas.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Atualizado em 20 de novembro de 2009 11:54


PL 5.139/09 (Código de Ações Coletivas). Insegurança jurídica, entrave para o desenvolvimento sustentável do Estado

Adenisio Coelho Junior*

Está em discussão na Câmara dos Deputados o PL 5.139/2009 (clique aqui), cujo fundamento principal é a revogação da lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública - clique aqui), bem assim de alguns dispositivos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor que tratam especificamente das ações coletivas.

Segundo consta, o Projeto de lei é fruto do trabalho desenvolvido pela Comissão Especial criada pela Portaria do Ministério da Justiça 2.481, de 9/12/08.

A exposição de motivos aduz que o Projeto será um "passo importante rumo ao acesso à justiça e à efetividade da tutela coletiva".

Na justificativa, o autor proclama: "o Projeto objetiva ser uma adequação às significativas e profundas transformações econômicas, políticas, tecnológicas e culturais em âmbito global, aceleradas nesta virada do século XX".

A justificativa é fundamentada e erudita ressaltando a modernidade do Projeto. Entretanto, há que se analisar com cautela as consequências decorrentes das profundas e radicais mudanças que se pretende introduzir no ordenamento jurídico pátrio. Vários dos preceitos elencados no Projeto dão ensejo a um modelo desbalanceado, cujo intuito precípuo parece ser o de se fazer com que a ação coletiva seja decidida de forma procedente a qualquer preço.

Evidentemente, para se dizer o mínimo, isso não se alinha com os princípios constitucionais da isonomia e do devido processo legal.

Para se ter noção da dissensão, ao Projeto original, foram apresentadas 11 (onze) emendas. Em seguida, ao substitutivo, foram apresentadas outras 100 (cem).

Atualmente o projeto encontra-se sob análise de uma Comissão Especial, composta por 17 (dezessete) Deputados, constituída para estudar a matéria constante do Projeto.

O Projeto de lei preconiza, tal como proposto, uma intervenção, data venia, indevida do Estado através do Judiciário e do Ministério Público, com os mesmos nefastos efeitos à época perpetrados pelo Ato Institucional 5 (AI-5), decretado pelo Executivo, em dezembro de 1968, que concentrou nele a hipertrofia do Estado.

Em 1964, o movimento militar ensejou o encerramento de um período de liberdade política. Como conseqüência, nos anos que se seguiram, as liberdades públicas foram sendo eliminadas progressivamente até que, em dezembro de 1968, foi baixado pelo Executivo o AI-5. O poder passou a ser concentrado.

Foi o mais duro golpe do governo militar, pois afrontou os poderes constituídos, malferiu direitos individuais e coletivos, aposentou juízes, cassou mandatos de deputados, enfim, desfigurou a República.

Não é preciso lembrar os efeitos deletérios sobre a economia nacional ante a ausência da segurança jurídica.

E é exatamente sob a ótica deste ponto, crucial para o desenvolvimento sustentável do Estado, que focamos a nossa atenção quando da análise do PL 5.139/09.

O Poder que outrora ficou concentrado nas mãos de militares agora passa para as dos Juízes. Estes poderão modificar os atos e fases do processo a qualquer momento, não haverá mais rito processual. É a busca pela procedência da ação a qualquer preço!

Mas não é só! O autor da ação coletiva poderá alterar o seu pedido, bem como a causa de pedir, em qualquer fase do processo até a sentença e, mesmo que o autor não requeira, poderá o Juiz, por sua própria iniciativa, conceder tutela antecipada.

A propósito, poderá o Juiz agir de ofício em diversas outras situações antes vedadas pelo princípio da inércia e imparcialidade.

Ao Ministério Público, como não poderia ser diferente, o Projeto de lei atribui super poderes, chegando ao extremo de permitir a intervenção em empresas privadas para o cumprimento de Termos de Ajustamento de Conduta e de requerer modificação dos pedidos e da causa de pedir mesmo quando não atuar como Autor da ação coletiva.

O Judiciário tem o dever constitucional de agir imparcialmente. O tratamento processual das partes não pode implicar em benefícios exagerados ao Autor em detrimento do Réu.

Na consciente expressão da Kazuo Watanabe, "o acesso à justiça resulta no acesso à ordem jurídica justa".

Não se pode perder de vista o Princípio da Segurança Jurídica, o qual se encontra intensamente relacionado com o Estado Democrático de Direito, sendo a este inerente e essencial.

A Justiça não deve ser vista apenas como manifestação final do Poder Judiciário, mas, sim, como o conjunto de ações que levam à adequada realização de valores acolhidos pelo ordenamento social e traduzidos no ordenamento jurídico.

É objetivo do Estado, consagrado na Constituição, o desenvolvimento econômico para o qual se exige a Segurança Jurídica plena. A atração de investimentos que viabilizam o desenvolvimento sustentável com a geração de empregos, a erradicação da pobreza e a consequente dignificação da pessoa humana não é possível sem o respeito às garantias constitucionais.

Ao que pudemos ver, o Projeto de lei afigura-se como norma discrepante das garantais constitucionais e a coexistência deste no ordenamento jurídico pátrio não se sustenta.

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*Sócio do escritório Mario Oscar Oliveira & Advogados Associados

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