Voto de presos provisórios

19/2/2010
Wanderley Rebello Filho - escritório Rebello e Bernardo Advogados Associados

"Em um estudo superficial da vitimologia, percebemos que os ditos criminosos desempenham dois papéis: primeiro o de vitimizador, aquele que pratica atos criminosos e que produz vítimas; depois, o papel de vitimizado, pois ele se torna vítima da omissão criminosa do Estado, com a conivência dos poderes legislativo e judiciário. Os crimes ocorrem por ação e por omissão, não é? Vejam o quadro caótico de quase todos os presídios de nosso país! Mas, não é só isto. Vejamos, entre outras coisas, a proibição criminosa de não permitir que os presos provisórios votem (Migalhas 2.328 - 18/2/10 - "Voto em cárcere" - clique aqui). Não há justificativas para o não cumprimento das leis, principalmente da Constituição Federal. Trata-se, então de uma forma de abuso de Poder. Pode haver abuso de poder por omissão, não pode? Aliás, é um círculo vicioso: o Estado não cumpre as leis com relação aos presos, e o legislativo e o judiciário não dão a mínima, até porque, entre outras coisas, os presos provisórios não podem votar, ou melhor, são ilegal e arbitrariamente proibidos de votar. Caso votassem, o legislativo voltaria os seus "olhos interesseiros" para eles. E o judiciário, automaticamente, se ocuparia mais da proteção dos seus direitos, ou sofreria as cobranças do legislativo. E o Estado se preocuparia mais em garantir a dignidade dos presos, temente ao judiciário e ao legislativo. E assim sucessivamente! E todos os presos seriam beneficiados, pasmem, com o cumprimento das leis! Logo, a garantia do direito ao voto, repito – direito – seria a certeza de que aquele quadro caótico acima mencionado diminuiria! A Carta dos Princípios Básicos da Vitimologia afirma a necessidade de adoção, a nível nacional e internacional, de medidas que visem garantir o reconhecimento universal e eficaz dos direitos das vítimas da criminalidade e de abuso de poder. E os presos são vítimas, indubitavelmente, de abuso de poder, ou melhor, de extrema negligência produzida por em injustificável abuso. Até porque, entendemos como vítimas as pessoas que, individual ou coletivamente, sofram prejuízos e/ou atentados à sua integridade física ou mental, um sofrimento de ordem moral, uma perda material, ou um grave atentado aos seus direitos fundamentais, como conseqüência de atos ou de omissões violadores das leis vigentes, incluindo as que proíbem o abuso de poder. Podemos incluir os presos, provisórios ou não, facilmente neste conceito! "Os homens nascem iguais em direitos e dignidade, devendo-se assegurar aos mais carentes o efetivo acesso ao Judiciário, para que o processo seja uma luta de pessoas iguais com armas iguais na busca por Justiça", afirmou o ministro Luiz Fux, do STJ, em conferência na sede da Ordem dos Advogados de Nova York, durante o lançamento da Declaração Pro Bono para as Américas. Ora, será que os presos provisórios também não são merecedores deste acesso ao Judiciário, caso este direito ora discutido não seja a eles garantido? Os presos, por ora, estão entre os mais carentes, e também estão em busca da Justiça! E a OAB, e a Defensoria Pública dos Estados, e os Escritórios Modelos das Universidades, todos deveriam se empenhar, gratuitamente, na luta pela garantia destes direitos. Então, como permitem os poderes legislativo e judiciário que o poder executivo descumpra, impunemente, as leis e a Constituição Federal? Pode haver justificativa para isto? E como tantos de nós ficamos indiferentes, até agora? Precisaria haver um encontro tão caro para isto? Precisamos realmente mobilizar tantas instituições para isto? Para garantir direitos? Como diria o poeta, 'que país é este'? Ademais, a partir do dia em que os presos votarem, os seus direito – repito, os seus direitos – previstos na Lei de Execução Penal serão mais observados, ou melhor, garantidos, porque o poder legislativo não vai 'descansar' até vê-los minimamente efetivados, em busca – que seja – de votos em eleições. E o alarmante índice de reincidência, que no Rio de Janeiro, acho, já passa dos 80%, com certeza vai diminuir. E automaticamente, nesta seara de proteção e de garantia de direitos fundamentais, vai caminhar também o poder judiciário de todos os Estados. Com o voto virão também, estudo, trabalho, lazer, saúde, alimentação... dignos, pois os poderes constituídos vão zelar, indubitavelmente, pela dignidade da pessoa humana, que jamais vai presa com cada um de seus destinatários, ou seja, não morre quando um ser humano vai preso. E toda esta luta, diga-se para os 'desafetos' dos direitos humanos, não existe para que homens temporariamente maus tenham privilégios, mas apenas para que eles tenham garantidos os deus direitos – repito, os seus direitos. Não queremos, apenas, que eles saiam das prisões piores do que quando entraram, nem queremos que o índice de reincidência chegue aos prováveis e assustadores 100%, o que vislumbramos em um futuro próximo, nós entre grades, e vítimas maiores do medo. E tudo por causa de nossa ilegal, desumana e insensata omissão! Então, tudo o que pede e espera o IEDHMA, pasmem, é que se cumpram as leis, que se garantam direitos e que se faça justiça. Será pedir demais?"

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