Júri

19/3/2008
Karina de Alencar

“Há momentos na vida que nos marcam profundamente e, confesso, tal cena foi um desses. Era madrugada quando, como policial, tive de comparecer àquele local de crime. Era uma jovem, por volta de trinta anos, muito bela, cabelos pretos, lisos, sentada numa cadeira semi-nua, desfalecida. A marca do tiro estava na parede e, no chão, abaixo da cabeça inclinada, a certeza de que a vida daquela jovem havia sido ceifada. Desnecessário mencionar a cor rubra tomando conta do local onde estava. Uma linda jovem, mãe de família, dois filhos para dar amor, carinho, educação. Não, o pior ainda não foi esse cenário, pior foi encontrar, num dos quartos, duas pequeninas crianças, inocentes, órfãs de mãe, deitadas, cada uma em sua cama. Uma delas tinha vomitado bastante e, soubemos dias depois, presenciara o assassinato da própria mãe. A carreira policial é árdua e temos de estar preparados para as mais difíceis situações. Imaginemos o sentimento dos policiais que libertaram a criança de doze anos, vítima de maus-tratos, em Goiás. Ora sentimo-nos capazes de fazer justiça, ora impotentes. Como dizer a dois irmãos que a mamãe fora para o céu? Como explicar que o direito de ter uma mãe não é plenamente assegurado? Como explicar que a nossa vida é como um sopro e, a qualquer momento, podemos parar de respirar? Como será a vida de um menino entesourando na lembrança a triste morte de sua mãe? Como dizer aos irmãos que o assassino foi absolvido pelos jurados e caminha livremente? Foi ótimo ter lido no 'A história de um júri’, de Lima Barreto (Migalhas 1.860 - 18/3/08 – clique aqui), e saber que às vezes, após uma decisão, pode vir o arrependimento. Louvados sejam o arrependimento e o perdão."

Envie sua Migalha