Erro médico

16/5/2008
Wilson Silveira - CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL

"Recebi e-mail da Escola Paulista de Direito informando do curso de pós-graduação em erro médico. De início, assustei-me, pensando que o curso era para médicos se aperfeiçoarem em erros médicos. Depois, percebi que o curso se dirigia a advogados e profissionais de saúde, em razão das denúncias de erro médico, que vem crescendo em todo país. 'O erro dos médicos e dos gatos, a terra esconde', dizia Moliére. A lei de Talião, mais dramática, previa 'olho por olho, dente por dente', enquanto que o Código de Hamurabi (2.400 A.C.) dispunha que: 'o médico que mata alguém livre no tratamento, ou que cega um cidadão livre terá suas mãos cortadas; se morre o escravo, paga seu preço, se ficar cego a metade do preço'. Na medicina grega, havia o juramento de Hipócrates, ainda hoje jurado: ‘Aplicarei o regime para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar danos ou mal a alguém’. Na medicina árabe, o fracasso de um médico acarretava a prisão, o açoite ou a morte. No nosso país

'- O Decreto Lei 20.931/32, art. 11: "Os médicos, (...) que cometerem falta grave ou erro de ofício, poderão ser suspensos do exercício de sua profissão pelo prazo de 6 meses a 2 anos e, se exercerem função pública, serão demitidos dos respectivos cargos".

- Código Civil, art. 159: "Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano. Art. 1.545: "Os médicos (...) são obrigados a satisfazer o dano (...)".

 

- Código Penal, art. 18 "Diz-se o crime:

I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia".

Art. 133 - "Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono (...)".

Art. 135 - "Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autorização pública (...)".

O erro médico, portanto, do ponto de vista jurídico, é o mau resultado, resultado involuntário do trabalho médico (sem a intenção de produzi-lo). Havendo a intenção, qualifica-se como infração prevista no Código Penal no seu Art. 129: "Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem (...)".

A participação do médico assim torna-se sempre culposa e não dolosa na geração do erro médico. O intuito de produzir aborto, sem intercorrência grave ou lesão imprevista, configura apenas inobservância do código e da lei, mas não erro médico. Não se considera erro a inobservância das normas contidas no Código de Ética Médica, ressalvadas as formas geradoras do erro previstas no art. 29: É vedado ao médico: "Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência".'

Então, quando li a notícia de um curso 'só para erros médicos', em um país no qual, nos últimos anos, os erros médicos as denúncias cresceram 75%, preocupei-me em que o tal curso fosse para o aprimoramento dos erros médicos em si. Lembrei-me, por exemplo, de um contador que tínhamos, há muitos anos, que ao ler um relatório da auditoria, que acusava uma centena de erros da contabilidade, respirou aliviado, que: 'Ainda bem que os erros apontados são erros normais...'. Ele, por certo, necessitava de uma pós-graduação, para aperfeiçoar seus erros. Mas, voltando ao assunto, o tal curso da Escola Paulista de Direito é, sem dúvida, uma boa notícia para os advogados, que poderão se aprimorar na defesa de seus clientes médicos, que erram no atendimento de seus pacientes. Uma boa notícia, também, para os médicos e demais profissionais da saúde que, errando no atendimento dos pacientes, estarão melhor preparados, não só para se defenderem, mas para a escolha do profissional do direito que os livre da responsabilidade pelos erros cometidos. Uma péssima notícia para os pacientes, que não estão entre o público alvo do curso de pós-graduação da Escola Paulista de Direito e que, vítimas dos cada vez mais crescentes casos de erros médicos, encontrarão profissionais cada vez mais preparados para não responderem por seus atos. Seria bom, talvez – mas muito talvez – um curso destinado aos médicos e aos demais profissionais da saúde, de graduação, ou pós-graduação, só para erros médicos, não para que se eximissem da responsabilidade por cometê-los, mas para evitá-los. Mas, por certo, isso seria pedir demais, pois isso iria envolver o Ministério da Educação, as faculdades, muita coisa até, talvez, um Exame de Ordem na medicina..."

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