Separações

23/7/2008
Wilson Silveira - CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL

"Foi em 'Espaço Vital' que li a história do casal que, ao separar-se, o marido sugeriu que a esposa/separanda 'na audiência, vamos – tal como aconteceu no casamento – nos apresentar impecavelmente bem vestidos. Eu vou comprar um traje novo para mim e pago o teu vestido e os teus sapatos, que podes escolher nas melhores lojas do shopping'. O marido, sessentão, avesso a broncas, já havia antes, no escritório do advogado, aceito mesmo o desconto em folha de pagamento da pensão alimentícia, para pôr fim, amigavelmente, às mais de duas décadas de casamento. Na audiência, após elogiada pelo magistrado a postura dos separandos, a própria esposa ainda explicou o motivo: 'Foi incompatibilidade de gênios, mas um casamento de respeito e fidelidade recíproca, que durou 24 anos'. Tudo foi bem até após a despedida cordial, quando, na rua, uma sorridente morena, com menos de 30 anos, aguardava o novel separado... Foi quando me lembrei de uma tese, desenvolvida em happy hours jurídicos – assim chamamos aqueles em que se reúnem advogados ao final de expediente, notadamente no São Pedro e São Paulo ou no Pandoro, mais recentemente – no sentido de que as separações, atualmente mais sucessivas, deveriam contar com cerimônias semelhantes aos casamentos, principalmente no que toca aos presentes recebidos. Certamente os presentes de casamento são um ônus difícil de suportar para constantes convidados a testemunhar os constantes casamentos que hoje acontecem, de um mesmo personagem que, ao longo de sua vida, os vai deixando com suas ex-esposas. A tese em questão é a de que, quando da separação, uma nova cerimônia aconteça, com festa e tudo, buffet, fotografias e... os mesmos convidados, na qual o juiz declarará o casal ex-marido e mulher. Ato contínuo, será lida a lista de presentes e efetuada a devolução, a cada convidado, de seu presente, já que não serviu ao fim a que se destinava, ou seja, uma vida feliz, a dois, até que a morte os separasse, como em um conto de fadas. O fracasso foi, enfim, uma espécie de vício redibitório e as coisas devem voltar, e não só a situação do casal, ao 'status quo ante'. É claro que certos presentes, seja pela sua insignificância – e aí o fato ficará publicamente claro, para vergonha dos presenteadores – não poderá ser devolvido, por ter sido consumido pelo tempo ou, até, por ter sido repassado a terceiros, ou trocado naqueles dias de troca das casas de listas de casamento. Mas, sempre existem aqueles presentes 'bons', os que foram de fato 'escolhidos', os 'significantes', não só por razões sentimentais mas – e por que não dizer? – financeiras, que devem retornar ao patrimônio do doador, já que não serviram à sua finalidade precípua. Vantagens? Os presentes de casamento vão melhorar. E muito, com a garantia de retorno. Como há sucessivos casamentos, os mesmo presentes, se forem dos 'bons', podem ser redestinados, evitando custos para os convidados constantes que, afinal, serão sempre os mesmos. Já os convidados poderão deixar de evitar novas núpcias dos amigos, com desculpas esfarrapadas, já que terão os presentes, os mesmos, para presentear, novamente. E uma nova oportunidade se abrirá para os maus presenteadores. Porque, convidados para um segundo, ou terceiro, ou até quarto rega-bofe, terão ocasião de melhorar sua 'presenteação', já que nunca se sabe se terão que participar de uma nova cerimônia de separação, com aquela constrangedora exposição da lista de presentes, que acusará aquela 'merreca' com que presentearam os 'amigos'. É algo a pensar."

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