Constituição na Escola

Rompimento de barragem em Brumadinho: como a Constituição Federal tutela o meio ambiente?

Rompimento de barragem em Brumadinho: como a Constituição Federal tutela o meio ambiente?

1/2/2019

Felipe Costa Rodrigues Neves e Maria Paes Barreto de Araujo

Em novembro de 2015 o Brasil vivenciou o rompimento de uma barragem próxima à cidade de Mariana/MG. Na última semana, novamente o país tomou conhecimento de outro acontecimento nesse sentido: o rompimento de uma barragem em Brumadinho/MG. Ambos os eventos geraram vítimas e sérias consequências ambientais.

Segundo matéria publicada pelo jornal O Globo referente aos impactos ambientais causados pelo rompimento da barragem do Fundão, próxima a Mariana, em 2015, tal obra "abrigava cerca de 56,6 milhões de m³de lama de rejeito. Desse total, 43,7 milhões de m³ vazaram. Os rejeitos atingiram os afluentes e o próprio Rio Doce, destruíram distritos e deixaram milhares de moradores da região sem água e sem trabalho. Esse foi o maior desastre ambiental do Brasil. Apenas um mês depois, foram retiradas 11 toneladas de peixes mortos, oito em Minas e três no Espírito Santo. Três anos depois, estes estados ainda sentem os impactos ambientais".

Diante disso, percebe-se que questões ambientais são importantes e podem causar desdobramentos seríssimos. Assim, a pergunta que fica é: será que o meio ambiente é protegido pela Constituição Federal – lei maior do nosso ordenamento jurídico? Se sim, de que maneira?

A resposta para tal indagação é afirmativa. A Constituição Federal em seu "Título VIII" trata da chamada "Ordem Social" destinada a temas relacionados ao bom convívio e desenvolvimento social do cidadão prevendo, ao mesmo tempo, deveres do Estado como: (i) seguridade social (saúde, previdência social e assistência social); (ii) educação, cultura e desporto; (iii) ciência, tecnologia e inovação; (iv) comunicação social; (v) meio ambiente; (vi) família, criança, adolescente, jovem e idoso; e (vii) populações indígenas. E, cada um desses assuntos, por sua vez, é abordado em capítulo próprio dentro desse "Título VIII", estando o meio ambiente previsto no "Capítulo V".

Frise-se que a Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira a trazer um capítulo específico sobre o meio ambiente. Isso se deu por conta de uma tendência mundial vista à época referente a uma maior preocupação e atenção à preservação e impactos ambientais. Percebe-se, portanto, que a constitucionalização da proteção ambiental no Brasil é recente, tendo em vista os mais de 500 (quinhentos) anos de história da nossa nação.

Inicialmente, então, o artigo 225, do capítulo V, da Carta Magna, assegura que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".

Analisando de maneira mais detalhada os dizeres acima, temos que a expressão "todos" significa quaisquer brasileiros ou estrangeiros residentes no Brasil, conforme o artigo 5º, da Constituição Federal. Além disso, a extensão de meio ambiente encontra-se definida na legislação infraconstitucional como sendo "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".

Na sequência, ainda, a Constituição Federal destaca uma série de incumbências do Poder Público no intuito de assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente previsto no artigo 225. Dentre eles, podemos citar: (i) preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (ii) preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; (iii) exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental; (iv) controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (v) promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; (vi) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade; e (vii) definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos.

Além de tais incumbências do Poder Público, a Constituição Federal também se preocupa com a punição e com a reparação de eventuais danos ambientais causados. Nessa linha, expressamente determina que qualquer um – seja pessoa física ou jurídica – que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado por conta de suas atividades.

Ademais, prevê que as pessoas físicas ou jurídicas que praticarem condutas e/ou atividades consideradas lesivas ao meio ambiente serão penalizadas tanto no âmbito criminal quanto administrativo, bem como serão obrigadas a reparar os danos causados.

A preocupação constitucional com o meio ambiente – introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Constituição de 1988 – foi extremamente importante para conscientizar os diversos segmentos do Poder Público, tanto é que, dez anos após a promulgação da Carta Magna, o Poder Legislativo acabou editando uma lei regulamentando especificamente "as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente" (lei 9.605/98). Desse modo, diversas atividades agressivas ao meio ambiente que antes ficavam impunes, passaram a caracterizar ilícitos administrativos ou crimes.

Isso posto, percebe-se que o meio ambiente é protegido pela nossa Constituição Federal, a qual dedica um capítulo inteiro ao tema. Nesse mesmo sentido, a legislação infraconstitucional também aborda a questão prevendo, inclusive, crimes específicos para aqueles que praticarem condutas ou atividades lesivas ao meio ambiente. Logo, a tutela constitucional e legal já existe, devendo tais regras serem seguidas e aplicadas na prática.

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Colunista

Felipe Costa Rodrigues Neves é advogado formado pela PUC-SP, Mestre em Direito pela Stanford University, nos Estados Unidos. Felipe e fundador da ONG "Projeto Constituição na Escola", a maior ONG de educação cívica do Brasil, que promove aulas presenciais sobre Direito Constitucional para milhares de alunos da rede pública todo ano. Felipe já foi eleito como uma das pessoas mais influentes pela Forbes 30 Under 30 (2018), escolhido como um dos 11 jovens lideres brasileiros pela Fundação Obama (2017) e nomeado Young Leader of America, pelo Governo dos Estados Unidos (2016). Felipe ainda é o advogado mais jovem a ter recebido o Prêmio Innovare, do Ministério da Justiça (2017)".