CPC na prática

Cumprimento de sentença: a base de cálculo dos honorários advocatícios não inclui a multa cominatória

Cumprimento de sentença: a base de cálculo dos honorários advocatícios não inclui a multa cominatória.

8/11/2018

André Pagani de Souza

Ao tratar do início da fase de cumprimento definitivo de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, o § 1º do art. 523 da lei 13.105/2015 (CPC/2015) estabelece que não ocorrendo o pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento (grifamos).

Uma dúvida que pode surgir para o intérprete é como compor a base de cálculo para impor ao executado na fase de cumprimento de sentença o pagamento da multa de dez por cento sobre o valor do débito e, também, o pagamento de honorários advocatícios de dez por cento. Ou seja, como calcular o valor total devido?

Trata-se de uma dúvida bastante pertinente pois, a depender da resposta, o executado será obrigado a pagar valores significativamente diferentes. Apenas para ilustrar a importância de se responder tal questão, imagine-se que alguém foi condenado ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por meio de uma sentença. Na fase de cumprimento de sentença, este executado será intimado para pagamento dos R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais honorários de dez por cento e também multa de dez por cento se não pagar no prazo de quinze dias (art. 523, caput e § 1º, do CPC/2015).

Se a multa for incluída na base de cálculo dos honorários advocatícios desse exemplo hipotético teremos: R$ 100.000,00 (cem mil reais) somados a R$ 10.000,00 (dez mil reais) de multa, totalizando R$ 110.000,00 (cento e dez mil reais). Sobre estes R$ 110.000,00 (cento e dez mil reais), na primeira hipótese, devem incidir honorários de dez por cento (R$ 110.000,00 + 10%), totalizando R$ 121.000,00 (cento e vinte um mil reais).

Por outro lado, na segunda hipótese, se a multa não for incluída na base de cálculo, teremos R$ 100.000,00 (cem mil reais) de condenação principal, mais R$ 10.000,00 (dez mil reais) de honorários advocatícios e também R$ 10.000 (dez mil reais) a título de multa cominatória, totalizando R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais).

Como se pode perceber, neste exemplo acima mencionado, haverá uma diferença de R$ 1.000,00 (um mil reais) no valor que o executado deverá pagar a depender da inclusão (ou não) da multa cominatória na base de cálculo dos honorários advocatícios na fase de cumprimento definitivo de sentença que reconhece a exigibilidade da obrigação de pagamento de quantia (art. 523, § 1º, do CPC/2015).

Pois bem, o Superior Tribunal de Justiça, debruçando-se sobre esta importante questão que tem impacto significativo na forma de se calcular o valor devido pelo executado na fase de cumprimento de sentença, entendeu que a multa cominatória não integra a base de cálculo dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. Ou seja, ficou com a segunda hipótese acima levantada.

Trata-se de v. acórdão da lavra do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, integrante da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, proferido em julgamento datado de 09.10.2018, cuja ementa é a seguinte:

"RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA. ART. 523 DO CPC/2015. INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA DÍVIDA. NÃO INCLUSÃO DA MULTA.

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. Cinge-se a controvérsia a definir se a verba honorária devida no cumprimento definitivo de sentença a que se refere o § 1º do art. 523 do CPC/2015 será calculada apenas sobre o débito exequendo ou também sobre a multa de 10% (dez por cento) decorrente do inadimplemento voluntário da obrigação no prazo legal.

3. A base de cálculo sobre a qual incidem os honorários advocatícios devidos em cumprimento de sentença é o valor da dívida (quantia fixada em sentença ou na liquidação), acrescido das custas processuais, se houver, sem a inclusão da multa de 10% (dez por cento) pelo descumprimento da obrigação dentro do prazo legal (art. 523, § 1º, do CPC/2015).

4. Recurso especial provido.

(REsp 1757033/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/10/2018, DJe 15/10/2018)".

Para entender perfeitamente a decisão acima referida, é imprescindível transcrever um trecho do seu teor, bastante elucidativo:

"(...) Para deflagrar o cumprimento de sentença, exige-se o requerimento expresso formulado pelo credor. Ocorrendo a intimação do executado, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para satisfação do comando sentencial, após o qual o débito será acrescido de multa e de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento), totalizando, portanto, o aumento de 20% (vinte por cento).

Nesse contexto, a base de cálculo da multa e da verba honorária é o valor do crédito perseguido na execução da sentença. Ou seja, calcula-se a multa sobre o montante executado e, em seguida, procede-se da mesma forma com os honorários devidos ao advogado. Assim, por exemplo, em caso de execução da importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), será adicionado R$ 1.000,00 (mil reais) a título de multa e R$ 1.000,00 (mil reais) de honorários advocatícios.

Portanto, a base de cálculo da multa e dos honorários advocatícios é a mesma, ou seja, ambos incidem sobre o débito. Por sua vez, a expressão ‘débito’, presente no caput do art. 523 do CPC/2015, compreende o valor que o credor busca no cumprimento da sentença, acrescido, se houver, das custas processuais referentes à instauração da fase executiva, sem incluir a multa de 10% (dez por cento) pelo descumprimento da obrigação no prazo legal (art. 523, § 1º, do CPC/2015)” (os destaques são do original).

Logo, ao se interpretar o § 1º do art. 523 do CPC/2015, a conclusão à qual o Superior Tribunal de Justiça chegou é a de que a base de cálculo da multa e dos honorários advocatícios é a mesma, ou seja, ambos incidem sobre o débito. Dito de outro modo, a multa cominatória não integra a base de cálculo dos honorários advocatícios arbitrados no cumprimento definitivo de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia.

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Colunistas

André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).