Gramatigalhas

Bem – Quando usar o hífen?

Bem – Quando usar o hífen? O Professor esclarece a questão.

17/4/2019

A leitora Bianca Galafassi envia a seguinte dúvida ao Gramatigalhas:

"Por favor, ajude-me com o novo acordo ortográfico! Tenho dúvidas sobre generalizar ou não alguns casos de uso de hífen com o advérbio 'bem'. As frases a seguir estão corretas? A faca estava bem afiada, mas na ponta tinha ferrugem. Não encontrei nenhuma faca bem-afiada. Grata!"

1) Uma leitora, com o advento das novas regras de ortografia, diz ter dúvidas sobre o emprego ou não do hífen com o advérbio bem, quando este é o primeiro elemento de uma palavra. Por exemplo, bem-afiada ou bem afiada?

2) Por um lado, é importante observar que o Acordo Ortográfico de 2008, quanto ao uso do hífen, teve em mira os seguintes objetivos: a) diminuir ao máximo seu emprego, quer pela junção dos elementos sem hífen (corréu e contrassenso), quer por sua separação em vocábulos distintos, mas sem hífen (à toa, dia a dia e pôr de sol); b) especificar melhor as regras para seu uso; c) conferir sistematização mais lógica a seu emprego.

3) Apesar das boas intenções e das estudadas tentativas nesse sentido, porém, o certo é que, no que tange ao advérbio bem, não foram fixados critérios objetivos, que pudessem solucionar, de maneira clara e simples, as questões práticas, sem que o usuário venha a se encontrar frequentemente às voltas com dúvidas.

4) De modo prático, para bem esclarecer a dúvida da leitora, observa-se, desde logo, que a Academia Brasileira de Letras é quem detém a autoridade para listar, oficialmente, não apenas as palavras existentes em nosso idioma, mas também seu modo de escrever, e ela exerce essa autoridade por meio da edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.

5) E uma consulta à mais recente edição do VOLP, entretanto, evidencia que a grafia dos vocábulos precedidos de bem não se reveste de critérios objetivos nem de coerência.

6) Assim, num primeiro aspecto: a) em algumas palavras, foram separados os elementos por hífen (bem-acabado, bem-acostumado, bem-amado, bem-apanhado, bem-dotado, bem-estar, bem-humorado, bem-sucedido); b) em outras, de modo facultativo, foram juntados os elementos sem hífen, com a transformação de bem em ben (bem-dizer ou bendizer, bem-querer ou benquerer); c) em outras, por fim, por ausência de especificação dos vocábulos na lista oficial, o certo é que, pelas regras gerais de grafia, os elementos devem ser escritos de modo separado e sem hífen (bem adestrado, bem assado, bem considerado e bem falado).

7) Com essas observações, num segundo aspecto, quando, em comparação com bem, se consideram os vocábulos precedidos de mal, também se nota a falta de coerência do VOLP, o qual, por exemplo, registra mal-aconselhado, mal-assado e mal-assimilado, mas não registra seus antônimos, os quais, em obediência às regras de grafia, deverão ser escritos em elementos separados e sem hífen (bem aconselhado, bem assado e bem assimilado), do que deflui, claramente, uma confusão geral.

8) E, assim, respondendo especificamente à indagação da leitora, como o VOLP não registra o vocábulo da consulta com hífen, isso quer dizer que tal palavra entra na vala comum daquelas cujos elementos se escrevem separadamente, sem hífen algum: bem afiada. Não importa se a expressão é "a faca estava bem afiada", ou se é "não encontrei nenhuma faca bem afiada".

9) Por fim, duas ponderações adicionais precisam ser feitas: por um lado, como já se disse, o VOLP (editado pela ABL) é a palavra oficial em termos de grafia das palavras em nosso idioma, e a ele devemos prestar obediência, de modo que, na dúvida, a solução é consultá-lo; por outro lado, lembra-se que resta a esperança de que a ABL, em futura edição do VOLP, busque um foco mais preciso e critérios mais objetivos e coerentes com vistas à solução deste problema.

 
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Colunista

José Maria da Costa é graduado em Direito, Letras e Pedagogia. Primeiro colocado no concurso de ingresso da Magistratura paulista. Advogado. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP. Ex-Professor de Língua Latina, de Português do Curso Anglo-Latino de São Paulo, de Linguagem Forense na Escola Paulista de Magistratura, de Direito Civil na Universidade de Ribeirão Preto e na ESA da OAB/SP. Membro da Academia Ribeirãopretana de Letras Jurídicas. Sócio-fundador do escritório Abrahão Issa Neto e José Maria da Costa Sociedade de Advogados.