Ordem na Banca

A nova estratégia na advocacia: O sócio que decide demais e enxerga de menos

Escritórios patinam quando sócios decidem no escuro. Lara Selem revela: Observar mudanças, interpretar impactos e agir estrategicamente garante eficiência e vantagem competitiva.

26/11/2025

Em boa parte dos escritórios, o problema não é falta de trabalho. É excesso de decisões tomadas no escuro. Sócios passam o dia resolvendo impasses, aprovando demandas, opinando sobre tudo e colocando energia em urgências que poderiam ter sido evitadas. O volume de decisões cria a sensação de produtividade, mas não cria avanço real. O escritório se movimenta muito e progride pouco.

Esse comportamento não nasce de falta de inteligência. Nasce de um vício estrutural: decidir antes de enxergar.

A rotina jurídica empurra o sócio para a reatividade. O telefone toca, o cliente pressiona, a equipe pede orientação, a pauta muda, o prazo vence. O ciclo se repete até virar cultura. E quando a cultura se estabelece, o sócio começa a tomar decisões rápidas, porém rasas.

O curioso é que esses escritórios têm bons profissionais, boa reputação e boa entrega técnica.

O problema não é jurídico.

O problema é estratégico.

A miopia silenciosa que consome tempo e margem

Quando o sócio decide sem enxergar, três efeitos aparecem:

1. As decisões ficam inconsistentes.

Um dia é uma diretriz. No dia seguinte, é outra. A equipe se adapta, mas não avança. Não evolui. Não fica autônoma.

2. A operação jurídica vira um campo de microcrises.

Cada escolha mal calibrada gera retrabalho, desgaste ou duplicidade de esforço. Tempo, dinheiro e energia jogados fora.

3. O escritório perde competitividade.

Enquanto discute o que fazer na semana, o mercado se move no mês. E, ao invés de fazer poeira, o escritório come poeira.

Essa miopia não se resolve com mais reuniões, mais relatórios ou mais ferramentas. Ela só se resolve com uma mudança de abordagem: menos impulso, mais leitura.

O que falta não é controle. É método de interpretação

Todo escritório tem informações: números, feedbacks, tendências, dados de clientes, reclamações, resultados financeiros.

O que falta é uma lógica para transformar tudo isso em clareza estratégica.

O sócio precisa responder três perguntas antes de decidir:

1. O que está mudando lá fora?

Sinais políticos, sociais, econômicos, tecnológicos e comportamentais que já afetam a advocacia.

2. O que isso significa para o meu escritório?

Como essa mudança atinge o modelo de negócio, a operação, a cultura e os serviços.

3. Qual é a ação estratégica correta?

O que fazer agora, o que preparar para depois e o que investigar para o futuro.

Sem esse filtro, o escritório só reage.

Com esse filtro, o escritório passa a prever.

Por que a maioria dos sócios não enxerga bem?

Porque foram treinados para resolver, não para observar.

A formação jurídica valoriza resposta e reação, não diagnóstico.

No ambiente de pressão, quem “decide rápido” é visto como líder.

E, no curto prazo, isso funciona.

Mas no longo prazo, vira um atraso.

Decisão sem contexto vira gasto, ruído e desgaste.

É por isso que alguns escritórios patinam mesmo com boa equipe.

E é por isso que outros, menores e discretos, crescem de forma surpreendente: eles enxergam o que vem antes.

A virada de chave: Enxergar antes para decidir certo

A mudança começa quando o sócio adota três elementos simples:

1. Radar de sinais

Organizar o que está acontecendo no mundo e como isso chega ao jurídico.

Sem isso, o sócio fica refém da opinião da semana.

2. Hipóteses estratégicas

A lógica “Se X acontecer, então faremos Y”.

Tira o peso da intuição e dá precisão às escolhas.

3. Sprints de 90 dias

As decisões deixam de ser isoladas e passam a seguir uma trilha de execução clara.

Quando o sócio vê primeiro, decide melhor.

Quando decide melhor, o escritório cresce com menos fricção.

E quando a estratégia vira hábito, a operação respira.

O escritório que vence não é o que decide rápido

É o que decide certo.

A advocacia está ficando mais competitiva, mais técnica, mais digital e mais exigente.

Sócios que seguem operando no modo “resolver o dia” começam a ficar para trás.

Um escritório forte não nasce de mais horas trabalhadas.

Nasce de sócios que enxergam antes, evitam erros óbvios, escolhem o caminho com precisão e mantêm o foco no que realmente importa.

A diferença entre estagnação e crescimento está no primeiro passo: deixar de decidir no escuro.

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Colunista

Lara Selem é advogada, professora, escritora, conselheira consultiva, advisor e mentora especialista em Gestão Legal, Sociedades de Advogados e Planejamento Estratégico para a Advocacia. É membro da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB. Foi presidente da Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB (2019-2021). Participa ativamente do Comitê de Administração e Ética Profissional (CADEP) do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (CESA). Membro da Association of Legal Administrators (ALA) desde 2009. Coordenadora científica do MBA Internacional em Gestão de Escritório de Advocacia (Faculdade Baiana de Direito e Gestão). Autora de 20 obras sobre gestão de escritórios de advocacia.