PI Migalhas

Aprendendo a citar e a parafrasear em seus trabalhos acadêmicos sem violar direito de autor

Aprendendo a citar e a parafrasear em seus trabalhos acadêmicos sem violar direito de autor.

24/4/2017

Luciano Andrade Pinheiro e Carolina Diniz Panzolini

Alunos de graduação ou pós-graduação de qualquer área do conhecimento têm uma recorrente dificuldade no momento de fazer citações em seus trabalhos acadêmicos. Afora a necessidade de seguir as famosas regras da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), invariavelmente se percebe a pouca atenção da forma de fazer uma citação ou uma paráfrase sem infringir o direito de autor.

Fixemos a seguinte premissa antes de explicar o que é uma citação e dar um exemplo de como se utilizar desse recurso sem ultrapassar a fronteira da legalidade: o direito de autor, apesar de ser exclusivo, não é absoluto. A lei impôs limitações ao seu exercício. Uma dessas limitações é justamente a possibilidade de qualquer pessoa usar as palavras do autor, sua composição para fins de estudo ou crítica.

A lei não diz qual o tamanho aceitável de uma citação. Diz apenas que a citação deve ter medida justificada para atingir o fim de crítica ou estudo. A doutrina, entretanto, afirma que uma citação dentro dos padrões de legalidade é aquela que se retirada do texto, esse mesmo texto permanece coerente. Contrario sensu, uma citação ilegal ou um abuso do direito de citar ocorre quando, retirada a citação, o texto perde coerência.

Veja esse exemplo de citação legal com os comentários:

Não pode e não deve o Estado decretar a oficialização de um princípio religioso, filosófico ou científico, devendo, pelo contrário, consagrar a liberdade e a diversidade religiosa, obrigando-se a respeitar a diversidade de cultos e credos.

Se o Estado afirma ou nega, reconhece ou repudia princípios religiosos ou filosóficos, afastar-se da neutralidade que deveria ter e, certamente, não irá conseguir impor o seu sistema ou a sua teoria, senão pela distorção de toda a sociedade.

Rui Barbosa celebrou:

"Vejo a Ciência que afirma Deus; vejo a Ciência que prescinde de Deus; vejo a Ciência que proscreve Deus; e entre o Espiritualismo, o Agnosticismo, o Materialismo, muitas vezes se me levanta da razão esta pergunta: Onde está a Ciência? A mesma névoa, que a princípio se adensara sobre as inquietações do crente, acaba por envolver o orgulho do sábio. A mesma dúvida, que nos arrastara das tribulações da fé ao exclusivismo científico, pode reconduzir-nos do radicalismo científico à placidez da fé."

Assim, age bem o Estado quando se mantém laico, garantindo a liberdade de crença e de culto religioso, os quais estão assentados nos princípios e ideais de liberdade e igualdade.

Autor: Eduardo Lycurgo Leite no texto Assombrando o Direito Autoral

BARBOSA, Rui apud Miguel Timponi in A Psicografia ante os Tribunais: o caso Humberto de Campos, 6ª edição, Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1999, p. 16.

Citação legal

Percebemos claramente que, retirado o trecho entre aspas, o texto não perde coerência.

A citação de Rui Barbosa serviu para apoiar aquilo que o autor pretendia explorar com seu texto.

Agora compare com esta citação:

Sobre os direitos conexos, Delia Lypsyc, em sua obra Derecho de Autor y derechos conexos, afirma que:

"La protección de las obras está sujeta a los siguientes criterios generales: - el derecho de autor protege las creaciones formales y no las ideas; la originalidad (o individualidad) es condición necessaria para la protección; la protección no depende del valor o mérito de la obra, de su destino o de su destino o de su forma de expresión; - la proteccion no está sujeta al cumplimiento de formalidades."

Nada mais há a dizer sobre o tema, posto que as palavras da nobre professora Delia Lypsyc são suficientes para esgotar o assunto. Passaremos, então, para o próximo capítulo.

LIPSYC, Delia; Derecho de autor y derechos conexos, Buenos Aires: Unesco, Cralc Zavalia, 1993, p. 61/62

Abuso no direito de citar

Note que o tamanho da citação é pequeno, mas o texto perde coerência se retirado o trecho entre aspas.

O estudante é obrigado a mencionar, na citação, uma fonte, ou seja, dizer quem é o autor e de que obra aquele trecho foi retirado. Além de ser cientificamente correto, a Lei de Direito Autoral assim determina. Isso se traduz no respeito à paternidade da obra, que é um direito imaterial do criador intelectual.

Existem basicamente dois tipos de citação. A primeira é a citação direta, aquela que o aluno usa as aspas, transcreve literalmente as palavras do autor, puxa uma nota de rodapé e indica o nome, a título, a editora e o ano de publicação da obra. Importante lembrar que qualquer alteração no texto do autor torna a citação direta ilegal, porque aquele que cita sem respeitar a forma com a qual a obra foi concebida viola a integridade da obra, que é outro direito imaterial do criador intelectual.

A segunda forma de citação é chamada de citação indireta. O aluno não utiliza as aspas, lê o que o autor disse, compreende o conteúdo e faz uma paráfrase. A nota continua sendo obrigatória.

A escolha do tipo de citação vai do estilo de cada aluno. Não há uma regra para isso. A preferência dos orientadores e avaliadores é pela citação indireta. O texto fica mais fluido e limpo. O leitor saberá exatamente o que o aluno disse sobre cada tema e não perde as referências, que podem ser encontradas nas notas de rodapé.

O texto originariamente escrito em outra língua tem, a priori, a mesma proteção concedida aos brasileiros. As mesmas regras de citação valem para os textos estrangeiros e os traduzidos. Nestes últimos, a menção do nome do tradutor também é obrigatória, porque há criação intelectual na tradução.

Voltando à citação indireta, a boa e legal paráfrase envolve leitura, compreensão e expressão. Há, na paráfrase, um esforço intelectual criativo em reescrever, dando forma diversa, a um conteúdo ou ideia posta por outro autor. Se o aluno pega um texto de um determinado autor, troca palavras por sinônimos, inverte a ordem das frases estará plagiando, não estará, por conseguinte, fazendo uma paráfrase.

A diferença entre a paráfrase e o plágio é evidente. Na primeira o aluno compreende e reescreve um conteúdo. No plágio literário há um elemento volitivo de dissimular, de tomar para si um texto que não é seu. O plagiador tenta enganar o leitor. Diz ao leitor que o texto que ele apresenta é de sua criação, quando na realidade trata-se de uma cópia fiel ou disfarçada.

Exemplo de plágio e de paráfrase:

Texto original

Paráfrase

Plágio

Os antigos exerciam a liberdade nos debates da agora, na efetiva determinação dos assuntos políticos da cidade. Os modernos fizeram por sua vez uma nova história para a liberdade. Ergueram, em face do Absolutismo e para sua ruína, a barreira dos direitos fundamentais dos indivíduos. Isto fizeram os Iluministas no plano abstrato do pensamento, enquanto as revoluções e seu constitucionalismo fizeram no plano concreto da prática política, indissociáveis num único momento histórico1.

A liberdade para os antigos era associada à ideia de democracia. A participação do cidadão no processo político era sinônimo do ser livre. Na modernidade, a liberdade está associada a direito fundamental, ideal iluminista tornado concreto pelos constitucionalistas.

Os antigos debatiam na agora e isso para eles era a liberdade. Uma nova ideia de liberdade foi feita pelos modernos. Criaram os direitos fundamentais para combater e destruir o absolutismo. Os iluministas pensaram os direitos fundamentais, enquanto as revoluções e seu constitucionalismo tornaram-no efetivo.

No momento que for fazer uma citação, para não entrar na ilegalidade, lembre-se do que diz o art. 46, da Lei de Direito Autoral. Cite para fins de estudo ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, sempre indicando nome do autor e a origem da obra.

__________

1 RIBEIRO, Luís Antônio Cunha. Princípio Constitucional da Liberdade. A Liberdade dos Antigos, a Liberdade dos Modernos e a Liberdade dos Ainda mais Modernos. In: PEIXINHO, Manoel Messias et ali. Os Princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.

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Colunista

Luciano Andrade Pinheiro é advogado. Graduado pela Universidade Federal da Bahia. Professor de Direito Autoral. Autor de artigos jurídicos. Palestrante. Perito judicial em propriedade intelectual. Foi assessor de técnica legislativa na Câmara dos Deputados, diretor adjunto da Escola Superior da Advocacia da OAB/DF e vice-presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Brasil/DF.