O ano de 2025 trouxe à baila o projeto de Reforma do Código Civil - PL 4/25 (PL 4-2025), de autoria do Senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Foi instituída a Comissão Temporária (CTCIVIL) para examinar o PL 04-2025, na forma do art. 374 do Regimento Interno do Senado Federal (RISTF), cuja relatoria foi atribuída ao Senador Veneziano Vital do Rego (MDB-PB).1
Lembra-se que o PL 4-2025 é fruto do belíssimo trabalho realizado em 2024 pela Comissão de Juristas presidida pelo Ministro Luis Felipe Salomão e pelo Ministro Marco Aurélio Belizze, ambos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que entregaram ao então Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, o Anteprojeto de Reforma do Código Civil.
Com este espírito democrático e de diálogo, o Senado Federal, por meio da iniciativa dos Senadores Rodrigo Pacheco, Veneziano Vital do Rêgo e Carlos Portinho realizaram, realizam e realizarão reuniões e audiências públicas na CTCIVIL, cuja primeira reunião ocorreu em 23/9/2025.2
A Presidência do Senado Federal designou para compor a CTCIVIL os(as) seguintes Senadores(as): Titulares: Veneziano Vital do Rêgo, Efraim Filho, Soraya Thronicke, Rodrigo Pacheco, Otto Alencar, Flávio Arns, Marcos Rogerio, Carlos Portinho, Weverton, Fabiano Contarato e Tereza Cristina; Suplentes: Eduardo Braga, Sergio Moro, Zequinha Marinho, Ângelo Coronel, Omar Aziz, Chico Rodrigues, Eduardo Gomes, Astronauta Marcos Pontes, Augusta Brito, Randolfe Rodrigues e Laércio Oliveira.3
Em 25.09.2025 foi aberto o prazo para as emendas dos(as) senadores(as) ao PL 4-2025 e, em 01.10.2025, houve a prorrogação pelo quádruplo regimental dos prazos aplicados à CTCIVIL, com as emendas podendo ser apresentadas até 03.03.2026, os relatórios parciais até 30.04.2026, o relatório geral até 29.05.2026 e o Parecer Final da CTCIVIL até 29.06.2026.4
Em 09.10.2025 foi realizada a 3ª reunião da CTCIVIL e a 1ª Audiência Púbica para debater a importância da reforma do Código Civil. No dia 16.10.2025 foi realizada a 4ª reunião da CTCIVIL e a 2ª Audiência Púbica para debater a Parte Geral e o Direito Digital na proposição de reforma do Código Civil. Em 23.10.2025 foi realizada a 5ª reunião da CTCIVIL e a 3ª Audiência Púbica para debater a Parte Geral e o Direito Digital na proposição de reforma do Código Civil.5
Em 06.11.2025 e em 13.11.2025 foram, respectivamente, realizadas a 5ª e a 6ª reuniões da CTCIVIL e a 4ª e a 5ª Audiências Púbicas para debater o direito obrigacional e contratual na proposição de reforma do Código Civil.6 A responsabilidade civil foi debatida nas Audiências Públicas ocorridas em 27.11.2025 e 11.12.2025, cujos diálogos sobre o tema serão retomados em fevereiro de 2026. No dia 04.12.2025 houve audiência púbica para debater o Direito Digital no PL 04-2025 e sua relação com a Inteligência Artificial.7 Serão marcadas pela CTCIVIL, a partir de fevereiro de 2026, audiências públicas para o debate acerca do direito das coisas, do direito empresarial, do direito de família e de sucessões.
Nos interessa abordar neste pequeno texto alguns aspectos hauridos das audiências públicas ocorridas na CTCIVIL sobre direito contratual nos dias 06.11.2025 e 13.11.2025, cuja participação ocorreu com as seguintes pessoas:
06/11/2025 CTCIVIL - Comissão Temporária para examinar o Projeto de Lei n° 4, de 2025 (Art. 374 RISF)
Ação: Na presente data, foi realizada a 6ª reunião da Comissão, oportunidade na qual foi realizada a 4ª Audiência Pública, com o objetivo de discutir temas relativos ao Direito das Obrigações e aos Contratos. Participaram da audiência:
1. José Fernando Simão, professor associado da Universidade de São Paulo (USP);
2. Carlos Eduardo Elias de Oliveira, Consultor Legislativo do Senado Federal;
3. Cláudia Lima Marques, professora titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS);
4. Angélica Lúcia Carlini, advogada e professora da Escola Paulista de Direito;
5. Eroulths Cortiano Júnior, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR);
6. Rosa Maria de Andrade Nery, relatora-geral da Comissão de Juristas para atualização do Código Civil;
7. Flávio Tartuce, relator-geral da Comissão de Juristas para atualização do Código Civil.
13/11/2025 CTCIVIL - Comissão Temporária para examinar o Projeto de Lei n° 4, de 2025 (Art. 374 RISF)
Ação: Na presente data, foi realizada a 7ª reunião da Comissão, oportunidade na qual foi realizada a 5ª Audiência Pública, com o objetivo de dar continuidade à discussão de temas relativos ao Direito das Obrigações e aos Contratos.
Participaram da audiência:
1.Paulo Roque Khouri, advogado e professor do IDP;
2. Judith Martins-Costa, representante da Confederação Nacional da Indústria;
3. José Roberto de Castro Neves, professor da Fundação Getúlio Vargas, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e advogado;
4. Rinaldo Mouzalas, professor-adjunto da Universidade Federal da Paraíba e advogado;
5. Clarissa Medeiros Cardoso, secretária da Comissão Especial de Direito Civil do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
6. Guilherme Carneiro Monteiro Nitschke, Vice-Presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem;
7. Daniel Pires Novais Dias, professor da Fundação Getúlio Vargas;
8. João Pedro Oliveira de Biazi, professor e advogado;
9. Micaela Barros Barcelos Fernandes, professora e advogada;
10. Rodolpho Barreto Sampaio Júnior, Procurador do Estado de Minas Gerais e professor-adjunto da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais;
11. Rodrigo Cavalcante Moreira, advogado;
12. José Henrique Barbosa Moreira, advogado, professor e representante da Associação Nacional de Certificação Digital
13. Pedro Zanette Alfonsin, advogado;
14. Cristiano de Souza Zanetti, livre-docente da Universidade de São Paulo e advogado;
15. Rosa Maria de Andrade Nery, relatora-geral da Comissão de Juristas para atualização do Código Civil;
16. Flávio Tartuce, relator-geral da Comissão de Juristas para atualização do Código Civil.
Percebe-se a presença de pessoas nas referidas audiências públicas que fizeram parte da Comissão de Juristas que elaborou o Anteprojeto de Reforma do Código Civil, bem como de pessoas que não participaram de tal comissão e que criticaram, positivamente e negativamente, o PL 04-2025, o que concretiza um debate democrático e que escuta todas as correntes acerca do assunto. Mais um ponto positivo à CTCIVIL instituída pelo Senado Federal, inclusive pelo fato de as reuniões e de as audiências públicas serem transmitidas pela TV Senado.
Além disso, se verifica a constante presença de Senadores(as) que fazem parte da CTCIVIL, mormente do Senador Carlos Portinho, que recebe em seu gabinete pessoas que concordam e que discordam de pontos do PL 04-2025, cujo espírito deve ser de contribuição para a melhora do texto e não de arquivamento do PL, como foi proposto por Cristiano de Souza Zanetti na audiência pública ocorrida em 06.11.2025. Tem razão o Senador Carlos Portinho quando afirmou na audiência pública de 09.10.2025 que o PL 04-2025 está aberto ao debate, mas que “não devemos derrubar colunas e sim paredes” no que toca à melhoria do texto do mencionado PL.
Nessa linha de diálogo e de proposições contributivas para a melhor redação do texto do PL 4-2025, lembra-se que:
(i) o Anteprojeto de Reforma do Código Civil teve o objetivo de revisar e de atualizar a referida codificação, a fim de que se mantivesse sua unidade sistemática. A subcomissão de Contratos foi composta por expoentes do Direito Contratual brasileiro, como membros do IBDCONT, como as Professoras Angélica Carlini e Claudia Lima Marques, os Professores Carlos Eduardo Elias e o Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk, cuja relatoria geral ficou submetida à Professora Rosa Nery e ao Professor Flávio Tartuce, este tendo sido o 1º Presidente do IBDCONT Nacional.
(ii) no Relatório da subcomissão de contratos se percebe que o texto proposto “buscou alinhar o Livro de Contratos do Código Civil às transformações sociais, econômicas e culturais desses últimos tempos. Cuidou-se de seguir a tradição do Direito Civil, em prestigiar os institutos milenarmente amadurecidos, sem, porém, fechar as portas para novos arranjos e comportamentos contratuais da sociedade. Também a Subcomissão velou para decantar, no texto legal, aquilo que a jurisprudência, a doutrina e a prática quotidiana vêm ostentando”.8
(iii) a observância da experiência jurídica estrangeira passou pela “jurisprudência, em Códigos Civis, em instrumentos de soft law (como os princípio Unidroit, o Draft Common Frame of Reference (DCFR), leis modelos do Uncitral) e em normas da União Europeia, com inclusão do Digital Services Act, que alterou a Diretiva Europeia sobre comércio eletrônico (Diretiva 200/31/EC)”.9
(iv) a subcomissão de contratos destacou as principais alterações pensadas para o Código Civil brasileiro:
A autonomia privada é prestigiada como um dos faróis do Direito Contratual, por espelhar o direito dos cidadãos em se autodeterminarem. Todavia, notadamente nos casos de contratos não paritários, o Código Civil intervém para evitar abusos de direito. Nesse sentido, em diversas ocasiões, o texto do Código faz a distinção entre os contratos paritários e os não paritários, com o objetivo de evitar abusos nestes últimos (ut arts. 421-C; 421-D; 423; 532; 599, § 2º; 603, parágrafo único; 620, parágrafo único; 629, parágrafo único; 725, § 1º; 734, parágrafo único; 757-A; 762; 766, § 2º; 768, § 2º; 771, § 5º; 771-C; 786, §§ 2º e 3º; e 946-A).
Também é reconhecido que a autonomia privada não pode ser exercida em agressão à função social, sob pena de censura do ordenamento, inclusive, quando for o caso, por meio da nulidade (art. 421, § 2º).
Atenta à complexidade das relações interpessoais e de mercado, a Comissão reconhece as diferentes funções a que os contratos podem se prestar, além de atentar para as redes contratuais altamente sofisticadas. Sob essa ótica, o texto sugerido respeita os regimes jurídicos das leis especiais para determinadas relações contratuais, inclusive o regime mais livre e menos intervencionista dos contratos empresariais (arts. 421-A, 421-B, 421- E e 421-F). Também se abrem maiores espaços para o exercício da liberdade contratual, com permissão expressa a fideicomissos por ato entre vivos, sempre, porém, respeitados os limites das normas de ordem pública (art. 426- A).
A boa-fé mantém seu papel de destaque no direito contratual, com eficácia pré-contratual, contratual e pós-contratual a guiar as partes e a credenciar determinadas reações do Direito, como as provenientes do inadimplemento (arts. 422 e 422-A).
A aderência das regras contratuais às atuais tendências culturais e sociais foi um alvo constante dos trabalhos da Comissão. Disso resultou, por exemplo, a permissão expressa para que os nubentes possam traduzir sua vontade com maior liberdade nos pactos pré-nupciais ou pós-nupciais, inclusive com eventual renúncia recíproca e antecipada a direitos hereditários. Há, porém, limites, sempre em razão da preocupação com a parte mais vulnerável em relações contratuais não paritárias, a exemplo da presunção relativa de que a renúncia à herança não alcança o direito real de habitação ao viúvo (art. 426, §§ 1º a 5º).
Não se ignora a digitalização do quotidiano das pessoas, com o aumento exponencial da formalização dos contratos de modo remoto. Além das bases jurídicas lançadas no Livro de Direito Digital, o Livro de Contratos também respalda juridicamente essa tendência desmaterializada de contratar. Dá-se respaldo jurídico, inclusive, aos smart contracts (contratos inteligentes), aos contratos de prestação de serviços e de acesso a conteúdos digitais, bem como aos meios de interação digital (arts. 428, § 1º; 435-A; 609-A a 609-G; 744; 759; 785; e 817-A).
O tratamento jurídico para abalos supervenientes das bases contratuais também foi aprimorado. A resolução e a revisão contratual atravessam questões, como a avaliação dos riscos normais da contratação (art. 478), a frustração do fim do contrato (art. 480-A), o respeito a eventual cláusula de hardship (art. 480), a quebra antecipada do contrato (art. 477-A), a exceção de inseguridade (art. 477) e outras questões.
O inadimplemento contratual alinha-se às tendências mais modernas, com desjudicialização na comprovação de cláusula resolutiva expressa (art. 474) e com o adimplemento substancial (art. 475-A).
Contratos típicos de elevada aplicação prática são atualizados à luz das transformações sociais.
Por exemplo, na doação conjuntiva feita a pessoas casadas, o direito de acrescer não será mais automático; dependerá de previsão expressa; tudo em respeito à realidade atual de famílias reconstituídas (art. 551).
A fiança é robustecida em seu regime jurídico. Garante-se expressamente o direito do fiador em agir como substituto processual e suprir a morosidade do credor na excussão dos bens que ainda subsistem em nome do devedor (art. 836-B). Obriga-se o credor a manter o fiador atualizado acerca de inadimplementos do devedor, tudo com o objetivo de não frustrar a esperança do fiador em ainda encontrar bens penhoráveis do devedor (art. 836-A).
Disciplina-se o Contrato de Distribuição Empresarial (art. 721- A) como um contrato típico autônomo, em atenção à sua elevada importância na prática empresarial.
Em suma, os trabalhos da Comissão de Atualização do Código Civil foram baseados em juízos de prudência e cautela, em um espírito de continuidade das produções jurisprudenciais e doutrinárias que vêm acudindo os novos reclamos sociais. A sociedade e o mercado encontrarão, na Reforma do Livro de Contratos, mais segurança jurídica para a formalização jurídica da vontade dos cidadãos e dos agentes de mercado, em total sintonia com os primados do Estado de Direito.10
(v) tem razão Carlos Pianovski ao asseverar que a reforma visa atualizar o Código Civil, a fim de aprimorá-lo às contingências que a sociedade brasileira necessita na ambiência do Direito Civil e Empresarial, sendo salutar ouvir a sociedade e todos os setores que se propõem a verificar o PL 4-2025 de forma leal e contributiva para o aperfeiçoamento do PL 04-2025.11
(vi) há espírito democrático e diálogo no Senado Federal, por meio das reuniões e das audiências públicas na CTCIVIL, iniciadas em 24.09.2025.12
Destaco também a presença de diversos membros do IBDCONT nas diversas audiências púbicas da CTCIVIL e queria elencar alguns pontos das falas do atual Presidente do IBDCONT, o Prof. Dr. Eroulths Cortiano Júnior, na audiência pública de 06.11.2025,13 na qual pediu a aprovação de dispositivos propostos no PL 04-2025, a saber:
a) art. 426 do Código Civil, cuja redação proposta no PL 04-2025 é:
Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.
§ 1º Não são considerados contratos tendo por objeto herança de pessoa viva, os negócios:
I - firmados, em conjunto, entre herdeiros necessários, descendentes, que disponham diretivas sobre colação de bens, excesso inoficioso, partilhas de participações societárias, mesmo estando ainda vivo o ascendente comum;
II - que permitam aos nubentes ou conviventes, por pacto antenupcial ou convivencial, renunciar à condição de herdeiro.
§ 2º Os nubentes podem, por meio de pacto antenupcial ou por escritura pública pós-nupcial, e os conviventes, por meio de escritura pública de união estável, renunciar reciprocamente à condição de herdeiro do outro cônjuge ou convivente.
§ 3º A renúncia pode ser condicionada, ainda, à sobrevivência ou não de parentes sucessíveis de qualquer classe, bem como de outras pessoas, nos termos do art. 1.829 deste Código, não sendo necessário que a condição seja recíproca.
§ 4º A renúncia não implica perda do direito real de habitação previsto o no art. 1.831 deste Código, salvo expressa previsão dos cônjuges ou conviventes.
§ 5º São nulas quaisquer outras disposições contratuais sucessórias que não as previstas neste código, sejam unilaterais, bilaterais ou plurilaterais.
§ 6º A renúncia será ineficaz se, no momento da morte do cônjuge ou convivente, o falecido não deixar parentes sucessíveis, segundo a ordem de vocação hereditária.
Eroulths Cortiano Júnior entendeu que o dispositivo permite que titulares do patrimônio e herdeiros(as) possam gerir com maior autonomia os bens que são titulares ou que receberão com o falecimento do(a) titular do patrimônio, com limites expressos em tais disposições contratuais com efeitos post mortem. Concorda com os limites textuais postos no art. 426 do PL 04-2025, pois evita, por exemplo, exclusões de gênero em contratos com eficácia post mortem.14
b) art. 426-A na proposição do PL 04-2025:
Art. 426-A. É admitido o fideicomisso por ato entre vivos, desde que não viole normas cogentes ou de ordem pública.
Eroulths Cortiano Júnior afirmou que o PL 04-2025 foi “bem porque recupera o fideicomisso”, visto que este “permite o autor da herança transmitir o seu patrimônio ou parte dele para uma pessoa que posteriormente encaminhará a outra”. Com a proposta do art. 426-A do PL 04-2025, o fideicomisso deixa de ser um instituto restrito à sucessão causa mortis para se tornar também um instituto que pode ser utilizado em vida pelo(a) titular do patrimônio. É uma excelente solução para a gerência do patrimônio do(a) titular quando este(a) quiser que uma terceira pessoa o faça.15
c) art. 478 do PL-04-2025 na proposição do PL 04-2025:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, havendo alteração superveniente das circunstâncias objetivas que serviram de fundamento para a celebração do contrato, em decorrência de eventos imprevisíveis que gerem onerosidade excessiva para um dos contratantes e que excedam os riscos normais da contratação, o devedor poderá pedir a sua revisão ou a sua resolução.
§ 1º Para a identificação dos riscos normais da contratação, deve-se considerar a sua alocação, originalmente pactuada.
§ 2° Há imprevisibilidade do evento quando a alteração superveniente das circunstâncias ou dos seus efeitos não poderiam ser razoavelmente previstos por pessoa de diligência normal ou com a mesma qualificação da parte prejudicada pela onerosidade excessiva e diante das circunstâncias presentes no momento da contratação.
§ 3° A revisão se limitará ao necessário para eliminar ou mitigar a onerosidade excessiva, observadas a boa-fé, a alocação de riscos originalmente pactuada pelas partes e a ausência de sacrifício excessivo às partes.
§ 4° Não se aplica o disposto neste artigo para a mera impossibilidade econômica de adimplemento decorrente de fato pertinente à esfera pessoal ou subjetiva de um dos contratantes.
§ 5° O disposto nesta seção não se aplica aos contratos de consumo, cuja revisão e resolução se sujeitam ao Código de Defesa do Consumidor.
Isso porque Eroulths Cortiano Júnior ratifica a ideia de que a redação proposta no PL 04-2025 privilegia uma possibilidade de intervenção por mínima e excepcional por parte do Poder Judiciário em cada caso concreto. A proposição trazida no PL 04-2025 é consonante com as melhores práticas realizadas no Direito Civil contemporâneo ocidental, segundo Eroulths Cortiano Júnior, como na Itália, na França, na Alemanha, etc.16
Percebe-se que a proposição quanto ao art. 478 do CC é adequada, uma vez que observa a alocação de risco pactuada pelas partes, o que pode inibir demandas revisionais perante o Poder Judiciário e em Juízo Arbitra, como se infere do § 1º do art. 478 do CC acima. Além disso, destaca Pianovski:
Construção de mecanismo de revisão e resolução contratual7 por fatos supervenientes (art. 478 e 479) que acolhe o conceito técnico de “circunstâncias objetivas que serviram de fundamento para a celebração do contrato”, (Grundlage)8 sem, contudo, dispensar a necessidade de demonstração da imprevisibilidade (aferível em concreto, conforme a “qualificação da parte prejudicada pela onerosidade excessiva e diante das circunstâncias presentes no momento da contratação). Além disso, o mesmo dispositivo projetado exige que a alteração de circunstâncias exceda os riscos normais do negócio, deixando claro que “para a identificação dos riscos normais da contratação, deve-se considerar a sua alocação, originalmente pactuada”, o que pretende assegurar o caráter excepcional da revisão contratual por fatos supervenientes, limitando-a ao necessário para “mitigar a onerosidade excessiva, observadas a boa-fé, a alocação de riscos originalmente pactuada pelas partes e a ausência de sacrifício excessivo às partes”;17
A própria redação do § 5º do art. 478 do CC diferencia os contratos civis e empresariais dos contratos de consumo, sendo mais um exemplo da não consumerização do direito contratual18 na reforma do CC. Como já foi feito no art. 421-C do CC com a distinção entre contratos civis e empresariais simétricos e paritários dos contratos por adesão às condições gerais contratuais postos nos arts. 423 e 424 do CC. Inclusive o art. 421-F é expresso: “Art. 421-F. Aos contratos empresariais aplicam-se os princípios que estão na descritos no art. 966-A deste Código, no que couber.”
Não obstante tudo isso é importante refletir sobre os ajustes que devam ser feitos no texto, estudando-se todas as falas advindas das audiências públicas, sempre no espírito de melhora do texto proposto, sempre com espírito construtivo e propositivo para que a Reforma do Código Civil possa nos legar o melhor texto possível para a atual conjuntura fático-jurídica e política que estamos imersos.
Esta construção conjunta e de melhora do texto é vista por quem participou da aludida Comissão de Juristas, bem como por muitas pessoas que dela não participaram, como sempre sublinham em suas falas nas audiências públicas a Professora Rosa Nery e o Professor Flávio Tartuce, Relatora e Relator Gerais da Comissão de Juristas retrocitada.
Desejo às pessoas boas festas e um excepcional 2026 e que a Reforma do Código Civil, com os ajustes que se fizerem necessários, seja aprovada para que possamos ter um Código Civil mais adequado ao presente e ao porvir, sendo relevante salientar que o papel da literatura jurídica e dos Tribunais não podem ser desprezados na construção de um Direito Privado à serviço da vida.
__________
1 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui.. Acesso em 08dez2025.
2 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
3 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
4 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
5 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
6 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
7 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
8 Texto do Anteprojeto está disponível aqui: Acesso em 8dez2025.
9 Texto do Anteprojeto está disponível aqui: Acesso em 8dez2025.
10 Texto do Anteprojeto está disponível aqui: Acesso em 12dez2024.
11 RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. O Direito Contratual no anteprojeto de revisão e atualização do Código Civil. Disponível aqui: Acesso em 8.dez.2025.
12 BRASIL. SENADO FEDERAL. Projeto de Lei nº 4, de 2025. Disponível aqui. As audiências públicas
13 BRASIL. SENADO FEDERAL. 6ª Reunião CTCIVIL. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
14 BRASIL. SENADO FEDERAL. 6ª Reunião CTCIVIL. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
15 BRASIL. SENADO FEDERAL. 6ª Reunião CTCIVIL. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
16 BRASIL. SENADO FEDERAL. 6ª Reunião CTCIVIL. Disponível aqui. Acesso em 08dez2025.
17 RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. O Direito Contratual no anteprojeto de revisão e atualização do Código Civil. Disponível aqui: Acesso em 8.dez.2025.
18 Sobre o tema veja: O Direito dos Contratos no Projeto de Reforma do Código Civil e o mito da "consumerização". Reforma do Código Civil. Disponível aqui: Acesso em 12dez25.