Ordem na Banca

O caos da tomada de decisão: Por que sócios inteligentes chegam a conclusões ruins

Sócios brilhantes também erram: decisões ruins na advocacia custam caro. Método, disciplina e análise do contexto são o caminho para escolhas certeiras.

17/12/2025

É um erro comum imaginar que só toma decisões equivocadas quem não tem experiência. Na prática, muitos dos piores equívocos estratégicos em escritórios são cometidos por sócios brilhantes, juridicamente preparados e tecnicamente impecáveis.

A inteligência jurídica não protege ninguém de uma decisão ruim. E isso acontece porque o problema não está no sócio. Está no ambiente.

A advocacia cria um sistema hostil para decisões de qualidade: excesso de informação, urgência constante, múltiplas pressões, pouco tempo para pensar e uma cultura que valoriza respostas rápidas, não análises profundas.

Nesse ambiente, até sócios altamente qualificados tomam decisões frágeis.

E o impacto é sempre maior do que parece.

Por que decisões ruins são tão comuns na advocacia?

Três fatores explicam o fenômeno:

1. Pressão por respostas imediatas

Clientes querem urgência. Equipe quer direção. Problemas chegam sem aviso.

O sócio, acostumado com a lógica do prazo, tende a responder antes de entender.

Decisão rápida parece liderança.

Mas muitas vezes é só precipitação.

2. Excesso de confiança na experiência

A experiência é valiosa, mas também cria vieses.

O sócio acredita que “já viu isso antes”, quando, na verdade, o contexto mudou completamente.

Setores híbridos, novos modelos de negócio, mudanças culturais e tecnologia tornam antigos padrões pouco confiáveis.

A experiência ajuda na técnica.

Mas pode atrapalhar na estratégia.

3. Falta de método na interpretação do contexto

O escritório até coleta informações, mas faz isso de maneira desconexa.

Ou seja: há dados demais e clareza de menos.

Sem método, a decisão vira um palpite sofisticado.

O custo de uma decisão mal calibrada

Ao contrário do que se pensa, decisões estratégicas erradas não apenas atrasam o escritório.

Elas criam efeitos colaterais difíceis de reverter:

  • Desmotivação da equipe;
  • Reestruturações desnecessárias;
  • Perda de clientes valiosos;
  • Investimentos mal direcionados;
  • Aumento de conflitos societários;
  • Desgaste emocional dos sócios;
  • Retrabalhos que se acumulam em cadeia.

Uma decisão mal pensada gera um problema que não existia.

E a operação inteira paga a conta.

O que o escritório precisa não é mais informação. É método.

O volume de dados nunca foi o problema.

O problema é a incapacidade de transformar informação em entendimento.

É aqui que conceitos como hipóteses estratégicas mudam o jogo.

A lógica é simples e precisa:

Se X acontecer, então faremos Y.

Essa estrutura elimina o improviso e força o sócio a pensar em cenários.

Tira a decisão do campo emocional e coloca no campo racional.

Hipóteses:

  • Reduzem conflito;
  • Orientam escolhas;
  • Estabilizam expectativas;
  • Diminuem erros;
  • Facilitam alinhamento entre sócios.

É um método enxuto para decisões complexas.

Decisão não é talento. É disciplina.

Uma boa decisão nasce de três pilares:

1. Leitura do ambiente (sinais evidentes e inevidentes)

Pestel, tecnologia, arenas competitivas, tendências sociais, setores entrelaçados.

Sem essa leitura, o sócio decide olhando apenas para dentro.

2. Radar estratégico

Organiza o que importa agora, o que pode esperar e o que precisa ser investigado.

Evita decisões impulsivas, ajusta prioridades e acalma a mente.

3. Ambidestria + sprints de 90 dias

Transformam a decisão em rotina.

Para que ela não fique perdida em reuniões infinitas.

Sem esses três pilares, o escritório toma decisões tentando apagar fogo.

Com eles, o escritório decide como empresa competitiva.

Sócios inteligentes não precisam decidir mais.

Precisam decidir melhor.

Um escritório forte não se destaca pela quantidade de decisões que toma, mas pela qualidade delas.

A vida do sócio melhora quando as decisões deixam de ser urgentes e passam a ser deliberadas.

O ambiente melhora quando a equipe entende o porquê das escolhas.

A estratégia melhora quando a decisão deixa de ser um ato isolado e passa a ser parte de um sistema.

O caos só desaparece quando o sócio troca velocidade por clareza.

Decisão madura é decisão que respeita o contexto.

O futuro da advocacia seguirá marcado pela complexidade: tecnologia acelerada, clientes mais técnicos, setores híbridos e maior pressão competitiva. Sócios que insistirem em decidir no improviso vão errar mais, gastar mais e perder vantagem.

Sócios que decidirem com método vão economizar energia, evitar ruídos e construir um escritório muito mais forte.

Em um mercado assim, vencer não é decidir antes.

É decidir certo.

Colunista

Lara Selem é advogada, professora, escritora, conselheira consultiva, advisor e mentora especialista em Gestão Legal, Sociedades de Advogados e Planejamento Estratégico para a Advocacia. É membro da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB. Foi presidente da Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB (2019-2021). Participa ativamente do Comitê de Administração e Ética Profissional (CADEP) do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados (CESA). Membro da Association of Legal Administrators (ALA) desde 2009. Coordenadora científica do MBA Internacional em Gestão de Escritório de Advocacia (Faculdade Baiana de Direito e Gestão). Autora de 20 obras sobre gestão de escritórios de advocacia.

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