Reforma do Código Civil

O anteprojeto de atualização do Código Civil no Brasil

Texto analisa a evolução do Código Civil, destacando propostas de modernização jurídica para acompanhar as transformações sociais e tecnológicas.

10/1/2025

1. Introdução

As intensas mudanças na sociedade brasileira experimentadas ao longo do século XX, com modelos negociais e contratuais inovadores, passando pela engenharia genética, novos arranjos familiares com impactos no plano sucessório, a comunicação em tempo real proporcionada pela internet – agora disponível na palma da mão –, são apenas alguns poucos exemplos de fatos que indicam a necessidade de atualização das regras que regem as relações jurídicas no campo civil.

O texto atual do Código Civil, que substituiu o Código de 1916, é fruto do trabalho de uma Comissão de Juristas de nomeada - liderada por Miguel Reale -, reunida no distante ano de 1969. No contexto seguinte de abertura política e da Assembleia Nacional Constituinte, o projeto tramitou por anos no Congresso Nacional até ser aprovado e, por fim, sancionado em 2002.

Não obstante a plasticidade do Código Civil, bem como os reconhecidos e inovadores princípios da eticidade, operabilidade e boa-fé objetiva, o Diploma já foi alterado por 64 normas, havendo ainda mais de 50 propostas de modificação pendentes de apreciação.

Em recente artigo depositado na Biblioteca Digital do Senado Federal, relembrei o histórico da codificação civil no Brasil e o papel do Superior Tribunal de Justiça em sua interpretação, realçando a necessidade de atualização do Código de 2002.1

Nesse passo, por meio do Ato n. 11, de 2023, o Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, instituiu Comissão de Juristas com o propósito de revisar e atualizar tal diploma, destacando que o texto de 2002 trouxe muitos avanços, mas o Código Civil “é como uma roupa que precisa crescer junto com o corpo que veste”2.

A Comissão de Juristas, instalada em reunião realizada em 4 de setembro de 2023, composta ao final por 37 membros e 6 consultores voluntários – renomados civilistas, professores da academia, advogados, membros do MP, magistrados, profissionais reconhecidos no Brasil e no exterior –, em sessão solene de 17 de abril de 2024, no Plenário do Senado Federal, entregou o relatório final aprovado, que inclui o anteprojeto de lei de revisão e atualização do Código Civil.

Ao longo de 8 meses de trabalho, a Comissão enviou cerca de 400 ofícios a entidades representativas da sociedade civil, faculdades de direito, órgãos públicos e associações, com o objetivo de comunicar a abertura de prazo para sugestões, vindo 280 da sociedade civil, examinadas ao longo desse período, quando realizadas 4 audiências públicas, sem prejuízo de vários debates acadêmicos nas universidades e eventos jurídicos. Inúmeras contribuições de participação popular também chegaram pelo canal e-Cidadania.

A Comissão, nas quase 70 horas de trabalho em audiências públicas em todo o País, em reuniões científicas e seminários, criou grande interação entre os integrantes. Os ricos debates estão disponíveis no sítio do Senado Federal, inclusive com a participação de juristas argentinos que, recentemente, aprovaram nova legislação civil.3

2. Principais propostas de alteração

A ampla maioria das sugestões apresentadas no relatório final pela Comissão de Juristas está pautada na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça - STJ e do Supremo Tribunal Federal - STF, nos enunciados aprovados nas Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho da Justiça Federal - CJF, nas posições doutrinárias já sedimentadas, de modo a que o resultado reflita um conjunto de normas civis também para as gerações futuras, que terão de lidar com a atual transição da vida analógica para a digital.

No ponto, pesquisou-se amplamente a legislação comparada, posto que muitos países procedem, neste momento, a uma atualização de suas legislações civis, diante das exigências do mundo moderno.

Ademais, alguns outros vetores orientaram as propostas de atualização: a) assegurar maior autonomia de vontade das pessoas; b) promover a desjudicialização de vários atos e procedimentos; c) estímulo ao empreendedorismo e facilitação do ambiente de negócios d) garantir as alterações necessárias para atualização do texto, mas observado sempre o princípio da segurança jurídica.

Portanto, convém destacar algumas das principais sugestões contidas no referido anteprojeto de lei aprovado pelo relatório final dos trabalhos da Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil.

__________

Disponível aqui. A íntegra do texto está no sítio: Disponível aqui

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Colunistas

Flávio Tartuce é pós-doutor e doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUCSP. Professor Titular permanente e coordenador do mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD). Professor e coordenador do curso de mestrado e dos cursos de pós-graduação lato sensu em Direito Privado da EPD. Patrono regente da pós-graduação lato sensu em Advocacia do Direito Negocial e Imobiliário da EBRADI. Diretor-Geral da ESA da OABSP. Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito Contratual (IBDCONT). Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família em São Paulo (IBDFAMSP). Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico. Relator-Geral da proposta da reforma do Código Civil.

Luis Felipe Salomão é ministro do Superior Tribunal de Justiça. Corregedor Nacional de Justiça. Membro da Corte Especial do STJ. Presidente da comissão de juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil.

Marco Aurélio Bellizze é ministro do Superior Tribunal de Justiça. Membro da 3ª Turma. Membro da 2ª Seção. Membro da Comissão de Jurisprudência. Professor da Fundação Getúlio Vargas desde 2021. Coordenador Acadêmico da FGV/Exame de Ordem. Vice-presidente da comissão de juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil.

Rosa Maria de Andrade Nery é professora associada de Direito Civil da Faculdade de Direito da PUC/SP. Livre-Docente, doutora e mestre em Direito pela PUC/SP. Árbitra em diversas câmaras de arbitragem do Brasil. Foi Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo por 20 anos e desembargadora do Tribunal de Justiça o Estado de São Paulo por 15 anos. Titular da cadeira de número 60 da Academia Paulista de Direito. Professora do curso de graduação e de pós-graduação em Direito da PUC/SP e professora colaboradora do Centro Universitário Ítalo-Brasileiro. Relatora da proposta da reforma do Código Civil.