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Efeitos de Medida Provisória Rejeitada

Diante da rejeição, expressa ou tácita, de medida provisória, leva problema a questão de saber se prevalecem, ou não, os efeitos decorrentes da incidência das normas por ela veiculadas. Manifestou-se já o Supremo Tribunal Federal no sentido de que a rejeição, expressa ou tácita, da medida provisória, apaga inteiramente os seus efeitos do mundo jurídico. (Ag.Reg. na ADIn n. 365-8-DF, DJU de 15.3.91, I, p. 2.645). Não obstante o grande respeito que temos pelas decisões da Corte Maior, pensamos não ser esta a melhor interpretação do texto constitucional.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Atualizado em 18 de janeiro de 2010 17:05


Efeitos de Medida Provisória Rejeitada*

Hugo de Brito Machado**

Diante da rejeição, expressa ou tácita, de medida provisória, leva problema a questão de saber se prevalecem, ou não, os efeitos decorrentes da incidência das normas por ela veiculadas.

Manifestou-se já o STF no sentido de que a rejeição, expressa ou tácita, da medida provisória, apaga inteiramente os seus efeitos do mundo jurídico. (Ag.Reg. na ADIn 365-8-DF, DJU de 15.3.91, I, p. 2.645). Não obstante o grande respeito que temos pelas decisões da Corte Maior, pensamos não ser esta a melhor interpretação do texto constitucional.

A medida provisória rejeitada perde a eficácia, ou como preferimos, perde a vigência, desde a sua edição. É o que prescreve o parágrafo único do art. 62, da Constituição (clique aqui). À primeira vista pode parecer que ficam pura e simplesmente restabelecidas as normas revogadas pela medida provisória rejeitada, como se nada tivesse acontecido no ordenamento jurídico.

Ocorre que a Constituição atribui ao Congresso Nacional o dever de disciplinar as relações jurídicas decorrentes da medida rejeitada, o que implica afirmar a sobrevivência dessas relações jurídicas, a reclamarem disciplinamento. Se o Congresso não edita normas para tal fim, ter-se-á uma situação de pendência cuja perpetuação não é inadmissível. Preferível, pois, admitir que fica restabelecido o direito anterior.

Isto, porém, não significa admitir o desfazimento puro e simples daquelas relações jurídicas, e muito menos o surgimento de relações jurídicas que em face da medida provisória não teriam nascido. Em outras palavras, isto não quer dizer que se apaguem todos os efeitos jurídicos decorrentes da incidência da medida provisória não aprovada. Nem muito menos que as normas restabelecidas possam incidir plenamente sobre os fatos ocorridos durante o período de vigência da medida provisória rejeitada.

Cuida-se de delicada questão de direito intertemporal, para cujo equacionamento presta o princípio da segurança jurídica, e uma de suas formas de expressão, o princípio da irretroatividade das leis, valiosa contribuição.

Editada a medida provisória, que entra em vigor imediatamente, as normas com ela incompatíveis ficam revogadas condicionalmente. A revogação opera-se sob condição resolutória, consistente na conversão da medida provisória em lei. Não ocorrida a condição, isto é, não aprovada a medida provisória, a revogação deixa de existir, tal como se uma nova lei houvesse revogado a medida provisória.

A única diferença é que, não se tratando propriamente de revogação da medida provisória, mas de sua não convalidação, as normas que haviam sido por ela revogadas voltam a ter vigência. Não se pode fazer de conta que elas nunca tenham saído do ordenamento jurídico. Elas saíram. Foram revogadas. Voltam como normas novas. Reingressam no ordenamento jurídico como normas editadas na data em que perdeu vigência a medida provisória rejeitada. Aplicam-se aos fatos ocorridos durante o período de vigência da medida provisória rejeitada, porque esta perdeu a vigência desde a data de sua edição, mas não podem, essas normas reintroduzidas no sistema jurídico, alcançar a coisa julgada, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito, decorrentes da medida provisória rejeitada. A não ser assim, ter-se-á instaurado a mais completa insegurança jurídica.

É inadmissível o entendimento segundo o qual a rejeição, expressa ou tácita, da medida provisória, implica a reposição de tudo na situação anterior à sua edição. Se o Congresso Nacional deve disciplinar as relações jurídicas decorrentes da medida provisória não aprovada, é porque tais relações sobrevivem. Disciplinar tais relações não pode significar suprimi-las. E nesse disciplinamento, ou na omissão do Congresso, devem ser respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

As normas anteriormente revogadas, ou as normas editadas pelo Congresso Nacional para disciplinar as relações jurídicas decorrentes da medida provisória rejeitada, são normas novas no ordenamento. Elas não incidiram sobre os fatos ocorridos durante o período de vigência da medida provisória rejeitada. O princípio da segurança jurídica repele sejam a tais fatos aplicadas. A prescrição constitucional segundo a qual a medida provisória rejeitada perde sua eficácia (ou vigência, como preferimos), há de ser entendida no contexto da Constituição, que preserva, em nome da segurança jurídica, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, nos casos de normas que se devam aplicar a fatos do passado.

A aplicação, aos fatos ocorridos durante a vigência da medida provisória rejeitada, seja das normas que o Congresso Nacional edite para regular as relações jurídicas então criadas, seja das normas do ordenamento, restauradas em face da omissão do Congresso, deve ocorrer dentro dos limites que a própria Constituição tolera.

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*Artigo publicado originalmente em 1994 na Revista dos Tribunais (700, p.46-7)

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**Possui formação acadêmica em Contabilidade e em Direito. Mestre em Direito Público pela UFC, é professor Titular de Direito Tributário da UFC. Foi procurador da República, juiz do TRE/CE e juiz do TRF da 5ª Região, Corte da qual foi presidente.






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