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Remuneração de membros da diretoria nas sociedades anônimas - aspectos societários e tributários

Gabriela Di Pillo de Paula

A proposta de eventual adoção de política de remuneração de membros da Diretoria das Sociedades Anônimas, em um primeiro momento, pode fixar na mente do destinatário a ideia de Planejamento Tributário, com redução do pagamento de tributos para a empresa e diretor, com repercussão no quadro societário da companhia.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Atualizado em 19 de maio de 2011 12:10


Remuneração de membros da diretoria nas sociedades anônimas - aspectos societários e tributários

Gabriela Di Pillo de Paula*

1. Introdução - Planejamento Tributário X Inovação Financeira

A proposta de eventual adoção de política de remuneração de membros da Diretoria das Sociedades Anônimas, em um primeiro momento, pode fixar na mente do destinatário a ideia de Planejamento Tributário, com redução do pagamento de tributos para a empresa e diretor, com repercussão no quadro societário da companhia.

Devemos ressaltar que o entendimento de que o Planejamento Tributário é sempre ilegal, mormente mediante a análise das decisões do Conselho de Contribuintes, parece adotar integralmente uma interpretação econômica do fato jurídico, pelo qual permitida seria a tributação de duas situações jurídicas distintas, desde que, por elas, atingido fosse o mesmo resultado econômico.

No Brasil, contudo, esta ideia com traços subjetivos fica mitigada pelos princípios que regem a ordem tributária, pelo que recomendável seria uma interpretação sistemática e casuística dos fatos jurídicos.

Por esta razão, e para evitar a ideia inicial de que a adoção das formas de remuneração de diretores implicaria em Planejamento Tributário, conclusão que nos levaria à discussão de temais tais como elisão e evasão, questões que fogem ao objeto deste estudo, preferimos apresentar o conceito de inovação financeira, já difundido no Mercado Financeiro, que propõe respostas criativas a determinados problemas.

A inovação financeira, nas palavras de Otavio Yazbek, interpretando a análise de Schumpeter, seria "a criação de instrumentos ou estratégias, alterando padrões vigentes, apresentando soluções e, consequentemente, gerando resultados distintos daqueles que se esperaria originariamente".

Contudo, é bom esclarecermos que as soluções aqui apresentadas, do ponto de vista tributário, estão devidamente inclusas no poder de auto-organização do empreendedor no âmbito de seu negócio. Além de tal fato, como demonstraremos, a figura do diretor não-empregado é reconhecida por dispositivos legais, segundo uma análise a partir do Direito Privado, bem como amplamente reconhecida pela jurisprudência.

2. Apontamentos sobre a estrutura das Sociedades Anônimas

As Sociedades Anônimas, de capital aberto ou fechado, são formadas por três órgãos: Assembleia Geral, Administração e Conselho Fiscal. Este trabalho, por óbvio, busca a análise da Administração, tendo em vista que ali estão os diretores, porém, anotaremos, ainda que de forma breve, a função precípua dos demais órgãos.

A Assembleia Geral é o órgão deliberativo por excelência da companhia que, por tratar-se da reunião dos acionistas, assume papel de definir a composição dos demais órgãos. O Conselho Fiscal, por vez, além de assumir caráter aparentemente deliberativo, por exercer função de fiscalização por meio de pareceres, parece-nos mais corretor indicar como órgão opinativo.

Os Diretores irão compor a Administração da Companhia. A Administração será bipartida, nos casos em que a lei obriga a existência do Conselho de Administração ou singular, tendo em vista que qualquer Sociedade Anônima obrigatoriamente terá sua Administração integrada, ao menos, pela Diretoria.

O Conselho de Administração é órgão colegiado de gestão, composto de, no mínimo, três conselheiros, obrigatório nas Companhias abertas, de economia mista, e companhia de capital autorizado, estas abertas ou fechadas. Seus membros, vale dizer, são eleitos pela Assembleia Geral, pelo que concluímos que na composição do órgão, os diretores serão apenas aqueles já empregados e que, eleitos, passam a compô-lo.

Sobre a responsabilidade tributária dos membros do Conselho de Administração, muito embora a lei repute-a solidária, em razão da atecnia do texto legislativo, temos que o mais correto seria a subsidiariedade.

A Diretoria, que tem a incumbência de representação da companhia e sua gestão direta, é órgão obrigatória a qualquer pessoa jurídica que assuma a forma de sociedade anônima, sendo formada pelo mínimo de 2 conselheiros.

Na formação da Diretoria poderemos observar os diretores das diversas classes, com vínculo empregatício ou não, tendo em vista que, por força de disposição legal, são nomeados pela Assembleia Geral ou pelo Conselho de Administração, nas companhias em que este a compuser.

Neste ponto chamamos atenção para a responsabilidade tributária dos membros da diretoria que é pessoal.

3. Governança Corporativa e Teoria da Agência - Gerenciamento de Riscos

A Governança Corporativa, tema a que retornaremos ao debater o princípio da full disclosure, intensificado pelas políticas de remuneração que aqui serão propostas, busca estabelecer um sistema de relacionamento entre acionistas e executivos da empresa.

A adoção de boas práticas de governança corporativa já demonstrou aumentar o investimento nas companhias, tendo em vista que o investidor, ciente de que o objeto de seu investimento goza de harmonia interna, sem dúvida, aumentará o nível de confiança nos administradores e, conseqüentemente, em suas ações, gerando a certeza no retorno de seu investimento.

Estando a governança corporativa diretamente ligada ao gerenciamento dos riscos do negócio, torna-se indispensável a compreensão da teoria da agência que foi estudada a partir da ideia de alinhamento dos interesses entre acionistas e gestores, por meio de políticas de remuneração e incentivos a estes.

Identificou-se que as relações contratuais no âmbito da empresa se dariam por meio da identificação de duas figuras: a principal e o agente. O principal, sujeito ativo que solicita atividades ao agente, pode ser identificado, no âmbito das Sociedades Anônimas, como os acionistas. O agente, sujeito passivo, é que realiza as atividades solicitadas pelo principal, recebendo uma remuneração por isto. Nas Sociedades Anônimas os agentes podem ser identificados como os diretores, responsáveis pela administração da companhia.

Identificou-se, assim, mediante a sistemática da agência, e do ponto de vista societário e econômico, quatro principais problemas que se mostram contemporâneos e facilmente identificados nas companhias existentes:

  • Esforço - os agentes (administradores) podem se esforçar menos do que os principais (acionistas) gostariam;
  • Horizonte - os agentes e principais possuem horizonte de tempo para o alcance de objetivos;
  • Diferentes preferências de risco - os agentes tendem a ter maior aversão ao risco do que os acionistas;
  • Utilização de ativos - os agentes podem fazer uso abusivo dos ativos da empresa cedidos como incentivos pelos acionistas.

Os quatro problemas e suas formas de mitigação serão tratados no decorrer deste trabalho, porém, todos são gerenciáveis por boas práticas de governança corporativa. O quarto problema diz respeito à full disclosure tratada mais adiante.

Neste momento, devemos indicar importante resultado que gerou um tratamento mais cuidadoso da relação entre acionistas e gestores, principalmente no que diz respeito à preferência de riscos.

Em 1990, em estudo econômico dirigido por Jensen e Murphy, verificou-se que o aumento de U$ 1.000,00 no valor de uma empresa aumentaria a média de remuneração dos CEO's em apenas U$ 3,25.

A conclusão gerada a partir destes dados econômicos mostra que empresas que não adotam políticas de remuneração ou incentivos dos administradores ligadas ao risco experimentam um cenário de repulsão destes pelo risco, tendo em vista que perdem mais com o "desequilíbrio" da companhia em virtude da exposição a negócios arriscado do que ganhariam com a situação mediana desta.

Em virtude deste cenário, a captação de recursos só será possível mediante a adoção, pelo estatuto, de mecanismos internos e externos que assegurem que as decisões corporativas sejam tomadas no melhor interesse dos investidores. Isto só é possível pela exposição eventual da empresa a riscos, e desde que estes riscos possam levar o gestor à obtenção de lucro pessoal, conforme o sucesso do negócio.

4. Espécies de Diretores e Enunciado 269 do TST

A Administração da Sociedade Anônima, compostas de Diretoria, obrigatoriamente, e Conselho de Administração, pode contar com diversidade de figuras contratuais que regem a relação entre os seus membros e a Companhia.

Assim, verificamos, 3 espécies de diretores: os diretores com vínculo empregatício; os diretores que possuíam anterior vínculo empregatício, mas que com a eleição ao cargo têm seu contrato de trabalho suspenso, e o diretor sem vínculo empregatício, nomeado exclusivamente para este fim.

Analisaremos, em primeiro lugar, os diretores que, empregados da companhia, têm seu contrato de trabalho suspenso quando eleitos para este posto. Neste caso, a suspensão do contrato de trabalho, que não permanece em vigência no tempo de duração do exercício da função de diretor, é devidamente reconhecido pelo Tribunal Superior do Trabalho, de acordo com o texto do Enunciado 269 que transcrevemos:

TST Enunciado 269 - Empregado Eleito para Ocupar Cargo de Diretor - Contrato de Trabalho - Relação de Emprego - Tempo de Serviço - O empregado eleito para ocupar cargo de diretor tem o respectivo contrato de trabalho suspenso, não se computando o tempo de serviço deste período, salvo se permanecer a subordinação jurídica inerente à relação de emprego.

Portanto, sua forma de remuneração, a não ser que por opção da empresa, não será salário, lembrando que na relação entre os contratantes não deve permanecer a subordinação jurídica, sob pena de não interrupção do vínculo, como já vem decidindo o Tribunal Superior.

Aqui, com a devida vênia, ousamos discordar do Enunciado Sumular e do entendimento repetidamente exposto pelos membros daquele Tribunal. É certo que as características corretivas do Direito do Trabalho, visando a inclusão social dos seres humanos, não podem ter aplicação absoluto no âmbito no Mercado Financeiro e de Capital, quando estes buscam justamente o implemento da economia, a captação de investimentos e a assunção de operações de risco.

Esta discussão não é nova. Orlando Gomes, com sensibilidade ímpar, já em 1979, observando os primeiros impactos da lei do anominato, observava a incongruência, ainda que parcial, entre as sociedades anônimas (termo contemporâneo) e as regras trabalhistas, verbis:

"O efeito dessas transformações sobre a estrutura das duas classes, o patronato e o proletariado, faz-se sentir sob a forma de um obscurecimento de sua linha demarcatória, do qual resulta certa confusão se o critério de caracterização das classes continua a ser aquele que foi definido por Marx, vale dizer, a posição do indivíduo no processo de produção".

O autor reconhece que os administradores desta sociedade não estão contidos na finalidade da norma que, por óbvio, dirigiu-se aos trabalhadores de uma classe econômica diversa daqueles, verbis:

"as vantagens trabalhistas conquistadas ao longo dos anos são indiferentes a tais administradores, por isso que a maioria delas não lhes interessa dado o alto padrão de vida que desfrutam.Outras são incompatíveis com a própria natureza dos cargos que ocupam e a função de confiança que exercem".

A realidade é que, diante da sistemática das Sociedades Anônimas e da figura do Diretor destas sociedades, as regras trabalhistas dificultam a formação de economias mais sólidas e de um mercado de capital mais difundido.

Diante da teoria da agência, conhecedores que somos das correntes que discutem o tema no âmbito da Justiça obreira, seria impossível admitirmos que o principal entregue o destino de seu negócio ao agente sem qualquer tipo de subordinação jurídica. Admitirmos este cenário seria negar a existência do próprio Conselho de Administração, como órgão colegiado, e das empresas de auditoria.

Por este motivo, clamamos por uma visão interdisciplinar do tema, criando-se, como já se fez em outras áreas do Direito, um Direito Empresarial do Trabalho, sendo, ao nosso ver, insuficiente o entendimento de que os diretores têm uma subordinação, ainda que mínima, mas meramente aos objetivos societários.

Não terá vínculo empregatício, ainda, o diretor nomeado, pela Assembleia Geral ou Conselho de Administração, estranho ao quadro de empregados da Companhia e que a ela se integra exclusivamente para o exercício desta função.

Devemos alertar que a subordinação jurídica que gerará o vínculo empregatício e que fará o diretor se enquadrar na categoria de diretor empregado, salvo se opção da empresa, segundo o TST, é sua subordinação ao Conselho de Administração.

Reforçamos nossa crítica no sentido de que o Conselho de Administração, como órgão colegiado, demanda subordinação dos diretores, naturalmente, o que tornaria impossível a figura do diretor sem vínculo.

5. Participação nos Lucros e Resultados (PLR) - Lei 10.101/00 - Diretor Empregado

A participação dos empregados nos lucros e resultados da empresa, prevista no artigo 7º, XI da CF/88 (clique aqui), regulamentado pela lei 10.101/00 (clique aqui), somente mostra-se passível de adoção para os diretores empregados, por expressa disposição legal.

Aliás, a conexão da PLR da lei 10.101/00 ao vínculo de emprego, é lógica, em razão da limitação temporal da forma de remuneração que pressupões que a fonte recebedora tenha, ao menos, uma remuneração fixa.

A fixação da PLR, sua porcentagem sobre os lucros ou valor fixo, deve ser feita, segundo dita a lei 10.101/00, por negociação entre a companhia e os empregados que elegem membros para uma comissão que discutirá os termos, com a participação de integrante do Sindicato e redução a termo em Convenção Coletiva ou Acordo Coletivo.

Esta forma de remuneração se formou com o objetivo de estabelecer tratamento tributário, previdenciário e trabalhista diferenciado para prêmios por desempenho pessoal concedidos pelas empresas públicas ou privadas a seus empregados e demais colaboradores, para atingir metas de qualidade e produtividade.

Percebe-se que o legislador não buscou implementar o Mercado Financeiro ou criar soluções para remuneração de diretores e problemáticas geradas com a Teoria da Agência, mas meramente buscar forma de incentivo de produtividade dos empregados que, em tese, receberiam "prêmio" atrelado aos lucros da empresa.

Para que a política de pagamento de PLR seja reputada válida, especialmente para fins tributários, é de rigor que as exigências legais sejam seguidas à risca, das quais podemos citar que o benefício seja destinado a todos os empregados; que a Convenção Coletiva ou Acordo Coletivo defina o percentual do lucro que será destinado para o programa; defina metas possíveis que os funcionários devem atingir para que ocorra o pagamento; arquivamento dos instrumentos celebrados com o sindicato.

O pagamento de Participação nos Lucros e Resultados não substitui a remuneração fixa do trabalhador, esta decorrente do vínculo de emprego. Contudo, não incidirá sobre os pagamentos feitos a este título e desde que as regras claras sejam seguidas pela empresa, encargos trabalhistas para qualquer das partes.

Também devemos notar a superação de paradigmas, tais como a Súmula 251 do TST, que reconheciam a natureza salarial dos pagamentos feitos a título de PLR. Contudo, segundo o próprio legislador cuidou de esclarecer, não se aplica à Participação nos Lucros e Resultados, a regra da habitualidade, ou seja, mesmo o pagamento habitual (respeitado o limite temporal) não integrará, para qualquer fim, a remuneração do trabalhador.

A PLR, para fins de incidência dos benefícios, tem um período para verificação do pagamento, ou seja, segundo a determinação legal, deve ser semestral.

Com relação à tributação, do ponto de vista do diretor, as parcelas pagas a título de PLR, são tributadas na fonte, sendo a retenção e recolhimento do imposto devido de competência da empresa.

Vale dizer que o maior benefício tributário é a tributação em parcelas separadas dos demais pagamentos recebidos no mês. Esta forma de tributação impede que o pagamento do prêmio ao trabalhador seja somado aos outros rendimentos recebidos no mês, com isso evitando mudança de faixa na tabela de incidência e aplicação de alíquota mais gravosa.

Do ponto de vista da pessoa jurídica, as participações pagas aos empregados, poderão ser deduzidas como despesa operacional, aplicando-se a regra de competência, ou seja, será dedutível no exercício a que se refere, ainda que o pagamento de dê em prazo futuro.

Na verdade, um dos assuntos mais vertentes no Conselho de Contribuintes são os planos de PLR, deduzidos os pagamentos como despesa operacional da pessoa jurídica, que não atenderiam às exigências legais.

Assim, a PLR passa a funcionar como mero instrumento da pessoa jurídica para diminuição da carga tributária, sem estabelecimento claro de metas ou porcentagem dirigida aos empregados em caso de aumento do lucro. A PLR, inclusive, na maioria dos casos, quando fixadas, o são em valor fixo.

6. Participação nos Lucros e Resultados - Artigo 152 da lei 6.404/76 (clique aqui) - Diretor Eleito ou não-empregado

O Diretor não empregado também poderá receber participação nos lucros e resultados da companhia. Porém, no caso de ausência de vínculo empregatício, o regime a ser observado é aquele constante da lei do anonimato, sem o tratamento diferenciado dado pela lei 10.101/00.

Como aduzimos do artigo 152 da lei 6.404/76, esta forma de remuneração deve ser fixada pela Assembleia Geral e constar do estatuto.

O legislador, contudo, ressalvou a possibilidade de participação nos lucros dos administradores às companhias que, em razão do disposto no estatuto, paguem dividendo obrigatório de 25% do lucro líquido (ou mais) a seus acionistas e desde que a participação não ultrapasse a remuneração anual dos administradores e nem 10% dos lucros, prevalecendo o limite menor.

Há controvérsia sobre a incidência ou não de contribuição social sobre a participação nos lucros com previsão no estatuto. Notamos diversos precedentes judiciais entendendo pela não há incidência, assim como o Plano de Custeio da Previdência Social.

Porém, o Decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social - (clique aqui)) restringe a não incidência apenas à PLR paga nos termos da lei 10.101/00 (paga a empregados).

A Jurisprudência caminha para uma interpretação conforme a CF/88, ou seja, participação nos lucros de diretores e administradores sofre incidência de contribuição social.

Tal interpretação parte da ideia que não se trata de "participação" em si, mas de verdadeira "distribuição de lucros" àqueles que participam da gestão da Companhia.

Desta forma, uma interpretação sistemática dos dispositivos da lei 10.101/00 mostra que a participação nos lucros diz respeito apenas a empregados. A distribuição de lucros a sócios/acionistas ou administradores/ diretores terá previsão no contrato social, no estatuto ou de acordo com a Assembleia Geral, porém sempre respeitada a previsão legal, pelo que entendemos ser devida a Contribuição.

Com relação à tributação da pessoa jurídica, as participações estatutárias nos lucros de diretores devem ser adicionadas ao lucro líquido de exercício, na apuração do lucro real, sendo tributáveis na declaração de rendimentos.

Tal assertiva é ratificada pelo artigo 303 do Regulamento do Imposto de Renda que dispõe que não serão dedutíveis, como custos ou despesas operacionais, as gratificações ou participações no resultado, atribuídas aos dirigentes ou administradores da pessoa jurídica.

7. Stock Options

A opção de compras de ações foi ferramenta muito utilizada no passado, mas que, pela implicação societária e nenhuma vantagem tributária, diante das novas políticas de remuneração propostas, hoje em dia não é praticamente utilizada.

Prevista no artigo 168, § 7º da lei 6.404/76, diferentemente do que muitos pensam equivocadamente, as ações que figuram na opção de compra não são ações negociáveis em Bolsa ou em mercado de balcão, mas instrumentos meramente remuneratórios a administradores, empregados ou pessoas que prestem serviço à companhia.

Muito mais do que na temática do Mercado de Capitais, a questão parece se situar no âmbito do Direito das Obrigações, tendo em vista que a opção de compra de ações constitui-se em negócio jurídico que dá ao beneficiário direito de adquirir novas ações emitidas em razão de futuro aumento de capital, autorizado e dentro do plano da assembleia-geral.

A descaracterização destes títulos como valores mobiliários está no fato de serem personalíssimos e não negociáveis em mercado, o que não significaria qualquer aporte de recursos para a companhia.

A doutrina discute se a opção se caracterizaria como contrato preliminar, ensejando execução específica ou obrigação de fazer, resolvendo-se o descumprimento em perdas e danos.

De qualquer forma que analisemos a questão, verificamos que, do ponto de vista da empresa, tal forma de remuneração não possui qualquer vantagem, tendo em vista que a opção pela compra modificará o quadro societário, além de não significar qualquer dedução em qualquer das escalas da apuração do lucro real.

O contrato se aperfeiçoa com a efetiva compra das ações e, a partir deste momento, o beneficiário passará a acionista, recebendo seu dividendo do lucro líquido apurado após a aplicação das alíquotas de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

Para o administrador os lucros e dividendos pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário pessoa física ou jurídica, domiciliada no país ou no exterior.

8. Debêntures com Participação nos Lucros

As debêntures, espécie de valor mobiliário, são títulos representativos de investimentos, até por que, pela própria dinâmica do Mercado de Capitais, o lançamento de títulos para negociação no mercado, pressupõe captação de recursos, neste caso, com direito de crédito a médio ou longo prazo.

Retomando as indicações sobre a teoria da agência, é importante termos em mente que a remuneração do diretor por meio de valores mobiliários implica a máxima de que a rentabilidade está condicionada ao sucesso do empreendimento, significando, necessariamente, um capital que corre risco.

Estes valores mobiliários podem ser emitidos por companhias abertas ou fechadas e, neste caso, com o fim específico de remuneração. Desta forma, o debenturista, diretor, será considerado credor da sociedade.

É importante destacar que aqui tratamos unicamente das debêntures com participação nos lucros, ou seja, a companhia emite os papéis, com autorização da assembleia geral (artigo 56 da lei 6.404/76), possuindo o debenturista um crédito contra a companhia e sendo remunerado em função do lucro apurado pela companhia emissora.

Desta forma, além de ter direito de resgate a longo prazo do crédito que representa a debênture, o diretor terá, em cada exercício, a remuneração de acordo com o lucro líquido da companhia, e dele subtraída.

As debêntures são dívidas e, por isso, são registradas no exigível a longo prazo ou no passivo circulante, dependendo do prazo de vencimento e, portanto, serão computadas na composição do patrimônio líquido.

A emissão de debêntures não significa qualquer mudança nos quadros societários da companhia, desde que não emitidas com a opção de conversão em ações.

Estes valores mobiliários parecem ser a melhor opção de remuneração de diretores, tendo em vista atender a exigência por boas normas de governança corporativa, divisão de riscos, vantagem tributária e inalterabilidade do quadro acionário.

9. Partes Beneficiárias

As partes beneficiárias são valores mobiliários de emissão privativa das companhias fechadas que, historicamente, eram já utilizadas para remuneração de serviços prestados para a companhia (parts de fondateur) na construção do Canal de Suez.

Diferentemente das debêntures que dão um crédito certo para a companhia, isto é, o debenturista tem direito ao crédito representado pelo título, as partes beneficiárias dão direito ao detentor de crédito eventual contra a companhia, configurado em determinado percentual de participação na divisão anual do lucro líquido.

É certo levantar a discussão pela qual as partes beneficiárias não seriam valores mobiliários e sim títulos de crédito causais, que dariam direito de remuneração eventual ao diretor, caso a companhia experimentasse lucros líquidos.

Na cadeia tributária, o valor pago será descontado diretamente do lucro líquido, sem que integre o passivo, pois não possuem, como as debêntures, o direito de resgate.

Não há mudança no quadro societário da companhia.

10. A full disclosure e as práticas de insider trading

A remuneração de administradores por parcelas variáveis que, conforme pregamos aqui, significa incentivo ao diretor, pela divisão dos riscos, que geraria um interesse maior no sucesso do negócio e conseqüente aumento dos investimentos, pode trazer à companhia problemas reputados na prática de insider trading.

O insider trading pode ser definido como a utilização de informações privilegiadas e desconhecidas do mercado, por pessoa ligada à companhia emissora com o intuito de vantagem.

Nelson Eizirik cuidou de aplicar a regra teórica à realidade do mercado de capitais explanando que "o insider compra ou vende no mercado a preços que ainda não estão refletindo o impacto de determinadas informações sobre a companhia, que são de seu conhecimento exclusivo". (EIZIRIK, 1983, p.42)

José Marcelo Martins Proença atribui, no Brasil, à Lei das Sociedades Anônimas (6.404/76) a regulamentação e punição mais austera do insider trading, em seus artigos 155 e 157. (PROENÇA, 2005, P.276)

Porém, foi apenas em 2001, por meio da lei 10.303 (clique aqui), que introduziu o artigo 27D á lei 6.385/76 (clique aqui), que o crime foi tipificado no capítulo VII-B, na seção de crimes contra o mercado de capitais.

A CVM já se manifestou que, para a configuração da conduta delituosa e fraudulenta, não é necessária a obtenção de lucro, bastando, como bem salientou Eli Loria ao julgar o processo sancionador CVM SP2005/0155, in verbis, "a negociação em indevida posição de desequilíbrio em face dos demais participantes da operação".

O insider trading foi vedado no Brasil pela lei 10.303/01, que introduziu o parágrafo 4° ao artigo 155 da Lei das Sociedades Anônimas, dirigindo-se a proibição de utilização de informação relevante a "qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários".

Nelson Eizirik, a respeito deste alargamento do conceito, entende que, para a configuração da conduta "deve haver um nexo profissional entre o vazamento de informações e os terceiros, para que possam ser enquadrados na norma". (EIZIRIK, 2008, p.533)

Alfredo Sérgio Lazzareschi Neto compartilha desta opinião, defendendo que não se pune o conhecimento eventual da informação, ou seja, aquele que não provém do exercício de profissão junto à sociedade, punindo-se, neste caso, apenas o administrador divulgador da informação (LAZZARESCHI NETTO, 2008, p.146).

Seguindo a tendência americana que, desde a década de 30, já vinha tentando combater a figura do insider trading, o legislador brasileiro, por meio da lei 6.385/74, expressou o princípio da transparência e ampla divulgação de informações no mercado de capitais, conferindo à CVM a função de assegurar o acesso a informações relevantes a todos os investidores.

Este princípio, em consentimento à garantia de igualdade pregada pelos mercados, significa a proteção ao investidor que, de posse das informações relevantes para aquele investimento pretendido, conheceria os riscos dele decorrentes.

Buscando a equalização do acesso à informação, determinando-se que toda informação essencial deve ser divulgada imediatamente ao mercado, tenciona-se garantir a confiabilidade dos investidores no mercado e sua eficiência.

Desta forma, podemos até mesmo dizer que o acesso às informações no mercado de capitais estimula o investimento ao facilitar a tomada de decisões, além de, garantir a justa formação de preços.

Sob o ponto de vista econômico, a ampla divulgação de informações relevantes ao mercado é figura imperativa, tendo em vista que a tendência em um mercado não norteado pelo princípio da transparência é seu perecimento e migração dos investidores para mercados mais confiáveis, e com maior retorno de investimento.

Nelson Eizirik promoveu a análise econômica do integral cumprimento do princípio, concluindo que, com a igualdade de informações entre investidores, a cotação dos valores mobiliários refletirá a realidade, além de permitir que o investimento só ocorra em papéis de companhias rentáveis e produtivas (EIZIRIK, 1987, 123).

Roberto Quiroga Mosquera também prega o direito de igualdade de informações entre os agentes do mercado, destacando o princípio da transparência como um dos fundamentais no mercado financeiro e de capitais (MOSQUERA,1999, P. 270).

Para José Marcelo Martins Proença, a igualdade de conhecimento entre os agentes do mercado, garante a segurança e a estabilidade das relações. (PROENÇA, 2005, p.123)

Calixto Salomão Filho correlaciona a transparência a um dever de lealdade, só alcançado com a igualdade de oportunidades obtida por meio da difusão do conhecimento entre os indivíduos. (SALOMÃO FILHO, 2001, p.15)

Este dever de informação, segundo os defensores da punição ao uso de informações privilegiadas, estaria diretamente ligado ao risco existente no mercado de capitais, sendo que, um desequilíbrio nas informações proporcionaria ao detentor de informação privilegiada o poder de direcionar seus investimentos a operações de menos risco.

Não obstante as regras punitivas já existentes sobre o assunto, os repressores do insider trading são unânimes em afirmar que o país ainda possui muito a aperfeiçoar tendo em vista o elevado número de processos constantes na CVM sobre este tema.

Reconhecem, outrossim, que o Brasil ainda não está dotado das ferramentas para diminuir a incidência da conduta, lembrando que demoramos longos 43 anos para incorporar ao mercado o indispensável princípio, o que é inaceitável em um mundo globalizado.

As falhas na divulgação de informações e o desconhecimento sobre sua relevância, talvez, sejam responsáveis pela constante observância da conduta delituosa, devendo o legislador e as empresas impedir que os indivíduos negociem com as informações privilegiadas, atribuindo-se papel importante a esta última.

11. Formas de Diminuição do Risco

Mesmo os defensores da regulação do insider trading são quase unânimes em reconhecer que o Brasil ou o mundo não possuem, ainda, ferramentas eficazes para a erradicação da conduta.

Este problema se agrava no mundo de hoje em que enfrentamos a globalização e desenvolvimento tecnológico acentuado.

Linda Chatman, diretora da SEC, demonstra que os casos de insider trading significam 12% de todos os casos julgados pela comissão, 50 por ano, somando penalidades de U$ 150 milhões anuais (CHATMAN, 2008).

A diminuição destes números, dizem os especialistas, só pode ser alcançada por uma interação entre órgãos fiscalizadores, que devem desenvolver mais instrumento de supervisão das companhias e as empresas pelo desenvolvimento de políticas severas de garantia do cumprimento do disclosure.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) já se pronunciou no sentido de que o mercado acionário brasileiro ainda não possui a expressividade que poderia representar em termos de financiamento da produção e incentivo a novos investimentos. A falta de transparência na gestão e a ausência de instrumentos adequados de supervisão das companhias são apontadas como principais causas desse cenário. Trata-se de um ambiente que facilita a multiplicação de riscos.

O Professor Luis Gastão Paes de Barros Leães, antes mesmo das modificações introduzidas pela lei 10.303/01 já antevia este cenário, ipsis litteris (LEÃES,1982, p.172):

o princípio do disclosure não se esgota apenas com a prestação de informações: é preciso que paralelamente medidas sejam tomadas para que todos os investidores potenciais tenham, ao mesmo tempo, acesso à novas informações, impedindo-se assim que os administradores, altos empregados e acionistas controladores, utilizem-se em proveito próprio de formações colhidas em primeira mão por força da posição que ocupam. A repressão ao insider trading é, destarte corolário natural da adoção do princípio do disclosure na regulação do mercado de valores. (LEÃES, 1982, p.172)

Marcelo Trindade, ex-presidente da CVM, em julgamento de processo administrativo sancionador, propôs, para a efetividade do princípio da transparência, a adoção, pelas companhias, de políticas de chinese wall, blindando as informações, de modo a evitar ao máximo a prática do insider trading, sugerindo até, em certos casos, a proibição de negociar, ad litteram:

Um dos pontos jurídicos importantes deste processo é a adequação e o cumprimento das políticas de chinese wall. Os mecanismos de chinese wall são criados, exatamente, porque coincidências acontecem. Esta é sua razão de existir: a coincidência. Entretanto, os órgãos reguladores do mundo inteiro não podem acreditar na casualidade das coincidências, e, por isto, criaram mecanismos para prevenirem-se contra a ocorrência de coincidências, de forma a restringir ao máximo as possibilidades de construções e defesas ensaiadas a posteriori, de acordo com as conveniências de cada um. Em outras palavras: para que não se tome por coincidência o que é intencional, e vice versa, os reguladores vêm insistindo na adoção prévia de procedimentos de alerta ou, dependendo do caso, de proibição, que, se completos e efetivos, têm a função de sinalizar e evitar a ocorrência de determinados eventos, pouco importando se são, ou não, resultado do acaso. (...) Chinese wall não significa, apenas, uma restrição ao fluxo de informação dentro da empresa, ou, ainda uma limitação à atuação da empresa com determinados papéis. Muitas vezes, dependendo da sensibilidade da informação e da gravidade do conflito de interesse, o chinese wall adequado equivalerá à proibição de negociar.

Norma Parente, porém, adverte, no julgamento do processo sancionador CVM 06/2003, que a vinculação do indivíduo à companhia não impede, necessariamente, a negociação de títulos desta empresa, devendo-se evitar, contudo, a contaminação do negócio pelo uso da informação privilegiada por aqueles que tenham conhecimento desta.

A relatora, ainda, aponta a possibilidade de que o indivíduo conhecedor do dado relevante revele-o, desde que não ponha em risco o interesse da companhia, para a observância da igualdade de informações.

Os defensores da regulação, ademais, citam a necessidade da adoção pelas companhias de normas eficazes de governança corporativa, pois, como bem observa Norma Parente, companhias com um sistema de governança que proteja todos os seus investidores tendem a ser mais valorizadas, tendo em vista que investidores reconhecem que o retorno dos investimentos será usufruído igualmente por todos (PARENTE, 2002).

A governança corporativa pode ser comparada a um tipo de sinalização, uma vez que esta prática indica aos investidores que a empresa implementará (BORGES e SERRÃO, 2005, p. 113):

um conjunto de práticas que tem por finalidade otimizar o desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como investidores, empregados e credores, facilitando o acesso ao capital.

Assim, a regulação estatal deve ser seguida de uma resposta da Companhia para eliminação das vantagens do insider trading, devendo diminuir os benefícios de descumprir a lei, além de melhorar a forma de transparência das informações e as formas de detecção da conduta (BRIS, 2000).

Adotar tais práticas significaria, inclusive, o encorajamento do capital estrangeiro, tendo em vista que os investidores, acostumados com tais políticas em seus países, condicionam a inversão de recurso à existência da mesma governança.

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*Advogada do escritório De Paula Advogados Associados

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