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Senhor Presidente!

Celso Luiz Limongi

Presidente Lula, tenho algumas sérias reclamações a fazer. Em primeiro lugar, esclareço que não votei no senhor: sei muito bem que governar é difícil e para aprender leva tempo. E, enquanto não se sabe governar, o povo paga a conta... No dia de sua posse, porém, fiquei até comovido: um operário, migrante, humilde, chegou à presidência da República por méritos próprios! Sua alegria e emoção eram contagiantes!

quinta-feira, 1 de setembro de 2005

Atualizado em 31 de agosto de 2005 09:49


Senhor Presidente!


Celso Luiz Limongi*


Presidente Lula, tenho algumas sérias reclamações a fazer.


Em primeiro lugar, esclareço que não votei no senhor: sei muito bem que governar é difícil e para aprender leva tempo. E, enquanto não se sabe governar, o povo paga a conta...


No dia de sua posse, porém, fiquei até comovido: um operário, migrante, humilde, chegou à presidência da República por méritos próprios! Sua alegria e emoção eram contagiantes!


Contudo, Senhor Presidente, logo as preocupações começaram.A reforma da Previdência se iniciou com o Executivo Federal provocando verdadeiro clamor público contra todos os funcionários públicos. Dizia que a aposentadoria integral era a responsável por um rombo na Previdência. Todos trabalhavam, para sustentar uma casta improdutiva e exploradora. Era preciso desmontar essa máquina burocrática. E só se ouvia a voz oficial do governo federal. Isto é, a sua voz, Presidente, amplificada pela mídia. O Congresso Nacional, violado em sua autonomia, e subjugado, aprovou a reforma. A Senadora Heloísa Helena e três deputados do Partido dos Trabalhadores foram expulsos, porque votaram contra a reforma. Outros oito deputados petistas foram suspensos por sessenta dias, porque se abstiveram de votar pressionados. E, assim, foi o funcionalismo traído pelo PT, a quem tradicionalmente dava apoio. Tudo, sem considerar que o alegado rombo se deveu a constantes saques no orçamento da Previdência, pagando despesas como a construção de Brasília, da ponte Rio-Niterói, a usina de Itaipu, as despesas de aposentadoria dos trabalhadores rurais e tantas outras, jamais devolvidas, sem contar a péssima administração, por quem não era do ramo...


Iniciou-se, pouco depois, a votação da reforma do Judiciário. E o senhor, desqualificando esse Poder, declarou que era preciso abrir a "caixa-preta" do Judiciário, dando azo a interpretações perversas. Na condição de magistrado, não nego que fiquei indignado com sua manifestação. O que seria a "caixa-preta"? Qual seu conteúdo? Era questão relativa a corrupções?


Bem, pelo que todos nós estamos vendo, certamente seria, no seu pensamento, algo igual às malas pretas de dinheiro que andam voando pelos ares do Brasil. Graças a Deus, porém, no Judiciário, se corrupção houver, limita-se a índice irrelevante, igual ao dos países mais adiantados do planeta, registrando-se que a corrupção é um mal próprio da falibilidade humana, e pode permear toda e qualquer instituição humana.


Na reforma do Judiciário, criou-se um conselho externo, o que reduz a independência do magistrado. No Ministério Público, também há um conselho externo e muito se falou em mordaça.Na imprensa, tentou-se criar um conselho cuja finalidade era a de amordaçar a imprensa.(Imagine, Presidente, se a imprensa estivesse amordaçada!) Assim, três pilares da democracia ficariam subordinados a conselhos externos. O Partido dos Trabalhadores desenhava um perfil autoritário. E projetos de governo não eram apresentados. Sobrava dinheiro nos Ministérios, porque, sem projeto, não se gastava. Apenas a economia ia e continua indo bem, porque, afinal, a filosofia de Fernando Henrique Cardoso foi mantida.


De repente, surge Waldomiro. Nada foi feito. Ou melhor, o Executivo iniciou operação para abafar a CPI.


Agora, a esta altura, Senhor Presidente, descobertas fraudes, caixa 2 do PT, depósitos no estrangeiro e em paraíso fiscal, compra de votos de deputados federais, tudo ao redor (físico e moral) da presidência da República, cumpria-lhe lealmente esclarecer à Nação o que de fato aconteceu, mas sem tergiversar, nem buscar confronto com as elites ou apoiar-se em movimentos sociais isolados. Era sua obrigação apontar o nome dos culpados e pedir sua pronta punição. Mas, a pífia manifestação de sexta-feira última, 12 de agosto, não convenceu a Nação, segundo comentários trazidos pela mídia, nem acreditou em sua inocência. Sob esse aspecto, não há provas, até agora, de que o senhor soubesse do que se passava, porém, senhor Presidente, é obrigação das autoridades manter-se vigilantes. Se não se consegue nem enxergar o que ocorre à sua volta, como pensar em administrar o Brasil?


Se o Brasil não merecia isso, como disse na França, sua contribuição deverá focar-se em reconhecer a existência de uma crise incomparável, e a legitimidade do Congresso Nacional para investigar e julgar. Buscar apoio em movimentos sociais é jogar lenha na fogueira. Não é a solução: será uma irresponsabilidade.O senhor não é pessoa estranha à crise ou ao Brasil: o senhor é o Presidente da República, o supremo magistrado do País e capacitado para punir os culpados, desde que essa seja a sua vontade e não tenha prestado anuência a tudo isso...
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*Desembagador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e presidente
Apamagis - Associação Paulista dos Magistrados


 

 

 

 

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