MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Migalhas de peso >
  4. Processo tributário cível

Processo tributário cível

Marisa Regina Maiochi Hayashi

O sistema processual brasileiro é carente de uma sistematização legal para a disciplina judicial das lides tributárias.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Atualizado às 09:51

Introdução e classificações

Quando discorremos acerca do processo judicial tributário cível, estamos abrangendo todas as discussões (não criminais) apresentadas em Juízo envolvendo o crédito tributário, tenha havido contencioso administrativo ou não.

O processo judicial tributário cível é regulado por normas constitucionais, normas do Código de Processo Civil, pelas leis que dispõem sobre execução fiscal e medida cautelar fiscal, além de outras normas esparsas aplicáveis. O mérito, todavia, está submetido às regras do CTN e demais normas materiais tributárias.

Como exemplo dessas outras leis esparsas aplicáveis destacamos a Lei 10.522/2002, que trouxe diversas disposições aplicáveis ao processo administrativo tributário. Podemos citar como exemplo o artigo 20, que determina que "serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela PGFN ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 20.000,00".

Conclui-se, portanto, que o sistema processual brasileiro é carente de uma sistematização legal para a disciplina judicial das lides tributárias.

Nas ações tributárias, compõem a relação jurídica processual, de um lado a Fazenda Pública e do outro o contribuinte. Qualquer um deles pode figurar no pólo ativo ou passivo. Justamente com relação à posição das partes na relação jurídica processual é que temos a classificação feita por James Marins entre ações exacionais e ações antiexacionais.1

Presente a Fazenda Pública como sujeito ativo da relação processual cujo mérito tenha referibilidade com obrigação tributária, temos as ações exacionais.

Doutra parte, estando não a Fazenda Pública, mas o contribuinte no pólo ativo da relação jurídica processual com referibilidade ao direito tributário, encontramos como segunda espécie de ação tributária as ações antiexacionais.

Outra classificação mencionada pelo mesmo Autor subdivide as ações tributárias em próprias ou impróprias, tendo em vista, respectivamente, a existência ou não de regramento autônomo com finalidade tributária específica para determina espécie de ação. Exemplo típico de ação tributária própria é a medida cautelar fiscal.

Vejamos, individualmente, as principais ações tributárias.

Ações exacionais

Execução fiscal

A Administração Tributária não pode, coercitivamente, simplesmente se apropriar do patrimônio dos particulares para saldar seus débitos. Em nosso país, a execução forçada dos bens do devedor dá-se através de ação própria, que deve ser proposta pela Fazenda Pública, sempre perante o Judiciário.

Assim, a execução fiscal é a ação que dispõe a Fazenda Pública para a cobrança de sua dívida ativa.

A execução fiscal é regulada pela Lei 6.830/80, que foi editada com o intuito de criar procedimento especial diverso da execução forçada por quantia certa regulada pelo Código de Processo Civil, visando o ingresso dos recursos devidos ao Estado rapidamente, com isso permitindo a sua adequada aplicação em benefício da sociedade.

Subsidiariamente, a execução fiscal também é regida pelas normas do Código de Processo Civil.

Desde a edição da Lei 6.830/80 alguns defendem a existência de um regime especial a aparelhar a execução fiscal. Outros, todavia, vêem na existência de um regime autônomo, apartado do sistema do CPC, uma extravagância desnecessária, além de ofensa ao princípio da igualdade.

O fato é que por meio do Poder Judiciário, a Fazenda Pública busca, junto ao patrimônio do executado, bens suficientes para o pagamento do crédito que está sendo cobrado por meio da execução fiscal.

O processo de execução se baseia na existência de um título executivo extrajudicial, denominado Certidão de Dívida Ativa, que servirá de fundamento para a cobrança da dívida que está nela representada, pois tal título goza de presunção de certeza e liquidez.

Em regra, ultrapassado o prazo de cobrança, se o débito for superior a R$ 20.000,00, é gerada uma petição inicial que a Procuradoria da Fazenda Nacional leva ao Judiciário para ajuizamento.

O juiz determinará a citação do devedor, que terá um prazo de 5 dias para pagar o débito ou nomear bens para garanti-lo, sob pena de que seu patrimônio venha a ser penhorado.

Não indicados bens ou não aceitos pela Fazenda Pública, podem ocorrer penhora on-line, via BacenJud, penhora de veículos, de imóveis, de faturamento da empresa, etc. Os bens penhorados serão levados a leilão e o produto da arrecadação utilizado para saldar a dívida.

Caso o contribuinte deseje discutir o débito, pode, em paralelo, ajuizar a ação denominada embargos do devedor, desde que tenha havido penhora suficiente para garantir o valor de crédito que está sendo cobrado e discutido.

Para defesa do contribuinte existe também a figura da exceção de pré-executividade, para casos específicos que não demandem dilação probatória e que possam ser aferidos de plano pelo Juízo, assim como para questões de ordem pública.

Medida cautelar fiscal

A Lei 8.397/92, parcialmente alterada pelo artigo 65 da Lei 9532/97, instituiu a medida cautelar fiscal, inovou no campo das medidas cautelares porque regulou a matéria com o objetivo de garantir a satisfação dos créditos da Fazenda Pública.

Via Medida Cautelar Fiscal a Fazenda Pública consegue resguardar o patrimônio do devedor para eventual utilização, mediante penhora, no processo de execução fiscal. Como requisito, todavia, exige-se que já tenha havido a constituição do crédito tributário.

O momento da propositura é variável: pode ser requerida antes ou no curso da execução fiscal, sendo, neste caso, dependente da execução fiscal e a cujos autos deve ser apensada.

As hipóteses de instauração da medida cautelar fiscal estão indicadas no art. 2º da Lei 8397/92.

Para a concessão da medida cautelar fiscal é essencial tanto a prova literal da constituição do crédito fiscal como a prova documental de algum dos casos estabelecidos para sua concessão.

Tem como objetivo conseguir a indisponibilidade de bens do devedor. Essa indisponibilidade, entretanto, somente pode ser fixada no montante da obrigação a que se reporta a medida cautelar, não sendo necessária a apresentação de caução pela Fazenda Pública (art. 7º)

Na hipótese de o devedor ser pessoa jurídica, a indisponibilidade recairá somente sobre os bens do ativo permanente, podendo, ainda, ser estendida aos bens do acionista controlador e aos dos que em razão do contrato social ou estatuto tenham poderes para fazer a empresa cumprir suas obrigações fiscais.

Por fim, pode-se dizer que o traço fundamental da medida cautelar fiscal é a sua instrumentalidade. Funciona como expediente voltado para garantir a eficácia do processo de execução fiscal, resguardando os bens e direitos do contribuinte que poderão ser utilizados para satisfação do crédito do Poder Público.

Ações antiexacionais

Embargos à execução fiscal

Trata-se de uma ação de conhecimento em que o autor exerce defesa contra uma ação da Fazenda Pública visando o cumprimento de obrigação indicada na certidão de dívida ativa.

Cleide Previtalli ensina que os embargos são conhecidos como "ação coacta", uma vez que, se de um lado constituem ação propriamente dita, absolutamente independente, tanto que autuada em apartado, sujeitando-se a petição inicial às normas processuais próprias, de outro lado o devedor executado é coagido a utilizar-se dessa "ação", caso queira defender-se.

No bojo dos embargos, o executado pode sustentar toda e qualquer matéria de defesa, como consta do artigo 475 do CPC, aplicável subsidiariamente.

Ação declaratória

A ação declaratória, em matéria tributária, tem como traço característico ser uma ação de iniciativa do contribuinte.

A ação declaratória é a ação que visa apenas efeitos declaratórios, basicamente de três espécies:

a) declarar a inexistência da relação jurídica tributária;

b) declarar imunidade ou isenção fiscal do sujeito passivo;

c) declarar importe menor a ser pago a título de tributação.

Tem como característica o efeito dúplice: embora apenas o contribuinte possa ingressar com a ação declaratória, é certo que a sentença que dela culminar irá declarar positivamente ou negativamente uma relação jurídica: a sua existência ou inexistência. Pode, portanto, gerar efeitos tanto pró-contribuinte como pró-fisco.

A propositura da ação declaratória, por si só, não impede que sejam tomadas pelo fisco as providências formalizadoras do crédito tributário, como apurações diversas e o próprio lançamento.

A decisão proferida em ação declaratória não faz coisa julgada "erga omnes", mas apenas "inter partes".

Ação anulatória

A ação anulatória de débito fiscal pode ser promovida pelo contribuinte contra a Fazenda Pública, tendo, como pressuposto, a preexistência de um lançamento fiscal, cuja anulação se pretende pela procedência da ação, com sentença de resolução do mérito que o declare inexigível.

Todavia, sua propositura não inibe a Fazenda Pública de distribuir judicialmente a ação de execução fiscal de sua dívida ativa regularmente inscrita, salvo se a ação anulatória estiver precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros, multa de mora e demais encargos, consoante o disposto pelo inciso II do artigo 151 do CTN.

Muito se discute a respeito da conexão entre a ação anulatória e a execução fiscal. Como regra, o foro da execução fiscal já ajuizada é competente para conhecer da ação anulatória do débito fiscal. Todavia, em se tratando de Poder Judiciário que tenha em sua organização varas privativas de execução fiscal, como se dá no Poder judiciário Federal da 3ª Região, considerando que ambos os juízos são dotados de competência absoluta, a ação anulatória deve ser proposta perante um dos juízos dotados de competência cível em matéria federal, enquanto a execução fiscal deve ser proposta junto às Varas privativas de execução fiscal.

Ação cautelar (inominada)

É cabível sempre que houver fundado receio de grave lesão a direito do contribuinte, tendo como finalidade garantir a eficácia da tutela jurisdicional de conhecimento ou de execução.

Há divergências doutrinárias e jurisprudenciais acerca da utilização de medida cautelar requerendo caução para obter certidão de regularidade fiscal e oferecendo garantia do valor devido, na pendência da propositura da execução fiscal pela Fazenda Pública. O posicionamento majoritário é no sentido da possibilidade da referida utilização.

Mandado de segurança

Foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição Federal de 1934 sendo desde então, ao lado do habeas corpus, o grande instrumento de proteção do cidadão em relação ao poder abusivo.

A Lei 1533/51 regulou o mandado de segurança por quase seis décadas, tendo sido revogada pela Lei 12.016/2009. Esse novo diploma reproduziu vários dos dispositivos da legislação revogada, mas também trouxe diversas novidades, inclusive atualizando a lei para as novidades tecnológicas. Por exemplo, admite seja impetrado o mandado de segurança por fax e e-mail, com protocolo da via original em cinco dias (art. 4º).

Uma outra novidade relevante é a trazida pelo artigo 7º, inciso II, da mesma lei, que determina logo no início da tramitação do MS a ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, mediante o envio da cópia da inicial e seus documentos, facultando-lhe, caso queira, o ingresso no feito na qualidade de litisconsorte. Na sistemática anterior a representação judicial da pessoa jurídica interessada somente tomava conhecimento do ajuizamento do MS em momento bem posterior, dificultando a ampla defesa e o contraditório da Administração Pública.

É considerada como "ação tributária por excelência". Algumas peculiaridades na estrutura dessa ação antiexacional tributária também favorecem seu manejo na órbita fiscal, uma vez que seus requisitos e seu trâmite se ajustam com precisão às necessidades da lide tributária que, frequentemente, envolve proteção a direito líquido e certo. São vários os fatores que justificam sua larga utilização em matéria tributária, entre eles:

- preferência no julgamento (com exceção do habeas corpus);

- ausência de sucumbência;

- rito simplificado, pouco oneroso e tendente ao rápido desate;

- possibilidade de concessão de liminar;

- possibilidade de impetração preventiva.

É necessário que o direito a ser defendido seja líquido e certo, que exista um ato de autoridade praticado com ilegalidade ou abuso de poder, bem como que a prova seja pré-constituída, ou seja, apresentável de plano, não necessitando de dilação probatória.

O Mandado de Segurança pode apresentar-se sob as modalidades repressiva e preventiva. A modalidade repressiva dirige-se contra ato já praticado pela autoridade coatora e tem por finalidade evitar que seus efeitos atinjam irremediavelmente a esfera jurídica do particular. A modalidade preventiva, por sua vez, tem como pressuposto situação que motive o justo e fundado receio de que a Administração venha a impor ao contribuinte determinada obrigação.

Necessário ressaltar que existem casos em que a própria lei reguladora do Mandado de Segurança veda a concessão de liminar (art. 7º, parágrafo 2º): compensação de créditos tributários, entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.

Ação de repetição de indébito

É ação do contribuinte em face da Fazenda Pública, visando a restituição de tributo pago indevidamente.

O fundamento básico da ação de repetição de indébito é afastar a locupletação indevida por parte do Fisco. Trata-se de ação de natureza nitidamente condenatória.

O direito à devolução do indébito tributário nasce com a ocorrência do evento do pagamento indevido. Todavia, necessita de reconhecimento administrativo ou judicial para que se torne efetivo.

Então, na hipótese de o contribuinte ter efetuado recolhimento indevido de tributo, está legitimado a requerer sua restituição, acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, a partir da data do pagamento indevido, de acordo com a Lei 9.250/95.

Nesse sentido também a Súmula 162 do STJ: "Na repetição do indébito tributário, a correção monetária incide a partir do pagamento indevido".

A já mencionada Lei 9.250/95, portanto, instituiu a paridade entre contas públicas passivas e ativas, colocando no mesmo patamar os juros que a Fazenda Pública deve pagar e os juros que cobra.

O CTN dispõe sobre a restituição do indébito tributário nos artigos 165 a 169, dispondo sobre as causas que ensejam a pretensão.

Ação de consignação em pagamento

A ação de consignação em pagamento pode ser ajuizada nas seguintes hipóteses:

a) Quando o sujeito passivo da obrigação tributária, desejando efetuar o pagamento, encontra recusa ou subordinação desse pagamento ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória;

b) Quando o sujeito passivo da obrigação tributária tiver o recebimento de seu pagamento subordinado ao cumprimento de exigências administrativas desprovidas de fundamento legal;

c) Quando o sujeito passivo da obrigação tributária encontrar-se diante de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.

De acordo com o artigo 164, parágrafo 1º do CTN, a consignação em pagamento somente pode versar sobre o crédito que o sujeito passivo da obrigação tributária se propõe a pagar, sendo, portanto, absolutamente restrito o pedido em questão.

A ação de consignação em pagamento, como meio de extinção do crédito tributário (art. 156, VIII, CTN) deve contar com sentença julgando-a procedente, reputando-se efetuado o pagamento com a conversão em renda da importância consignada em favor da entidade pública indicada na decisão como titular da exigência tributária.

No caso de a ação de consignação ser proposta devido ao fato de o sujeito passivo da obrigação tributária encontrar-se diante de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador, é importante lembrar que a ação deverá ser proposta perante a Justiça Federal, por força do que dispõe o artigo 109 da CF, caso uma dessas pessoas jurídicas de direito público seja a União.

O rito da ação de consignação em pagamento é aquele previsto nos artigos 890 a 900 do CPC.

O conteúdo da contestação da Fazenda Pública nessa ação é restrito, somente sendo permitindo alegar que: (a) não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida; (b) foi justa a recusa; (c) o depósito não foi efetuado no prazo ou no lugar do pagamento; (d) o depósito constituído pelo autor não é integral.

A propositura de ação de consignação em pagamento admitindo o depósito do montante integral e em dinheiro do crédito tributário acarreta a suspensão de sua exigibilidade, a teor do artigo 151, II, do CTN.

__________

Referências bibliográficas:

ARRUDA ALVIM NETO, José Manuel de. Processo Judicial Tributário. Novo processo tributário (obra coletiva). São Paulo: Resenha Tributária, 1975.

CAIS, Cleide Previtalli. O processo tributário. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

MARINS, James. Direito Processual Tributário brasileiro. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005

________. Caderno de Direito Tributário. Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região, 2006.

____________

1 Caderno de Direito Tributário - 2006 (Escola da Magistratura - TRF da 4a Região)

____________

* Marisa Regina Maiochi Hayashi é Procuradora da Fazenda Nacional. É especialista em Direito Tributário pela PUC/SP e mestranda em Direito






_________

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca