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O uso de celular: é sobreaviso?

Sylvia Pozzobon

A forma de utilização dos instrumentos telemáticos ou informatizados é o que definirá se o empregado fará jus, ou não, ao adicional de sobreaviso.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Atualizado às 08:05

Sleeping Man Holding PDAEstamos na era da informática. A modernização das relações de trabalho tem feito surgir novas questões jurídicas que não tinham sido cogitadas anteriormente pelos nossos legisladores, obrigando os Tribunais do Trabalho a reverem seus entendimentos de forma constante.

Um tema que está em voga diz respeito à utilização de celular pelos empregados, o que até bem recentemente não era visto como caracterização do estado de sobreaviso. Isto porque o sobreaviso, de forma geral, caracteriza-se como sendo o tempo que o trabalhador permanece em sua casa ou em local pré-determinado pelo empregador aguardando chamado para o serviço.

Tal definição, contudo, é originária do art. 244 da CLT, o qual foi editado há tempos longínquos (1943) para regular o sobreaviso dos ferroviários. Como sabemos, naquela época dispúnhamos apenas do telefone fixo, o que fazia com que, obviamente, o trabalhador de fato tivesse que permanecer próximo ao aparelho telefônico aguardando chamado do seu empregador.

Seguindo a evolução dos meios de comunicação, foram criados os antigos Bips, que por muito tempo não foram considerados como ensejadores de sobreaviso, conforme dispunha a Orientação Jurisprudencial nº 49 do TST. Nesse sentido, os Tribunais vinham entendendo pela ausência de adicional sobreaviso (1/3 do salário hora) pela mera utilização de celular (análogo ao Bip/Pager), sendo certo que a caracterização do sobreaviso se dava primordialmente pela permanência do empregado em sua residência1 ou em local pré-determinado pelo empregador:

OJ nº 49. HORAS EXTRAS. USO DO BIP. NÃO CARACTERIZADO O "SOBREAVISO". (cancelada em decorrência da sua conversão na Súmula nº 428 do TST) - Res. 175/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011.

O uso do aparelho BIP pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.

Histórico: Inserido dispositivo - DJ 20.04.2005

Redação original - Inserida em 01.02.1995

Ocorre que, em setembro do corrente ano, em razão da nova redação do artigo 6º da CLT, foi revisada a Súmula nº 428 do C. TST, com objetivo pacificar as discussões acerca da utilização do celular e outros modernos meios de comunicação - tablets, rádios, emails etc.:

Súmula nº 428 do TST

SOBREAVISO, APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 244, § 2º DA CLT (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012.

I - O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso.

II - Considera-se em sobreaviso o empregado que, à distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o período de descanso.

Entretanto, ao contrário do esperado, a nova redação da Súmula 428 do TST não finalizou a discussão. Pelo contrário, ela ampliou o seu leque. Algumas empresas passaram a bloquear o acesso de seus empregados a e-mails fora do horário de trabalho, a fim de evitar qualquer postulação de horas extras e/ou horas de sobreaviso.

Veja-se que a 7ª Turma do TRT da 3ª Região (MG) reconheceu, recentemente, a existência de sobreaviso no caso de empregado que, apesar de não permanecer em sua residência aguardando convocação, teve a sua liberdade de locomoção restrita em decorrência de possível chamado por parte do empregador. Ora, ainda que o celular lhe permitisse sair de casa, o trabalhador não poderia, por exemplo, viajar com sua família (direito ao lazer), já que o empregador poderia requerer, a qualquer momento, a sua presença na empresa para executar serviços.

Neste caso, a Justiça do Trabalho entendeu, já com base na nova redação da Súmula nº 428 do TST, que "foram preservadas as características básicas do sobreaviso, qual seja, a garantia do fácil acesso do empregador ao empregado, fora do horário de expediente deste, podendo a empresa acionar o empregado e com ele contar sempre que precisasse", tendo, consequentemente, julgado procedente o pedido de adicional de sobreaviso.

Constata-se, então, que a forma de utilização dos instrumentos telemáticos ou informatizados é o que definirá se o empregado fará jus, ou não, ao adicional de sobreaviso. O simples fornecimento de aparelho de telefone celular não caracteriza por si só regime de sobreaviso. Para que haja caracterização deste regime, o empregado precisará ter o seu direito de ir e vir limitado geograficamente por ordens do empregador.

Nesse contexto, os empregadores devem estar atentos a essa nova realidade e possuir normas internas dispondo sobre a utilização de meios tecnológicos, a fim de evitarem desnecessárias condenações em horas de sobreaviso.

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1 RR - 36840-40.2005.5.09.0654, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva. Data de Julgamento: 28/04/2010, 2ª Turma. Data de Publicação: 14/05/2010.

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* Sylvia Pozzobon é advogada trabalhista do escritório Barreto Advogados & Consultores Associados

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