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A Prestação de Garantias por Fundos de Investimento em Participação

Gabriel Rios Corrêa e Juliana Carvalho de Azevedo

Administradores, gestores de fundos de investimento, investidores e agentes do mercado em geral concordam que a alteração da Instrução 391 é extremamente importante para o desenvolvimento do mercado de private equity no Brasil.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Atualizado em 29 de agosto de 2013 10:46

Em 28/6 /13, a CVM - Comissão de Valores Mobiliários editou a Instrução CVM 535/13 (a "Instrução 535"), alterando a Instrução CVM 391/03 (a "Instrução 391"), que dispõe sobre a constituição, o funcionamento e a operação dos FIPs - Fundos de Investimento em Participações.

O FIP é um fundo dedicado a investimentos em ações, debêntures, bônus de subscrição e outros valores mobiliários conversíveis ou permutáveis por ações emitidas por companhias abertas e fechadas. Difere de outros fundos de investimento em um aspecto crucial: o FIP apenas pode investir em companhias nas quais participe do processo decisório.

A nova Instrução 535 modificou certas regras da Instrução 391 relacionadas ao funcionamento dos FIPs. A mudança mais importante ficou por conta da alteração do inciso III do artigo 35 da Instrução 391, que, originalmente, vedava a prestação, pelos FIPs, de garantias em obrigações assumidas por terceiros, ainda que o terceiro em questão fosse uma companhia controlada pelo FIP. De acordo com as alterações introduzidas pela Instrução 535, o FIP passa a poder prestar garantias, desde que haja previsão em seu regulamento e cada garantia seja aprovada por cotistas representando, no mínimo, 2/3 das cotas emitidas pelo FIP. Além disso, o administrador do FIP deverá adotar mecanismos que permitam a ampla divulgação da existência de tais garantias a potenciais cotistas do FIP. Para tanto, deverá, ao menos, divulgar fato relevante contendo as informações sobre as garantias prestadas e disponibilizar tais informações em seu website.

Apesar de o FIP ter se tornado um dos veículos mais utilizados para investimentos de Private Equity e Venture Capital no Brasil (especialmente pelo seu tratamento fiscal favorável), as atividades dos FIPs e o seu uso como veículos de transações de private equity eram limitados pela vedação prevista na redação original do inciso III do artigo 35 da Instrução 391. Foram vários os FIPs que enfrentaram problemas em razão de tal vedação. Em 2012, por exemplo, três FIPs administrados pela Votorantim Asset Management DTVM Ltda. apresentaram uma proposta firme para a aquisição de uma participação de 60% em uma companhia chamada Eólica Faísa S.A., que está desenvolvendo cinco usinas eólicas no Estado do Ceará, Brasil, conhecidas como Complexo Eólico Faísa. De acordo com o website da CVM, o projeto de construção e operação das usinas eólicas seria financiado por bancos de desenvolvimento. Como costuma ocorrer em transações financeiras, os bancos exigiram que os FIPs garantissem as obrigações da Eólica Faísa decorrentes dos contratos de empréstimo. O pacote de garantias incluía um aval, a cessão fiduciária de aplicações financeiras e o penhor das ações da companhia de titularidade dos FIPs.

Apesar da proibição, a Votorantim convocou uma assembleia de cotistas dos três fundos e o pacote de garantias foi aprovado pela unanimidade dos cotistas. Em seguida, a Votorantim, agindo em nome dos FIPs, protocolou junto à CVM um pedido de dispensa do cumprimento da regra do inciso III do artigo 35 da Instrução 391.

Nos últimos anos, diversos outros administradores de FIPs submeteram à CVM pedidos de dispensa do cumprimento da mesma regra. Dados os impactos desta regra restritiva, em muitas ocasiões (incluindo na decisão do pedido da Votorantim) a CVM dispensou o cumprimento da restrição legal aplicável quando comprovado que 100% dos cotistas do FIP haviam aprovado a concessão das garantias e que o administrador havia adotado mecanismos para cientificar futuros investidores do FIP sobre a existência dessas garantias.

Em vista do grande número de pedidos de dispensa, a CVM convocou, em dezembro de 2012, uma audiência pública para discutir a alteração da Instrução 391 com os participantes do mercado. De acordo com a proposta original da CVM, o administrador do FIP poderia prestar garantias em nome do FIP se previamente autorizado por todos os cotistas do fundo. Além disso, em linha com decisões prévias da CVM sobre o assunto, a proposta estabelecia que o administrador deveria informar futuros investidores do fundo sobre a existência das garantias já prestadas.

Durante a audiência pública, muitos investidores, advogados e associações do setor, como a ABVCAP (Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital) e a ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), submeteram à CVM contrapropostas, tendo um número significante de participantes se oposto à exigência de voto unânime para a aprovação da prestação de garantias. A CVM levou em conta tais contrapropostas e alterou sua proposta original ao editar a Instrução 535, permitindo que garantias sejam prestadas pelo FIPs mediante a aprovação de cotistas que detenham, no mínimo, 2/3 - ao invés de todas - das cotas emitidas pelo fundo.

Administradores, gestores de fundos de investimento, investidores e agentes do mercado em geral concordam que a alteração da Instrução 391 é extremamente importante para o desenvolvimento do mercado de private equity no Brasil. Espera-se que essa mudança torne a prestação de garantias pelos FIPs mais fácil e rápida, já que não será necessário o pedido de dispensa dirigido à CVM e nem que o administrador obtenha aprovação de todos os cotistas. A maioria qualificada de 2/3 dos cotistas, no entanto, ainda é alta e exige que os gestores e administradores dos FIPs sejam proativos ao tentarem aprovar a prestação de uma garantia considerada essencial para assegurar um negócio para o fundo.

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* Gabriel Rios Corrêa e Juliana Carvalho de Azevedo são advogados do escritório Lobo & Ibeas Advogados.

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