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A lista de material escolar e os produtos de uso coletivo

José Perceu Valente de Freitas

A imposição de compra de material escolar de uso coletivo, pelas instituições de ensino, por si só já caracteriza prática abusiva.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Atualizado em 20 de fevereiro de 2014 18:13

Passado as festas de fim de ano, o mês de janeiro é visto com temor entre os pais, que aliados com as despesas adquiridas em decorrência dos festejos de fim de ano, encontram novas despesas com as famosas listas de material escolar.

As listas escolares, sem sombra de dúvida, pesam no orçamento familiar, demandando cuidado e atenção dos pais quanto aos produtos relacionados pelas instituições de ensino.

Não raro, os pais, ora consumidores, se viam obrigados a fornecer à escola produtos que claramente eram destinados para fins diversos ao da educação e do processo de aprendizagem do aluno.

Diversas instituições de ensino transferiam aos pais o dever de compra de materiais de uso coletivo, tais como materiais de limpeza e de expediente - que claramente não seriam utilizados pelo aluno - como forma de reduzir os custos de sua atividade empresarial, onerando demasiadamente os consumidores.

A transferência dos custos da atividade empresarial ao consumidor, com a imposição de compra de material escolar de uso coletivo, pelas instituições de ensino, por si só já caracteriza prática abusiva, uma vez que exige do consumidor vantagem manifestamente excessiva (art. 39, V, CDC).

No entanto, por depender de interpretação jurídica da norma supracitada, era comum a prática de tal abuso, onde as instituições de ensino claramente se prevaleciam da fraqueza e ignorância (jurídica) do consumidor, cabendo aos diversos órgãos de defesa do consumidor a fiscalização.

Ante tal abuso, foi promulgada a lei 12.886 de 26 de novembro de 2013, que acrescentou o § 7º ao art. 1º da lei 9.870/99 (lei que dispõe sobre o valor total das anuidades escolares e dá outras providências), para considerar nula a cláusula contratual que obrigue o consumidor ao pagamento adicional ou fornecimento de material escolar de uso coletivo ou qualquer outro destinado à instituição de ensino.

Art. 1º [...]

§ 7º . Será nula cláusula contratual que obrigue o contratante ao pagamento adicional ou ao fornecimento de qualquer material escolar de uso coletivo dos estudantes ou da instituição, necessário à prestação dos serviços educacionais contratados, devendo os custos correspondentes ser sempre considerados nos cálculos do valor das anuidades ou das semestralidades escolares.

Desta feita, os pais não precisam fornecer às escolas produtos como: giz para quadro negro, pincel para quadro branco, papel higiênico, algodão, álcool, flanela, fita adesiva, CDs, copos descartáveis, materiais de higiene e limpeza, ou qualquer outro que não se destine ao uso exclusivo do aluno, pois o seu valor já está incorporado nas mensalidades e/ou anuidades.

No caso das remas de papel, em interpretação à supracitada norma, entendemos que é dever da escola individualizá-la e ainda devolver as folhas não utilizadas no fim do ano letivo aos pais, para assim evitar o desvirtuamento da norma. De igual modo, a exigência de resmas de papel em quantidade superior a uma, já pode ser considerado como prática abusiva.

Outro fator interessante no que toca as listas escolares, é que a instituição de ensino não poderá exigir a compra de materiais de determinados fabricantes, tampouco vincular a compra dos materiais à própria loja ou a uma determinada papelaria, sob pena de caracterizar venda casada, na forma do art. 39, inciso I do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

De igual modo, a compra obrigatória de uniforme escolar junto à própria instituição de ensino ou em lojas credenciadas por esta só é legal se a mesma possuir marca registrada junto ao INPI, em função do disposto no art. 189 da lei 9.279/96, que considera crime reproduzir no todo ou em parte, sem autorização do titular, marca registrada.

Cumpre ressaltar que é dever da instituição de ensino oportunizar o conhecimento prévio aos consumidores da obrigatoriedade de uso uniforme escolar, bem como da lista de materiais exigida por ela, antes da assinatura do contrato, tendo em vista o disposto no art. 46 do Código de Defesa do Consumidor, onde reza que "os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance".

O descumprimento do disposto na lei 9.870/99 poderá implicar, para a instituição de ensino, a abertura de processo administrativo, além da aplicação de multa na forma do parágrafo único do art. 57 da CDC.

Quanto ao consumidor, este tem o direito a devolução em dobro do valor gasto indevidamente, ante a clara ocorrência de cobrança indevida, conforme exegese do parágrafo único do art. 42 do CDC.

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* José Perceu Valente de Freitas é advogado do escritório Cavalcanti & Valente Advogados Associados.

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