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A nova Lei de Execução e o Processo do Trabalho

Francisco José F. S. Rocha da Silva

Desde 1994 o legislador pátrio vem alterando o Código de Processo Civil como forma de torná-lo um efetivo instrumento da aplicação do Direito, sendo certo que a Emenda Constitucional nº 45 de 2004 alçou ao patamar de garantia constitucional a celeridade da tramitação do processo.

sexta-feira, 17 de março de 2006

Atualizado em 16 de março de 2006 15:13


A nova Lei de Execução e o Processo do Trabalho


Francisco José F. S. Rocha da Silva*


Desde 1994 o legislador pátrio vem alterando o Código de Processo Civil como forma de torná-lo um efetivo instrumento da aplicação do Direito, sendo certo que a Emenda Constitucional nº 45 de 2004 alçou ao patamar de garantia constitucional a celeridade da tramitação do processo.


A lei nº 11.232 de 22/12/2005, que passará a vigorar seis meses após a publicação da norma, isto é, em 23/6/2006, trouxe importantes modificações no Código de Processo Civil. Teve ela em mira a busca da simplicidade e da celeridade processuais na efetividade da coisa julgada. Dentre essas modificações, observa-se que houve a extinção do processo de execução com a sua transformação em simples fase do processo de conhecimento e a eliminação da possibilidade de o devedor nomear os bens a serem penhorados.


Com a entrada em vigor dessa lei, a liquidação e a execução da própria sentença passarão a integrar o processo de conhecimento. Com isso, houve a transferência dos dispositivos do Livro II, do CPC, que trata "Da Execução", para o Livro I que trata "Do Processo de Conhecimento".


Assim agindo, o legislador ordinário se filiou à corrente doutrinária que não entende ser a liquidação de sentença uma nova ação, mas, sim, uma simples fase do processo de conhecimento onde se apuram os valores líquidos conforme os limites da coisa julgada.


É indene de dúvidas que tais alterações de há muito eram necessárias. Entretanto, somos compelidos a fazer uma análise de alguns aspectos polêmicos dessas alterações, e isso com o propósito de realçar, apenas, a necessidade de serem uniformizadas, sobretudo, as normas legais sobre a matéria, mas restrita à fase de execução da sentença prolatada na Justiça do Trabalho.


A partir da vigência da lei em comento, independentemente da necessidade de ajuizamento de um novo processo, o devedor passará a ter a certeza de que o cumprimento espontâneo da sentença traz a vantagem de evitar que a obrigação sofra, imediatamente, o acréscimo da multa de 10% (dez por cento) sobre o montante devido (art. 475-J).


Ademais, por ser a liquidação da sentença uma fase do próprio processo de conhecimento, torna-se desnecessária uma nova citação pessoal do réu, bastando sua intimação através da pessoa de seu advogado para o início da execução do julgado.


O principal ganho esperado com todas estas alterações está justamente no tempo de tramitação do processo, e isso porque, além da imposição de penalidade pelo não pagamento espontâneo, pela nova lei, caso discorde do que lhe está sendo cobrado, o devedor poderá apenas apresentar uma impugnação (art. 475-J, §1º), não suspendendo, necessariamente, a execução como ocorria na lei anterior.


Embora não se pretenda com o presente estudo criticar a Lei nº 11.232/2005, devemos salientar que ela não irá solucionar todos os problemas da demora na concretização do direito na medida em que as inovações processuais em destaque não se aplicam à execução movida contra a Fazenda Pública, que permanece regida pelo disposto no artigo 730 do Código de Processo Civil.


A celeridade buscada pelo legislador em relação ao processo civil também deveria ser extensiva ao processo do trabalho, onde se busca a satisfação de créditos de natureza alimentar (art. 100, §1º-A, CF/88), e portanto, privilegiados. Justamente em função do caráter alimentar dos créditos trabalhistas é que a Justiça do Trabalho sempre esteve numa posição de vanguarda em relação à Justiça Comum, notadamente, em se tratando de fase de execução.


Veja-se, por exemplo, a questão da penhora "on line" amplamente utilizada na Justiça Laboral e que ainda engatinha nas execuções que tramitam na Justiça Comum. Aqui, merece ser dito, ainda, que a dispensa de instauração de um novo processo visando ao cumprimento da sentença (inovação trazida com a nova lei de execução) não é nenhuma novidade no processo do trabalho, posto que, desde a edição do Decreto-Lei nº 5.452/43 (CLT), já existe a possibilidade de a execução ser promovida pelo juiz que proferiu a sentença, independentemente de manifestação do credor (art. 878).


Da mesma forma, a liquidação de sentença no processo do trabalho já se inicia com a simples notificação feita ao advogado por força do disposto no artigo 879, §1º da CLT. Ou seja, o sistema de liquidação de sentença introduzido pela lei em comento quase não traz inovações em relação ao processo do trabalho.


Por esta razão, dissemos acima que a celeridade deveria ser extensiva, mas não é, na medida em que, da maneira como está, a lei nº 11.232/2005, não poderá, exceto em situações muito raras dentro do direito trabalhista, ser aplicável ao processo do trabalho por força do disposto no artigo 769 do texto consolidado: "Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título." Ou seja, somente nos casos omissos é que se aplica o direito processual comum.


Havendo previsão expressa no texto consolidado, não há espaço para a aplicação do direito comum. Assim, exceto por conta de interpretações teleológicas das normas legais por parte da doutrina e da jurisprudência, entendemos que não há como se aplicar ao processo do trabalho a grande maioria das inovações trazidas pela lei nº 11.232/2005, na medida em que já existentes na CLT regras específicas tratando do procedimento de execução da sentença.


Dispõe o artigo 880 da CLT: "Art. 880. O juiz ou Presidente do tribunal, requerida a execução, mandará expedir mandado de citação ao executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas, ou, em se tratando de pagamento em dinheiro, incluídas as contribuições sociais devidas ao INSS, para que pague em 48 horas, ou garanta a execução, sob pena de penhora."


Iniciada a execução, portanto, deverá o executado ser citado, não bastando sua simples intimação através da pessoa do seu advogado, para que no prazo de 48 (quarenta e oito) horas efetue o pagamento da dívida ou garanta a execução. O art. 882, da CLT dispõe que "o executado que não pagar a importância reclamada poderá garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida das despesas processuais, ou nomeando bens à penhora, observada a ordem preferencial estabelecida no art. 655 do Código de Processo Civil."


No dispositivo seguinte, de n° 883, é consignado: "Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial". Apesar da matéria ainda ser muito recente, a recém lançada 39ª edição da obra "CLT Comentada" do saudoso Eduardo Gabriel Saad, atualizada por José Eduardo Duarte Saad e Ana Maria Saad C. Branco, 2006, Editora LTR, página 879, elucida: "É plenamente aplicável ao processo do trabalho o art. 475-J do CPC, introduzido pela Lei nº 11.232/05, verbis: "Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez porcento e, a requerimento do credor, e observado o art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação".


Tal interpretação decorre, ao que parece, do entendimento de que inexiste na CLT qualquer previsão acerca da multa pelo não pagamento espontâneo, razão pela qual seria possível a aplicação da multa prevista no processo civil. Esse mesmo entendimento é esposado pelo eminente professor e Juiz do Trabalho Júlio César Bebber, como se infere da leitura de seu artigo "Reforma do CPC, Processos Sincrético e Repercussões no Processo do Trabalho, "verbis": "Caso o réu não efetue o pagamento no prazo de 8 dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% e, a requerimento do interessado, ou de ofício, expedir-se-á o mandado executivo". "A cabeça do art. 475-J, então, tem plena aplicação no processo do trabalho..." (conf. seu artigo publicado na Revista LTr, de fevereiro/2006, n. 70-02/143).


Esse entendimento decorre, pois, da interpretação conjugada dos dispositivos contidos nos artigos 880, 881, 882 e 883 da CLT. Entretanto, poderá o operador sustentar que não existe margem para a aplicação da multa prevista no "caput" do art. 475, do CPC, com a redação dada pela multicitada Lei nº 11.232/2005, ao processo do trabalho, na medida em que toda a matéria é esgotada pela CLT.


Para fundamentar sua posição, bastará alegar que o artigo 883 é taxativo ao esclarecer quais as conseqüências do não pagamento espontâneo: a penhora de tantos bens quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora. Segundo este entendimento, como o diploma legal em comento não faz qualquer menção à aplicação de multa, esta não poderia ser aplicada ao processo do trabalho já que inexiste omissão a ser sanada pelo processo civil comum. Ou seja, a multa não integra a condenação, logo não poderá ser cobrada, pois o artigo 883 fala em condenação acrescidas de custas e juros de mora, mas não de multa.


Assim, não seria possível, aplicar ao processo do trabalho as disposições contidas na lei processual comum que entrará em vigor, na medida em que não estaria presente o pressuposto autorizador da utilização do processo civil na execução trabalhista, qual seja, a omissão no trato da matéria por parte da CLT.


Por esta razão, entendemos que deveria o legislador ter, expressamente, estendido à execução trabalhista as inovações trazidas pela Lei nº 11.232/2005, revogando as disposições em contrário atualmente existentes na CLT, para que a aplicação, ou não, das inovações não fiquem à mercê do entendimento deste ou daquele operador do direito.


Assim, e até como forma de preservação do caráter privilegiado dos créditos trabalhistas, espera-se que o legislador unifique as normas relativas aos processos executivos, sanando as falhas existentes na lei já aprovada, sob pena de, em termos de efetividade na concretização do direito, ser relegado a um segundo plano o crédito trabalhista.


No momento atual, a Justiça do Trabalho que - repita-se - sempre se caracterizou pela sua posição de vanguarda na jurisatisfação do direito do credor, encontra-se privada do acesso a todas estas inovações do processo civil e que, certamente, seriam capazes de tornar o processo do trabalho ainda mais simples, célere e eficaz. Espera-se, portanto, que o legislador pátrio perceba sua falha e estenda, expressamente, ao processo do trabalho as importantes inovações trazidas pela Lei nº 11.232/2005.
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*Advogado da Advocacia José Eduardo Duarte Saad S/C

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