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Ensino a distância - obra autoral ou prestação de serviços?

Larissa Cardoso Cahú e Isabelle Velay Rufino

A elaboração de cursos online é uma atividade inovadora, que, como outras do gênero, demanda um disciplinamento adequado às suas especificidades, do ponto de vista fiscal e autoral.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Atualizado em 25 de setembro de 2015 15:32

Os cursos online são exemplos de atividades inovadoras que se destacam em relação à forma tradicional de exploração da mesma atividade econômica. Eles ganham cada vez mais peso como canal de disseminação do ensino, de forma fácil, acessível e econômica a uma extensa gama de alunos virtuais. A exploração dessa atividade, por sua originalidade, demanda especial atenção em relação à caracterização das relações jurídicas dela resultantes.

Os cursos são compostos de aulas ministradas por um determinado professor, gravadas em vídeo com o propósito específico de serem disponibilizadas na internet, juntamente com materiais didáticos (textos e gráficos) para o estudo de determinada matéria. Ao final da gravação e de um processo de edição que se utiliza de outros recursos como textos, artes gráficas e animações, tem-se, como resultado do trabalho conjunto de vários profissionais, um produto que não resultaria da atividade do professor em uma sala de aula presencial. Esse produto seria uma obra protegida por direitos autorais? Haveria, por conta disso, uma relação diversa da prestação de serviços, comumente estabelecida entre um professor e uma instituição de ensino?

Esses produtos, também chamados de "obras multimídias", estão na intersecção entre as obras audiovisuais e os discursos ou conferências, podendo ainda conter ilustrações e outras obras artísticas, todos protegidos pela Lei nº 9.610/98 (Lei dos Direitos Autorais). Embora esta Lei não mencione a existência de obras multimídias, podemos considerar a sua qualificação como obras autorais, uma vez que o rol das obras elencadas no art. 7º da referida Lei não é taxativo. Se a obra multimídia pode ser protegida por direitos autorais, seria possível caracterizar a remuneração percebida pelos professores como royalties pagos a título de direitos autorais?

A caracterização da natureza da remuneração percebida pelo professor depende do contexto da elaboração dos cursos online. Importante observar se o professor assume a obrigação de entregar a obra em benefício daquele que irá explorá-la, se o próprio assim não o fizer, ou se o mesmo está sendo remunerado pelo esforço realizado para a produção desta em benefício de terceiros.

Essa análise não é sem consequências, uma vez que o enquadramento da remuneração como royalties pagos a título de diretos autorais sobre a obra multimídia traz reflexos fiscais relevantes. Primeiramente, dentre os serviços tributados pelo ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza), discriminados na Lista de Serviços anexa à LC 116/03 (lei de normas federais sobre o ISS), não há menção à cessão de direitos autorais, nem a instituto congênere, e, portanto, não é permitida a tributação do valor recebido a esse título. Além disso, de acordo com o disposto na lei 8.212/1991, fica fora da base de cálculo das contribuições previdenciárias os valores recebidos em decorrência da cessão de direitos autorais.

A elaboração de cursos online é uma atividade inovadora, que, como outras do gênero, demanda um disciplinamento adequado às suas especificidades, do ponto de vista fiscal e autoral, à luz da realidade fática e ao acordado entre as partes envolvidas na sua exploração.

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*Larissa Cardoso Cahú e Isabelle Velay Rufino são advogadas da área de Propriedade Intelectual & Novas Tecnologias do escritório da Fonte, Advogados.

 

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