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O acesso a medicamentos de alto custo e sem registro na Anvisa por meio de decisão judicial

Adriana Mourão

Diante da judicialização de inúmeros casos similares requerendo a obrigatoriedade de fornecimento pela União, Estados e municípios de medicamentos de alto custo e/ou sem o registro na Anvisa, a discussão chegou ao STF.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Atualizado em 6 de dezembro de 2016 08:04

Uma questão de grande repercussão e impacto chamou atenção do noticiário nacional e dos estudiosos do Direito nos últimos dias. Trata-se do início do julgamento conjunto dos RE 566.471/RN e 657.718/MG, os quais tiveram repercussão geral reconhecida pelo plenário do STF.

O RE 566.471/RN, resumidamente, trata da discussão sobre decisão judicial que determinou ao Estado do Rio Grande do Norte o fornecimento ininterrupto de medicamento de alto custo a paciente portador de cardiopatia isquêmica e problemas pulmonares. Já no RE 657.718/MG, o Estado de Minas Gerais foi processado para que fosse obrigado a fornecer medicamento sem o devido registro junto à Anvisa.

Diante da judicialização de inúmeros casos similares requerendo a obrigatoriedade de fornecimento pela União, Estados e Municípios de medicamentos de alto custo e/ou sem o registro na Anvisa, a discussão chegou ao STF e está sob a apreciação para decisão colegiada que, por meio de seu efeito multiplicador, possibilitará que o STF decida uma única vez a matéria, dando o norte a inúmeros processos idênticos que tramitam nos tribunais de nosso país.

O cerne da controvérsia é que, de um lado, nos deparamos com o direito constitucionalmente garantido de acesso universal e igualitário à saúde. De outro, os Estados argumentam e apontam o princípio da reserva do possível, ao afirmar que "os recursos disponíveis são limitados e, ao beneficiar uma única pessoa, o Judiciário prejudica outras, pois o Estado está destinando os recursos previstos para fazer face às políticas universais de saúde ao cumprimento das decisões judiciais que determinam o fornecimento individualizado de medicamentos extremamente caros". Na visão dos Estados, a judicialização, além de prejudicar todo o sistema, causa enorme desequilíbrio nas contas públicas.

Ao iniciar o julgamento do tema, o relator - ministro Marco Aurélio, fez os seguintes questionamentos: "A circunstância de a universalização do direito à saúde depender da formulação e execução de políticas públicas exclui a competência do Poder Judiciário em casos como o da espécie? É possível a fixação de critérios objetivos capazes de racionalizar os milhares de litígios sobre a matéria espalhados por todo o país? É chegada a hora de o Supremo responder a esses questionamentos, sob o ângulo da repercussão geral, presente a recusa do Estado em fornecer medicamento de alto custo, necessário à saúde de paciente reconhecidamente hipossuficiente".

Em seu voto o relator afirmou ainda ser dever do Estado assumir suas funções constitucionais, dentre elas, o direito à saúde, independentemente de problemas orçamentários e propôs a seguinte tese: "o reconhecimento do direito individual ao fornecimento, pelo Estado, de medicamento de alto custo, não incluído em Política Nacional de Medicamentos ou em Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional, depende da comprovação da imprescindibilidade - adequação e necessidade -, da impossibilidade de substituição, da incapacidade financeira do enfermo e da falta de espontaneidade dos membros da família solidária em custeá-lo, respeitadas as disposições sobre alimentos dos artigos 1.649 a 1.710 do CC e assegurado o direito de regresso".

Em voto-vista o ministro Luís Roberto Barroso manifestou entendimento diverso, ao estabelecer, como regra geral, o não fornecimento de medicamentos não listados pelo Sistema Único de Saúde - SUS. Tal liberação somente poderá ocorrer por decisão judicial em situações excepcionais, e propôs a seguinte tese: "O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais, sem eficácia e segurança comprovadas, em nenhuma hipótese. Já em relação a medicamentos não registrados na Anvisa, mas com comprovação de eficácia e segurança, o Estado somente pode ser obrigado a fornecê-los na hipótese de irrazoável mora da Agência em apreciar o pedido de registro (prazo superior a 365 dias), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil; (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União".

Na linha adotada pelo ministro Barroso foi o voto proferido pelo ministro Edson Fachin, que, como regra geral, adotou o entendimento de que o Estado não deve fornecer os medicamentos não listados no SUS. Entretanto, fixou parâmetros mais rígidos a serem observados para o fornecimento de medicamentos fora do Sistema Único de Saúde.

O julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista formulado pelo ministro Teori Zavaski para melhor apreciação da controvérsia.

Nesse cenário, mais um caso de grande repercussão nacional está sob a apreciação da mais alta Corte do país aguardando decisão que, por meio de seu efeito multiplicador, afetará diretamente milhares de pessoas em todos os Estados e municípios.
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*Adriana Mourão Nogueira é advogado do escritório Pinheiro, Mourão, Raso e Araújo Filho Advogados.

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