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Tutela antecipada antecedente: problemáticas quanto a sua estabilização

Danielle Silva Fontes Borges de Freitas

Prevista no artigo 303 do Novo Código de Processo Civil, a tutela antecipada requerida em caráter antecedente já vem trazendo algumas discussões no meio jurídico.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Atualizado às 07:49

Uma das grandes alterações trazidas pelo novo Código de Processo Civil é a possibilidade do ingresso de ação judicial com base apenas no pedido de tutela de urgência.

Neste caso, o legislador buscou regularizar situações em que o direito da parte se mostra na iminência de perecer se não for tutelado de plano e que a urgência é tão grande que não permite que a parte disponha de tempo suficiente e razoável para elaborar a petição inicial com todos os fatos e fundamentos necessários para a demanda principal, de modo a possibilitar o pleito de ação judicial limitando-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final.

Prevista no artigo 303 do Novo Código de Processo Civil, a tutela antecipada requerida em caráter antecedente já vem trazendo algumas discussões no meio jurídico.

Conforme disposto na lei processual, recebida a ação de tutela antecipada antecedente, o juiz pode: (a) deferir o pedido (art. 300,§2) ou b) determinar a emenda da petição inicial no prazo de 5 dias, sob pena indeferimento e da extinção do processo sem julgamento do mérito (303,§6º).

Com o deferimento da tutela antecipada nos termos aduzidos pelo o autor, o juízo o intima para que, no prazo de 15 dias ou outro prazo estipulado pelo juiz, adite a petição inicial, com a complementação da sua argumentação e novos pedidos.

A dúvida que surge é se tal prazo para aditamento corre concomitantemente com o prazo de citação e intimação do réu?

Tal questão é de suma importância pois no novo procedimento há previsão do instituto da estabilização da tutela provisória antecedente, regulada pelo artigo 304 do NCPC. De acordo com o referido artigo, a tutela antecipada antecedente concedida pelo juízo se torna estável se contra a decisão que a conceder não for interposto recurso pelo réu.

Desta forma, se o réu não agravar da decisão que tenha negado a tutela, a decisão denegatória se estabiliza e, consequentemente o processo é extinto nos termos do art. 304, §1º, de modo que não há necessidade, aparentemente, do aditamento da petição inicial, já que a tutela pleiteada se concretizou.

Diante desse panorama, a doutrina vem se dividindo em três correntes:

a. Primeira corrente: A intimação do autor para aditar a inicial deverá ser antes da citação e intimação do réu. Neste caso, entende-se que não tem lógica o réu ser citado antes do aditamento da inicial, pois ele ficaria sem conhecer de pleno a extensão dos pedidos do autor. Entretanto, é frágil tal argumento, já que há muitas vezes o perigo de perecimento do direito pleiteado na tutela antecipada deferida pelo juiz decaia muito antes do prazo de 15 dias que o autor tem para aditar a petição, de modo que o réu precisa ser citado e intimado com urgência para cumprimento da liminar.

b. Segunda Corrente: Defende-se que há a concomitância dos prazos. Diante do silêncio da lei quanto ao momento da citação do réu, a melhor interpretação é que é a citação e intimação deverão ser feitas de forma imediata e concomitantemente. Considera-se que o réu será citado e intimado para cumprir a decisão liminar e para comparecer em audiência de conciliação e mediação (art.334 e 303,§1º,II). Considerando que a contestação será apresentada somente após a audiência, não há prejuízo ao réu em receber o aditamento da petição inicial a ser oferecida pelo autor posteriormente a sua citação.

c. Terceira corrente: Intimação do réu antes da intimação do autor para aditar a inicial. Neste caso, entende-se que é prejudicial a concomitância dos prazos, devendo o réu ser citado e intimado antes, pois caso o mesmo venha a apresentar recurso de agravo de instrumento contra a decisão que deferiu a tutela, intima-se o autor para apresentar o aditamento. Caso contrário, ou seja, o réu não impugne tal decisão, extingue-se o processo, sem a necessidade da apresentação do aditamento, já que o aditamento da petição não é compatível com estabilização da medida provisória. Observa-se, portanto, que esta parte da doutrina, entende que os prazos são sucessivos e dependem de fato condicionante: interposição de recurso pelo réu.

Outra questão que surge quanto a estabilização da tutela antecipada antecedente diz respeito ao seu provimento parcial. Não é difícil nos depararmos com decisão que defere parcialmente a tutela pleiteada. Assim, se o réu não recorrer desta decisão, estaria parcialmente o processo extinto com a estabilização da tutela deferida? Embora nossos tribunais ainda não tenham se manifestado a respeito desta hipótese, grande parte da doutrina entende ser inviável a estabilização parcial da tutela antecedente, pois não faz sentido o juiz não fazer uma cognição exauriente e deixar de decidir a questão que tenha sido objeto da tutela antecipada.

Outro fator que merece destaque e com certeza alvo de discussão do nosso judiciário é a forma de impugnação quanto ao deferimento da tutela antecipada antecedente. Embora o art. 304 disponha que somente torna-se estável a referida tutela se não houver recurso por parte do réu, há discussões quanto a possibilidade de simples impugnação nos autos do processo por parte do réu para evitar a estabilização da tutela antecipada antecedente e não somente a interposição do Recurso de Agravo de Instrumento. Afinal, o réu tem o direito de cognição exauriente da ação bem como a produção de provas, tudo em consonância com o Princípio da Primazia da solução de mérito defendido pelo NCPC.

Tal discussão é pertinente, pois evitar-se-ão os inúmeros recursos de agravos que serão distribuídos perante nossos tribunais, cuja matéria já é defendida por grandes doutrinadores:

O professor Fredie Didier¹ defende que: "Embora o art. 304 do CPC fale apenas em não interposição do recurso, a inércia que se exige para a estabilização da tutela antecipada vai além disso: é necessário que o réu não se tenha valide de recurso nem de nenhum outro meio de impugnação da decisão (...)".

Vale ainda consignar que o art. 304 §2º e §5º do NCPC, dispõe que após estabilizada a tutela antecipada antecedente as partes têm 2 anos contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, o direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada antecedente. Tal prazo, entretanto, é motivo de questionamento por parte da doutrina. Humberto Theodoro Junior defende tratar-se de prazo decadencial, de modo que transcorrido os dois anos, extingue-se o direito das partes. Outros defendem que tal prazo é inconstitucional, sendo possível o exaurimento até os prazos do direito material que envolve o objeto da tutela antecipada se extinguirem.

Quanto ao cabimento de ação rescisória contra a decisão que extingue o processo por conta da estabilização da tutela antecipada antecedente, defende a doutrina, com base em uma interpretação do artigo 966, §2º, que é possível propor ação rescisória depois de dois anos do seu trânsito em julgado. Entretanto, em razão da inexistência de coisa julgada na decisão que extingue a ação por estabilização da tutela antecipada antecedente, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrado (ENFAN), aprovou enunciado no sentido contrário:

Enunciado n. 27: "Não é cabível ação rescisória contra decisão estabilizada na forma do art. 304 do CPC/2015", corroborado também pelo enunciado n. 33 do Fórum Permanente de Processualistas Civis.

Por fim, cumpre destacar que nos termos dos enunciados do Fórum Permanente de Processualistas realizado entre os dias 18 e 20 de março de 2016, entende-se ser possível a estabilização da antecipação da tutela em face da Fazenda Pública, bem como em sede de alimentos provisórios, observa-se:

"Enunciado n. 582. (arts. 304, caput; 5º, caput e inciso XXXV, CF) Cabe estabilização da tutela antecipada antecedente contra a Fazenda Pública.

Enunciado n. 500. (art. 304) O regime da estabilização da tutela antecipada antecedente aplica-se aos alimentos provisórios previstos no art. 4º da Lei 5.478/1968, observado o §1º do art. 13 da mesma lei."

Embora, na prática, estejam surgindo questionamento quanto a estabilização da tutela antecipada antecedente, o instituto beneficia nosso ordenamento jurídico, pois traz celeridade e efetividade nas decisões, objetivos estes perseguidos por todos nós cidadãos.

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1 DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antcipação dos efeitos da tutela. 11. Ed. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. P. 617.

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*Danielle Silva Fontes Borges de Freitas é advogada no escritório Coutinho, Lacerda, Rocha, Diniz & Advogados Associado.


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