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Corrupção não é um crime sem vítimas

A corrupção é um mal que deve ser combatido em todas as suas frentes. Deve ser combatido nas entidades públicas e nas privadas.

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Atualizado às 07:20

"For let there be no doubt that corruption is not a victimless offense. Corruption is not a gentlemen's agreement where no one gets hurt. People do get hurt. And the people who are hurt the worst are often residents of the poorest countries on the face of the earth, especially where it occurs in the context of government infrastructure projects, contracts in which crucial development decisions are made, in which a country will live by those decisions for good or for bad for years down the road, and where those decisions are made using precious and scarce national resources. (Matthew Friedrich, the Acting Assistant Attorney General at the DOJ's Criminal Division) Siemens Case)"

Essa citação vem do caso de violação de legislação anticorrupção americana (FCPA) da Siemens1. Nela o "Advogado Geral Assistente" do DOJ (a estrutura dos cargos de justiça americana é diferente da nossa) dá a perfeita dimensão do que é o crime de corrupção e seus efeitos nefastos para a população. Pessoalmente gosto muito dessa citação; ela resume bem os efeitos da corrupção no dia a dia de pessoas simples e comuns.

Numa tradução livre, o que ele diz é o seguinte: "Que fique muito claro que o crime de corrupção não é um crime sem vítimas. Corrupção não é um acordo de "senhores" no qual ninguém se fere. As pessoas se ferem. E as pessoas que mais são prejudicadas são aquelas que residem nos países mais pobres do planeta, especialmente quando a corrupção ocorre em contratos de áreas de projetos de infraestrutura dos governos; contratos estes onde decisões cruciais de desenvolvimento são feitas, nas quais o país viverá regido por estas decisões para o bem ou para o mal por muitos e muitos anos; e onde estas decisões são realizadas usando recursos nacionais escassos e preciosos. "

Atualmente não é difícil entender na prática o que o Advogado Geral quis dizer, basta olharmos para o nosso Estado do Rio de Janeiro para fazer um paralelo. A corrupção sangrou os recursos do Estado, e agora o Rio está mergulhado numa crise financeira onde sequer tem o dinheiro para pagar seus Servidores, e prestar serviços básicos à sua população; leia-se saúde, segurança, entre outros.

Ou ainda, no recente caso da JBS onde sequer sabemos o tamanho da sangria em cofres públicos, especialmente no BNDES, e seu prejuízo social que fora perpetrado durante muitos anos, tirando financiamento de projetos legítimos. Isso sem mencionar o prejuízo político, jogando o país numa turbulência, o qual já estava se estabilizando.

O dano é muito grande.

A corrupção é um mal que deve ser combatido em todas as suas frentes. Deve ser combatido nas entidades públicas e nas privadas. Aquela ideia que Políticos corruptos "achacavam" empresas está se desfazendo, está ficando cada vez mais claro que existe uma "simbiose" entre empresas não éticas e interesses de Autoridades Públicas. "O buraco é mais em baixo".

O mundo como um todo percebeu o quão destruidor os crimes de Corrupção podem vir a ser. A citação que abre esse artigo ilustra muito bem isso. Legislações como o FCPA (Foreign Corrupt Practices Act - EUA) foram muito eficientes em capitular o suborno a autoridades estrangeiras da forma como o fez. Vimos que o resto do mundo "bebeu nesta fonte" e adaptou a legislação anticorrupção a seus ordenamentos jurídicos. Temos o UK Bribery Act de 2010, a nossa 12.846 de 2013 (Lei da Empresa Limpa), e temos visto vários outros países adotando práticas similares (focando em autoridades estrangeiras e locais, dependendo da legislação).

Acoplado a isso, veio o ISO 37001, Sistema de Gestão Antissuborno; o qual foi recentemente publicado pela ABNT em nossas terras.

O combate à corrupção não é uma moda, bem como Compliance não é uma moda passageira. As empresas têm que se adaptar, e terão que implementar seus sistemas de combate a Corrupção. A mentalidade do, "isso sempre foi feito assim" não vai servir de defesa. Se as empresas não se importam com responsabilidade social e ética, irão se importar com seus bolsos.

E mais, o Programa de Compliance focado em anticorrupção será um diferencial para obter empréstimos, proteção ao valor da marca, vantagens em M&A, valor de suas ações. Um bom programa pode evitar muita dor de cabeça, e no bolso.

A verdade é que, por Ética ou por imposição, Compliance Anticorrupção é uma necessidade, e aqueles que não se adaptarem ou acharem que "isso não vai acontecer comigo" correm um risco enorme de verem sua logomarca estampada em notícias de escândalos como as que recentemente temos visto: JBS, Lava Jato, ou a já não tão nova Zelotes; e ainda verem amargar prejuízos na casa dos milhões, até bilhões.

Compliance quando preventivo é muito barato, adiciona valor à marca; agora depois de uma "violação" fica muito, mas muito caro.

Corrupção é um crime pernicioso. E cobra um preço social muito alto onde é praticado. Quem paga pela corrupção efetivamente é o bolso do cidadão comum. É o dinheiro que não há para oferecer saúde à comunidade; é o dinheiro desviado para projetos caríssimos que não são necessários. A corrupção tira empregos, bem estar social, saúde, segurança e educação do cidadão comum. É um crime de vítimas fatais, mas que nem sempre são visíveis.

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1 Disponível em: clique aqui

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*Maria Maximina Cartaxo é advogada corporativa especialista em Anticorrupção e Compliance.


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